Intimidade com a terra: cultivando solidariedade em tempos de pandemia

Mulheres do MST combatem o vírus e as violências com cuidado, afeto e solidariedade no Pará

Mulheres do Coletivo Intimidade com a Terra enfrentando o vírus e as violência, no Assentamento 17 de Abril, em Eldorado do Carajás. Fotos: Nieves Rodrigues

Por Nieves Rodrigues
Da Página do MST

Entre maquinas de costura, linhas, tecidos, bacias e panelas as mulheres do Coletivo Intimidade com a Terra se encontram no quintal de Marizete, para confeccionar máscaras e preparar sabão em barra e liquido no Assentamento 17 de Abril, em Eldorado do Carajás, sudeste do Pará.

Logo no início da pandemia, quando o vírus se espalhava com rapidez pelo país e colocava a população em constante tensão e estranhamento com as medidas de segurança, essas mulheres resolveram se organizar para produção de máscaras para doação e a conscientização do seu uso para o bem da comunidade.

“Antes da pandemia nós estávamos planejando fazer a festa da colheita, mas com não conseguimos realizar, queríamos contribuir de alguma forma enquanto coletivo e começamos a produzir as máscaras”, comenta Marizete Rodrigues.

Com doações de tecidos e recursos, foram produzidas mais de 300 mascaras entre os últimos meses de abril e maio para serem doadas no assentamento e nas comunidades dos arredores, principalmente as de mais difícil acesso. A necessidade de continuar com as doações e se organizar enquanto coletivo fizeram essas mulheres adentrarem a mais um desafio: produzir 5 mil máscaras e sabão em barra e liquido para serem doados a quem mais precisa no município de Eldorado do Carajás.

O município de Eldorado do Carajás que possui mais de 30 mil habitantes, e mais de 300 casos da covid-19, recebeu as doações em dois grandes atos simbólicos. Um em julho foram entregues às instituições como a Casa dos Idosos, Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e para os Agentes Comunitários de Saúde de comunidades camponesas do município. No último sábado (26), as entregas dos kits de máscaras e sabão foram entregues os representantes de dez bairros na cidade.

Cultivar a solidariedade para combater o vírus e as violências é o que tem mobilizado as mulheres do Coletivo Intimidade com a Terra, que em meio as ações de solidariedade perderam para covid-19 uma das companheiras, que estava se inserido na mobilização das doações.

Os olhos marejam e a voz engasga quando Maria Zelzuita lembra de Elenice. Ela conta que a perca de sua companheira deixou grande tristeza e medo, mas não desanima, pois não podem perder mais companheiros e afirma que essas ações são necessárias para proteger a comunidade e continuar conscientizando as pessoas de que a pandemia não acabou.

Desde o ano 2000 o Coletivo de Mulheres emergiu da necessidade de organização, formação e geração de renda para as mulheres do assentamento. As mulheres se organizaram através de oficinas de corte e costura que resultou na construção de uma mini fábrica de peças intimas, para atender as demandas do assentamento e região. Para além da fabricação das peças, o espaço também funciona para auto-organização das mulheres sobre diversas pautas de produção e ambiental, daí o nome “Coletivo Intimidade com a Terra”.

Com as atividades retomadas neste ano, várias atividades foram programadas para semear a resistência das mulheres, como os viveiros de mudas e bosques, mas diante da pandemia os esforços foram direcionados para as ações de solidariedade, com a finalização de produção de 5 mil máscaras.

Atualmente mais de 30 mulheres participam do coletivo, mas neste período 20 companheiras se reunirem aos sábados no quintal de Marizete. Entre o som das maquinas e tesouras compartilham conversas sobre a vida cotidiana e gargalhadas, seguindo todas as medidas de segurança.

Eliane expressa o sentimento de como tem sido partilhar do trabalho coletivo nesse momento:

“Eu me sinto honrada em estar participando, porque neste período a gente fica muito ansioso, eu mesmo tive crise de pânico por conta da pandemia e poder estar no coletivo, se reunindo para uma boa causa e com isso poder conversar, falar das coisas da nossa vida com as nossas companheiras tem sido uma terapia para mim”, comemora.

O sentimento de Eliane é partilhado com as outras companheiras, que também tem atuado nesse período e continuam combatendo o vírus e as violências com cuidado, afeto e solidariedade.

*Editado por Solange Engelmann