Despejos em meio à COVID-19 é tema de debate no Café com MST, desta terça (11)
Por Luciana G. Console
Da Página do MST
A luta em defesa dos Direitos Humanos no Brasil tem sido bandeira central no período de pandemia da COVID-19, em que as ameaças de despejos e remoções têm crescido consideravelmente. O Café com MST desta terça-feira (11), realizado às 11h na página do MST, teve como tema “Terra e Moradia: A luta por Direitos Humanos em tempos de pandemia”.
A live do Café com MST contou com a presença de Natália Bonavides, advogada popular e deputada federal, e Jacques Alfonsin, advogado, professor e procurador aposentado no Rio Grande do Sul. A mediação do debate ficou à cargo de Ayala Ferreira, do Coletivo de Direitos Humanos do MST.
Apontando moradia como direito fundamental, Alfonsin iniciou sua fala afirmando que o direito à moradia é inerente à condição humana, ou seja, é anterior ao Estado. “O direito humano fundamental não está na frente, atrás ou dos lados do ordenamento jurídico, ele está acima das leis e o Estado tem que reconhecê-lo e garanti-lo, mas não é isso que acontece. Basta uma autoridade administrativa ver que o imóvel está registrado num nome, sem se consultar a função social da propriedade, para que aconteça o despejo”, lamenta.
Neste sentido, ele reforça a importância de luta dos movimentos populares, apontando a organização do povo como a responsável por socorrer este direito fundamental. “É a organização popular que tem mostrado suprir as garantias que o Estado teria obrigação e não faz. Temos que confiar na construção desse novo direito e, pela nossa organização, transformar os direito humanos em poderes sociais, que conflitem com a repressão”.
Em corroboração à fala de Alfonsin, a deputada Natália destacou a luta do MST na construção de uma consciência coletiva e resistência contra a opressão capitalista, manifestada pela estrutura fundiária do país. “A estrutura fundiária é a história da nossa desigualdade, foi feita pra excluir. Um país desse tamanho que tem mais imóvel vazio do que família precisando de casa, é esse o quadro”, pontuou.
A advogada ainda denunciou o aumento dos despejos em tempos de pandemia. “Quantas reintegrações de posse a gente viu durante a pandemia? Decisões dadas como urgentes, sendo que se tratavam de espaços abandonados há anos. As pessoas estão sofrendo despejos repetidamente, isso mostra que os setores da elite, representadas pelas instituições, fazem a política longe da vida real, como se as pessoas fossem desaparecer e não ir pra outro local. O Judiciário está fazendo audiência online, eles sabem a gravidade da pandemia, mas isso não se estende para as famílias despejadas, que são expostas à um vírus letal”.
A deputada Natália Bonavides é autora do Projeto de Lei 1975, que prevê a suspensão dos despejos enquanto durar a pandemia no Brasil. Apesar de, durante a live, a advogada lamentar que o Congresso Nacional é palco de retirada de direitos, ela também destacou que há outros 20 projetos em tramitação sobre o tema, juntamente com o PL 1975. “E não são só de partidos de esquerda, então isso é muito positivo”.
Convidados surpresas
Em determinado momento da live, Benedito Roberto Barbosa, da União dos Movimentos de Moradia (UMM), se juntou aos convidados para comentar sobre a campanha Despejo Zero e elogiou o trabalho da advogada Natália. “O PL 1975 é ferramenta da nossa resistência neste momento para tentar barrar os despejos. Mas enquanto não vemos o PL aprovado, temos que atuar caso a caso, o que é difícil. Organizamos três grupos de trabalho e estamos em processo de expansão da campanha. São mais de 50 organizações vinculadas e chegaremos a 100 entidades facilmente”, ressaltou ele, que também denunciou alguns despejos ocorridos desde o mês de março, como a desocupação do Monte Horebe, em Manaus, onde mais de 2500 famílias foram removidas do local.
A live também trouxe a presença virtual de Tuíra Tule, acampada do quilombo Campo Grande, no município do Campo do Meio, em Minas Gerais. Ela contou um pouco da história do acampamento e denunciou as frequentes tentativas injustas de despejo que as famílias passam na região.
Por fim, Jacques Alfonsin enalteceu espaços como o Café com o MST e reforçou a importância de diálogos como estes. “O que realizamos aqui pode ser uma semente de mostarda, e uma semente de mostarda se torna uma árvore frondosa”, finalizou.
*Editado por Solange Engelmann