Solidariedade Internacionalista
O domínio imperialista na África
Por Lauro Allan Almeida Duvoisin
Da Página do MST
No dia 26 de fevereiro de 1885 se encerrava a Conferência de Berlim que reuniu na capital do Império Alemão as principais potências europeias da época. O objetivo desse encontro diplomático que durou três meses era resolver os conflitos entre as grandes potências, que estavam expandindo sua área de atuação no continente africano. O resultado foi uma série de acordos de partilha delimitando os domínios de cada um dos impérios coloniais.
Mais do que um evento pontual, o domínio do território africano foi um longo processo que teve início com a chegada dos portugueses no século 15 e se completou às vésperas da I Guerra Mundial (1914-1919). Até o século 19, os europeus não se aventuraram no interior do continente, considerado território hostil. Restringiram-se a instalar feitorias litorâneas próximas à entrada e saída dos grandes rios, como Níger, Congo e Senegal, controlando as artérias das extensas rotas comerciais conectadas ao interior. Nesta primeira fase de acumulação mercantil, os comerciantes europeus extraíam da África mercadorias lucrativas como marfim, cacau, azeite de palma, ouro, e principalmente seres humanos escravizados.
O século 19 marcou uma mudança dessa dinâmica. Com a revolução industrial, a Grã-Bretanha tornou-se a “senhora dos mares”, detentora de uma poderosa esquadra militar e mercantil, e expandiu seus domínios coloniais, formando um império “onde o sol nunca se põe”. Mas em pouco tempo a industrialização avançou em outros países da Europa, como França, Bélgica, Holanda, Alemanha e Itália. Esses novos complexos industriais passaram a demandar alimentos, matérias-primas e energia daquela extensa rede comercial colonial pré-existente. Mais do que isso, a emergente classe capitalista sediada nas potências europeias estava ávida por novas oportunidades de investimento. Mas, enquanto as potências mais antigas como Grã-Bretanha e França saíam em vantagem, as mais novas, especialmente Alemanha e Itália que haviam se unificado há pouco tempo, tinham que disputar um cenário já consolidado. Esta foi a base dos conflitos imperialistas ocorridos no século 19 e que culminaram na I Guerra Mundial (1914-1919).
A paisagem global estava se modificando rapidamente. O longo declínio do Império Otomano no norte da África acirrava a concorrência europeia na região. A França avançava sobre a Tunísia, a Itália sobre a Líbia, e a Grã-Bretanha sobre o Egito. O Império Português, já em decadência, buscava garantir suas antigas colônias em Angola e Moçambique. Em 1869, a Grã-Bretanha inaugurava o Canal de Suez, uma obra monumental e estratégica capaz de encurtar de cinco para um mês o tempo de viagem entre Londres e sua colônia indiana. No sul do continente, os holandeses lutavam contra os britânicos pelo domínio de regiões ricas em ouro. A conquista do interior do território e a construção de ferrovias se deu através de atrocidades, como o sistemático genocídio realizado pelos belgas no Congo. As duas únicas regiões que não sucumbiram ao domínio europeu foram a Libéria, uma colônia de ex-escravizados retornados dos Estados Unidos, e o lendário reino da Etiópia, que resistiu heroicamente às tentativas de invasão italiana.
Além dos interesses econômicos, os europeus também moviam-se por valores racistas. Acreditavam que a Europa era uma ilha de civilização cercada por um vasto mundo inferior, bárbaro e até mesmo animalizado. Assim, desenvolveu-se o racismo científico, com base no qual pesquisadores como Joseph Arthur de Gobineau e Cesare Lombroso buscavam comprovar a inferioridade das “raças” africanas e a superioridade das europeias. Junto aos comerciantes e representantes das coroas europeias, chegavam também os primeiros missionários com a tarefa de converter as populações locais ao cristianismo.
O objetivo da Conferência de Berlim era unicamente estabilizar o quadro de conflitos entre as potências europeias, legitimando principalmente o expansionismo inglês. Mesmo assim, trinta anos depois, a eclosão da I Guerra Mundial revelava a força insaciável e destrutiva do imperialismo. Nenhum representante dos povos africanos esteve presente na reunião. A delimitação dos novos Estados coloniais africanos não respeitou a distribuição geográfica dos reinos, nações e etnias pré-existentes na região. Esta foi a raiz de um conjunto de contradições difíceis de superar, mesmo depois da descolonização, que repercutiram em economias dependentes e subdesenvolvidas, guerras étnicas e Estados enfraquecidos.