Após ação do MPF, Prefeitura de Ribeirão Preto (SP) e Daerp terão que instalar rede de esgoto em assentamento
Por Filipe Augusto Peres
Comunicação MST/SP
O governo municipal de Ribeirão Preto, sob o comando do prefeito Antonio Duarte Nogueira (PSDB) sofreu uma dura derrota esta semana. A contragosto, a Prefeitura Municipal terá de oferecer saneamento básico à população que vive e produz alimentos saudáveis no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) da Barra, incluindo o assentamento Mário Lago, do MST. A área do PDS, destinada à reforma agrária desde 2004, congrega 468 famílias.
Tanto a prefeitura quanto o Departamento de Água e Esgoto do município (DAERP) são obrigados a oferecer um projeto de implementação da rede de saneamento básico no assentamento rural em até 30 dias. A ordem liminar foi realizada pela 2ª Vara Federal de Ribeirão Preto e atende um pedido do Ministério Público Federal. O projeto será financiado pela União e terá de ser concluído em até dez meses após o convênio entre os governos municipal e federal.
Kelli Mafort, da Direção Nacional do MST, destacou que a vitória pelo direito à água e ao saneamento básico, a partir de reivindicação puxada pelo MST, representa uma conquista muito grande, tanto para os assentados como para a conservação e recuperação do Aquífero Guarani.
“O MPF tentou várias negociações com a prefeitura, que fugiu o tempo todo desta responsabilidade em relação à distribuição de água e saneamento aqui dentro do assentamento. Nós sabemos que por ser uma área sensível do Aquífero Guarani, a questão do tratamento sanitário é muito importante, é central”, relembra Kelli.
Opinião que é compartilhada pelo MPF em sua decisão. Para ele, sem a rede de esgoto instalada, como fora constatado pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), em 2015, os moradores não tem outra alternativa senão descartar os dejetos diretamente no solo, o que coloca em risco não apenas as famílias assentadas, mas a preservação do aquífero, uma das maiores reservas hídricas do mundo.
Falando sobre a importância da decisão judicial para os países que se servem das águas do Aquífero Guarani, Kelli ressaltou que a população local ainda realiza, com recursos próprios, a construção de fossas biodigestoras e sépticas para minimizar este problema, mas que nada se compara a decisão da justiça federal que obriga a prefeitura de Duarte Nogueira e o DAERP a implementarem a rede sanitária em todo o assentamento. Kelli ressaltou também que o poder público municipal sempre esteve contra os interesses da população, a fim de beneficiar a especulação imobiliária, com forte interesse na área, e o agronegócio, que sempre despejou grandes quantidades de veneno sobre a produção de cana-de-açúcar que restou no entorno do PDS.
“Em Ribeirão Preto, a zona leste é uma área de recarga do Aquífero Guarani. Infelizmente, o poder público é bastante conivente com a especulação imobiliária urbana, o agronegócio joga veneno na terra para o plantio de cana-de-açúcar, e nós, do PDS da Barra, a fazenda que foi arrecadada e virou assentamento, entendemos que essa decisão é um enorme serviço ao meio ambiente, não só para as famílias do assentamento, mas para todas as famílias de Ribeirão Preto e dos quatro países que se servem das águas do Aquífero Guarani.”
Kelli lembrou também que a decisão fortalece a proposta defendida pelo MST e que está sintetizada no Termo de Ajuste de Conduta (TAC). “O TAC é um compromisso ambiental e social que as famílias assinaram com muita vontade, porque o MST entende que por ser uma área de recarga do Aquífero Guarani é muito importante que 35% da mesma seja preservada para reserva ambiental, a fim de recuperar a recarga do aquífero e toda a região da Zona Leste”, lembra. “Outra coisa é a distribuição de água que ainda é muito difícil acontecer na zona rural, mas que precisamos garantir a todas as pessoas. Hoje essa distribuição acontece de forma muito precária, com mangueira preta que pode, inclusive, trazer malefícios para a saúde humana”, conclui.
O que diz o Ministério Público Federal
A Prefeitura de Ribeirão Preto alegava que não tinha atribuição para realizar as obras de saneamento pelo fato de a área pertencer à União. Essa negativa era um obstáculo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que sempre afirmou saber de sua responsabilidade sobre a estrutura do assentamento, mas que dependia de uma atuação conjunta com os órgãos municipais para a execução do projeto.
Sobre o argumento do governo de Duarte Nogueira, a 2ª Vara Federal de Ribeirão Preto escreveu na decisão: “[…] ainda que o local seja um assentamento de reforma agrária, as pessoas que lá residem são cidadãos residentes no município de Ribeirão Preto/SP, aqui exercendo seus direitos de cidadania, como o voto e o pagamento de tributos, não podendo continuar a serem tratadas como ‘invisíveis’, especialmente quando está em curso severo dano ambiental que pode afetar incontáveis pessoas no presente e no futuro, com o risco iminente de contaminação por esgoto em área de recarga do Aquífero Guarani”.
*Editado por Maria Silva