Despejo Zero
CEJUSC visita acampamentos do MST PR; “Tudo que temos está aqui”, diz camponesa
Por Juliana Barbosa e Barbara Zem
Da Página do MST
Entre os dias 31 de março e 1 de abril, comunidades do MST na região Centro-oeste do Paraná receberam a visita do desembargador e presidente da Comissão de Mediação de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do estado (CEJUSC), Fernando Antonio Prazeres. Os acampamentos visitados foram Irmã Dorathy, de Barbosa Ferraz; Nova Canaã, em Peabiru, e Valdair Roque, de Barbosa Ferraz.
Depois das visitas, o desembargador Prazeres relatou o que viu nas comunidades: “São extremamente organizadas, estão produzindo, fazendo o que cabe ao agricultor, fazendo uma função social e produzindo alimentos e explorando a terra como deve ser explorada. Essas ocupações são antigas e já consolidadas e isso deve ser levado em consideração no momento da decisão”.
Para o desembargador, a solução do conflito pode ser a efetivação da Reforma Agrária: “O ideal seria encaminhar essas áreas para a Reforma Agrária, porque já existe um histórico de ocupação das famílias nas áreas e uma ligação dessas famílias com a terra. Então, a princípio não haveria razão para uma simples desocupação, sem passar por uma avaliação prévia que vise a desapropriação da área por fins de formação do assentamento”.
De acordo com Paulo Sérgio, morador da comunidade Valdair Roque e da direção da região, nessas comunidades há famílias que já vieram de outros espaços que já sofreram despejos. “Entendemos que a gente precisa ir construindo essa aliança com a sociedade através da Reforma Agrária Popular, aqui os acampamentos têm cumprido um papel importante no ponto de vista de produzir alimentos saudáveis”.
As comunidades cultivam hortas comunitárias e têm doado alimentos, como parte da campanha nacional de solidariedade organizada pelo MST desde o início da pandemia. Ao todo, cerca de 960 toneladas de alimentos já foram partilhados pelas famílias Sem Terra do Paraná.
O prefeito de Barbosa Ferraz, Edenilson Aparecido Miliossi, também participou da visita à comunidade Irmã Dorothy. “Essa área era ocupada por uma família e hoje temos 31 famílias morando aqui, dando contribuição social. Esse pessoal veio ocupar uma área improdutiva que metade era de arrendatário, e a outra era abandonada”, afirmou. “Aqui temos crianças jovens adultos, famílias que fazem parte de Barbosa Ferraz, temos igreja, crianças frequentando a escola, então somos gratos a comunidade”, concluiu o prefeito.
Josélia Farias mora na comunidade irmã Dorathy há 17 anos com sua família. “A gente vive aqui lutando, trabalhando, plantando alimento, trabalho na lavoura e com o leite, para nós é nossa vida toda aqui nessa terra”, garante.
Para a camponesa, a visita do desembargador foi muito importante e esperada por toda comunidade “A gente espera que ele contribua com uma decisão favorável para que nós continuemos morando aqui. Dependemos da terra para sobreviver, para que eu consiga criar meus filhos e netos. Se eles nos despejarem, seria a maior tristeza de nossas vidas, para mim e para as 33 famílias, tudo que temos está aqui”, afirma Josélia.
O Padre José Carlos Krause Ferreira, da paróquia São Judas Tadeu, de Quinta do Sol, reforça a consolidação da comunidade Valdair Roque: “Aqui eles têm a capela que já mostra a organização, aqui eles produzem alimentos e partilham também. Fico feliz que as coisas estão se encaminhando para que eles continuem aqui produzindo alimentos saudáveis”.
Despejo Zero
Em todo o Paraná, mais de 70 comunidades do MST lutam pela terra. Em todo o Brasil, são cerca de 200 acampamentos com ameaça de despejo, e cerca de 20 mil crianças de até 12 anos vivem nestas comunidades.
As famílias que vivem há anos nas terras que antes eram improdutivas, pedem a compreensão do estado e o direito de permanecer na terra cultivada. “Temos horta, igreja, plantio coletivo para nós e para partilha na cidade. Hoje o estado não tem estrutura para comportar todos nós, caso houvesse um despejo”, afirma Angélica Gomes, moradora do Nova Canaã, de Peabiru.
O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de liminar do ministro Luís Roberto Barroso, determinou a proibição de despejos forçados e reintegração de posse, nas áreas urbanas e rurais, até o dia 30 de julho.
Mas, o desembargador considera que isso não resolve a situação dos despejos no país. “Pela situação socioeconômica do país não é suficiente, haveríamos de encontrar outras soluções após o dia 30 de julho e essa solução passa necessariamente por uma conjugação de esforços de todos os poderes judiciário, executivo e notadamente o legislativo. Então, deveríamos encontrar um caminho legal para essas liminares ou achar uma outra solução para essa crise social que passamos”, completa o desembargador Fernando Prazeres.
A luta por Despejo Zero continua, mas com essa liminar será possível reorganizar e por vias legais trazer mais fundamentos para que esses despejos acabem. Dessa forma, as pessoas que estão nesses locais possam continuar suas vidas sem interrupções.
“Hoje se acontecesse um despejo as famílias não teriam para onde ir, são famílias que vivem desse espaço. Parte dessas famílias são filhos de camponeses que sempre trabalharam na roça, já fomos desalojados uma vez e sofremos muito’, disse Paulo Sérgio.
Também estavam presentes na visita representações de órgãos do judiciário e do executivo estadual e municipais, como o Ministério Público Estadual, Defensoria Pública do Paraná, Superintendência Geral de Diálogo e Interação Social do Governo do Paraná (Sudis), padres das três cidades, prefeitos de Barbosa Ferraz e Quinta do Sol, professores da Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR), Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário (Sindijus) e o presidente da associação comercial de Quinta do Sol.
Fotos: Juliana Barbosa/MST-PR
*Editado por Solange Engelmann