Solidariedade

Cozinhar é um ato político: ação Marmitas da Terra completa 1 ano em Curitiba

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) encontrou na cozinha a maneira de unir o campo e a cidade em ações de solidariedade que alimenta quem mais precisa nesta pandemia
Marmitas da Terra completam 1 ano. Foto: Giorgia Prates

Por Jade Azevedo 
Da Página do MST

A ação Marmitas da Terra é uma experiência desenvolvida pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais do Paraná (MST-PR) que traz para a cozinha da cidade o debate sobre a reforma agrária popular além de alimentar com comida, sem veneno, a população em situação de rua de Curitiba, famílias e trabalhadores de bairros periféricos e região metropolitana. 

A ação começou no início da pandemia, no dia 2 de maio, e completa um ano esta semana. No início, com uma equipe pequena, quase toda composta por integrantes do Movimento Sem Terra, produziam 300 marmitas. Com algumas semanas de cozinha funcionando, a ação ganhou voluntários e aumentou a produção. “Em cada entrega era evidente a necessidade de aumentar a produção de refeições e em 2020 fechamos o ano produzindo entre 700 e mil marmitas todas as quartas-feiras”, afirma Adriana Oliveira, integrante do MST e coordenadora do Marmitas da Terra. 

Foto: Wellington Lenon

Neste um ano de ação, já são 150 voluntários e mais de 55 mil marmitas produzidas principalmente com alimentos da reforma agrária e da agricultura familiar, contando com doação feita nesta quarta-feira (5). A produção passou a ser de 1.100 marmitas por semana e ao todo o MST no PR já doou cerca de 600 toneladas de alimentos em todo o estado. Adriana explica que o projeto vem para matar a fome que está ali gritando na barriga da população em situação de rua, mas também para consolidar a participação da periferia de Curitiba na luta pelo seu direito à boa alimentação. “A ação não se centraliza somente em levar marmitas para essas famílias e sim em incentivar a criação de hortas, cozinhas e padarias coletivas nos bairros”. 

Ela acrescenta que o Marmitas da Terra foi a oportunidade que abriu espaço de diálogo e aproximação do trabalhador do campo com o da cidade. “Foi um processo que começou na cozinha e deu um passo levando esse voluntário-militante da cidade para os espaços do movimento em assentamentos e acampamentos, para conhecer as famílias e aprender a trabalhar na terra”. 

Plantar solidariedade para defender a vida

Desde setembro do ano passado, o coletivo decidiu fazer suas próprias hortas com legumes, grãos e hortaliças. “A ideia é produzir alimentos que sejam a base das marmitas que produzimos todas as quartas”, afirma Marco Antonio Pereira, integrante do MST e do Marmitas da Terra. “Com as hortas de ciclo curto e médio, o voluntário tem a chance de acompanhar todo o processo de mexer com a terra, plantar, colher e poder entregar esse alimento para quem precisa na marmita”.

Segundo ele, o coletivo dialogou com as famílias do MST do assentamento Contestado, na Lapa, e com a Escola Latino Americana de Agroecologia para que ali fossem produzidas algumas hortas que seriam trabalhadas pelos voluntários da cozinha. A iniciativa deu certo, e até o momento já foram plantadas mais de 18 mil hortaliças, além de feijão, milho e arroz. Todos os sábados o mutirão sai da capital Curitiba e vai para o assentamento aprender a plantar, cuidar da terra e colher. 

Os resultados vieram rápido. Em janeiro deste ano, o coletivo fez sua primeira grande colheita. Foram cerca de 4 mil quilos de feijão orgânico. Bárbara Górski Esteche, advogada, integrante do Movimento de Assessoria Jurídica Universitária Popular (MAJUP), conta que nunca tinha colhido feijão antes e que mesmo assim conseguiu participar efetivamente do trabalho com as instruções que recebeu. “Foi muito especial, principalmente pelo momento em que estamos vivendo de pandemia. Para o MAJUP também faz muito sentido porque desde o início participamos de ações junto ao MST”, acrescenta. O feijão colhido foi para três cozinhas comunitárias de Curitiba e também fez parte das doações de alimentos de fevereiro a famílias em situação de vulnerabilidade social em bairros periféricos da capital. 

Neste 1º de maio, as comemorações do Dia Internacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras aconteceram em uma grande ação, batizada como “Plantar solidariedade para defender a vida”, em que o Marmitas da Terra participou junto a outras entidades, movimentos sociais e sindicatos. Foram doadas 560 cestas de alimentos e 100 cargas de gás a famílias do bairro Sabará, região sul da capital. O trabalho do coletivo iniciou uma horta comunitária junto aos moradores e o Centro de Assistência Social Divina Misericórdia (CASDM), espaço administrado pelo Centro de Integração Social Divina Misericórdia (CISDIMI), no bairro.

Por comida, vacina e saúde

Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, são 14.200 milhões de trabalhadores e trabalhadoras desempregados e 6 milhões de desalentados (que desistiram de procurar emprego) no Brasil. 

Se a falta de trabalho é uma realidade para quase metade da população, a fome também é alarmante. Pelo menos 19 milhões de brasileiros passam fome e 116,8 milhões de pessoas, mais da metade dos domicílios no país, enfrentam algum grau de insegurança alimentar. A pesquisa é da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), divulgada no início de abril. 

Foto: Joka Madruga / Terra Sem Males

Além disso, este 1º de maio também traz os números de vítimas da pandemia. No Brasil, já são 400 mil mortes por conta da Covid-19, por isso a ação deste sábado também cobra o direito à vacinação para toda a população, a defesa do SUS e o auxílio emergencial de R$ 600 para cada trabalhador sem renda.

*Editado por Fernanda Alcântara