O Agronegócio é o mal, e não “pop”
Por Zé Luís Costa
Da Página do MST
A expansão da nova fronteira agrícola no sul com o estado do Maranhão se inicia logo nos fins dos anos de 1970, principalmente quando da instalação da Ferrovia do Grande Projeto Carajás. Coincidentemente, gira em torno da lei de terras, do anos de 1960, conhecida por Lei de Terras Sarney. Essa lei teve como principal objetivo facilitar o acesso à terra, no estado, de pessoas oriundas do Sul e Sudeste do país, aqueles que detinha o poder econômico.
A instalação da estrada de Ferro Carajás, de 892 km, que liga a cidade de Parauapebas no Estado do Pará ao Porto de Itaqui, na capital do Estado do Maranhão, São Luís, foi um dos principais aceleradores para a vinda dos grandes e predatórios projetos para essa região do país. É o que garante a jornalista e representante da Rede de Justiça nos Trilhos, Larissa Santos. “Quando esse projeto se instala por aqui, se amplia agressões ao meio ambiente e às comunidades por onde passa o trem de minério.”.
Ela acrescenta que essa instalação só aumentou a vinda de outros grandes projetos para o estado. Como a região precisava de uma infraestrutura como uma estrada que pudesse chegar ao porto do Itaqui, uma rota mais fácil de escoamento de mercadorias, isso facilitou a instalação de outros grandes projetos no estado, saindo do âmbito do minério. Larissa acrescenta que, ao que tudo indica, a estrada já fazia parte do projeto, que ficaria como infraestrutura para o escoamento da produção do ferro para o mundo. No tocante ao minério, instala-se as conhecidas cinco “guserias” espaço que, a princípio, beneficia o bruto do minério, vindo da Serra dos Carajás.
E para a instalação dessas indústrias de beneficiamento do ferro era necessário uma matéria-prima que serviria de combustível aos fornos das siderúrgicas. É daí que vem os primeiros plantios de eucaliptos na região, tanto do Sudeste do Estado do Pará, quanto do Sul e Sudeste do Estado do Maranhão.
Gilvânia Ferreira, militante do MST e professora universitária, no estado do Maranhão, afirma que, em nome desse desenvolvimento, o agronegócio se organiza por ondas de cadeias produtivas. “No primeiro momento se organiza com o desmatamento, com a retirada da madeira se estabelecendo as madeireiras, movelarias em outras regiões.” Ela explica que, em seguida, vem a produção de arroz, a princípio pelos camponeses, sendo uma concessão para esses por dois ou três anos, no máximo, e para que depois venham a fazer o plantio do pasto para o fazendeiro criar seu gado.
Essa realidade apresentada por Gilvânia explica um ritual comum para os estados da região sobre como funciona esse sistema. Uma realidade para a invasão de áreas que estavam cobertas por florestas e pelo cerrado, por exemplo. Nessas localidade sempre existiram povoações, sendo indígenas ou remanescentes de quilombos trabalhando nessas áreas produzindo e Gilvânia, reforça aquilo que a matéria já apontou no início: “E a partir disso é que as terras passaram a ser vendidas para o plantio de eucaliptos.”
O Matopiba
Paralelo a isso surge também uma região explorada pelo capital, uma nova fronteira agrícola nas regiões do Estado do Maranhão, do Piauí, do Tocantins e da Bahia, o que é conhecida como Matopiba. Um espaço aonde a exploração de commodities cria as condições para a geração de grandes problemas socioambientais.
É a opinião de várias pessoas ligadas a organismos sociais de luta pela terra, pelos direitos humanos e trabalhistas na região, como a de Fátima Barros, quilombola do quilombo Ilha de São Vicente, na Região Norte do estado do Tocantins, no conhecido “Bico do Papagaio”. A Ilha de São Vicente é uma ilha fluvial que está situada no Rio Araguaia, e segundo Fátima Barros, é um “ecótono”, pois está no espaço de transição entre dois biomas: o cerrado e o amazônico.
Fátima Barros é pedagoga de formação, faz mestrado na linha de pesquisa “Cultura e Território”, pela Universidade Federal do Tocantins e trabalha como técnica na Secretaria Municipal de Educação da cidade de Marabá, no estado do Pará.
Com uma articulação outras populações quilombolas do Brasil, principalmente do Maranhão, começa a debater as ameaças ao cerrado pelo avanço do agronegócio representado pela potencialização da Matopiba.
Fátima afirma que quando esses projetos vêm, aparecem com grandes volumes de recursos para realmente abocanhar grandes extensões de terras trazendo, sobretudo, impactos no cerrado. Os quilombos são guardiões, bem como outras Ongs, como o Movimento das Quebradeiras de Coco Babaçu (Miqcb), indígenas, sindicatos e outros.
Ela argumenta que esses investimentos são altíssimos, principalmente nas cidades de populações pequenas. Como um dos principais problemas está a saída de jovens para trabalhar nesses grandes projetos, retirando-os de suas tradições, aliciando-os por uma ideologia de que melhorarão de vida.”
A representação mais forte do agronegócio na região no entorno de onde ela se situa e atua como militante quilombola é ainda o “reflorestamento” de eucalipto. O plantio de eucalipto tem como empresa principal na região a Sinobras Florestal, com grandes quantidades de terras. Entretanto, há outras empresas que se unem “como se fosse um cordão maior [sic.]” para se protegem de acordo com interesses comuns.
Outras características do agronegócio, ainda segundo Fátima Barros, está centralizada na cidade de Araguaína, no centro do estado do Tocantins. “Lá se concentra grandes plantios do monocultivo de soja e milho transgênico. Isso é uma atentado às tradições de preservar as sementes.”, diz Fátima.
O agronegócio possui várias máscaras para enganar a sociedade, argumentando que está trazendo retornos financeiros e emprego às populações e que tudo isso é desenvolvimento. Todavia, esse desenvolvimento está disfarçado de grandes agressões à terra, de expulsões de trabalhadores e de destruição da cultura camponesa. Porque para os representantes desses povos remanescentes, suas relações com a natureza nunca é de lucro, mas de respeito e amor. Seja no estado do Tocantins ou no Maranhão agronegócio é mau. Mesmo sendo “pop”, ele é perverso.
Agronegócio no Baixo Parnaíba
Voltando ao Maranhão, uma outra região de avanço que também é atingida pelas representações do agronegócio é o Baixo Parnaíba, parte dela na divisa com o estado do Piauí, pelo Rio Parnaíba, uma região onde estão concentradas empresas de eucalipto, soja e milho.
Edvan de Oliveira dos Reis é de Buriti de Inácia Vaz, assentado e militante do MST, também no estado do Maranhão, e morador do Baixo Parnaíba, uma região extensa de terra que reúne vários municípios, como Chapadinha, Brejo, Anapurus e outros.
Nessa região é uma realidade crua e perigosa para os camponeses, como ele mesmo salienta: “Com a chegada do agronegócio, as situações ficaram mais ainda conflituosas. Primeiro, porque eles precisam, como parte dos grandes projetos, de grandes quantidades de terras, para expandir e lucrar com facilidade e que vai justamente no oposto daquilo que é defendido pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra: a redistribuição da terra e uma reforma agrária popular”, finaliza.
Edvan denuncia ainda que a relação dessas empresas no Baixo Parnaíba são com o poder político, poder econômico, poder midiático e garante que são vários tipos e espaços de disputas com os trabalhadores rurais organizados, sejam em sindicados ou movimentos e organizações de camponeses tradicionais.
É uma relação de conflitos, criando situações de risco de morte para a maior parte de suas lideranças. As principais empresas instaladas no Baixo Parnaíba são Suzano Papel e Celulose, Cargill, a Syngenta, que é uma empresa com sede na Suíça especializada em sementes e produtos químicos voltados para o agronegócio, e a Agrosoja, dentre outras.
“O agronegócio invade buscando terras baratas e de fáceis distribuição da grande sua produção. O cerrado é importante por suas enormes quantidades de recursos hídricos no subsolo.”, afirma Edvan.
Em Imperatriz, Maranhão
Na região de Imperatriz, a agricultura de exportação é representada pela Suzano Papel e Celulose, na região a partir de 2010 que abocanha grandes quantidades de terras. Atualmente a empresa vem causando grande prejuízo aos extrativistas e pequenos produtores, sobretudo às quebradeiras de coco babaçu, como garante dona Eunice da Conceição Costa, liderança do Miqcb (Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu).
“Sobre o agronegócio, ele tem avançado muito na nossa região. E isso é muito preocupante para nós. O que eu vejo é que cada dia que passa nós estamos perdendo ainda mais nossos espaços para as grandes empresas, para os grandes negócios”.
A sede do Miqcb é na cidade de Imperatriz, justamente onde estar implementado o maior projeto dessa região voltado para a extração da celulose e visando a exportação. A luta das quebradeiras de coco é para preservar suas formas culturais de extração e principalmente preservação das palmeiras de coco babaçu.
Acrescenta dona Eunice de forma emocionada: “mas a gente tem que bater nesta “tecla”, que é lutar e denunciar sempre para que um dia nossos filhos ou nossos netos, tenham um futuro de qualidade”, conclui.
*Editado por Fernanda Alcântara