Educação é direito
Pronera: 24 anos de conquista e resistência na Educação do Campo
Por João Carlos de Campos, Paulo Henrique e Edgar Koling
Da Página do MST
“Quando um muro separa, uma ponte UNE!”
Dia 16 de abril de 2022 comemoramos 24 anos da criação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), ocorrida em 1998, resultado das reivindicações e pressão dos Movimentos Sociais Populares do Campo. O programa foi criado ainda no vigor da mística que permeava o conjunto do Movimento e da sociedade pelos massacres de Eldorado do Carajás e Corumbiara. Foi por meio da Portaria Nº. 10/98, do extinto Ministério Extraordinário de Política Fundiária, e posteriormente instituído como política pública pela Lei 11.947, de 16 de junho de 2009 e regulamentado pelo Decreto 7.352/2010. O Pronera traz em suas raízes, sangue, lutas, marchas, sofrimentos, conquistas e muitos sonhos realizados.
Segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), entre os anos de 1998 e 2018, o Programa ofertou 499 cursos em parceria com 94 instituições de ensino, atendendo 186.734 beneficiários, desde a Educação de Jovens e Adultos (EJA) até programas de pós-graduação. Demonstrando que o Pronera tem contribuído diretamente na democratização da educação para as populações do campo, justificando a necessidade de continuação e fortalecimento de suas ações.
Um marco na gestão democrática da política pública no Brasil, o Pronera articula em sua condução os movimentos sociais, sindicais de trabalhadores e trabalhadoras do campo, o INCRA enquanto autarquia federal e as universidades estaduais, federais e Institutos Federais (IFs). Um divisor de águas nesta política é o reconhecimento do protagonismo dos camponeses na gestão da política pública, o que está assegurado no manual de operações do programa, que inclui os movimentos sociais como parte do colegiado dos cursos e programas desenvolvidos com apoio do Pronera em convênio com as universidades e IFs.
Desde o Golpe de 2016 o Pronera vem sofrendo diversas investidas contra a sua continuidade. Houve uma drástica redução orçamentária, interrompendo o andamento de vários cursos. Fechou as portas para os Movimentos Sociais Populares, buscando deslegitimar estes como protagonistas na gestão da política pública. Como consequência, por meio de decreto, o Governo Bolsonaro no início de seu governo extinguiu todos os conselhos, comissões e outros mecanismos de participação popular que contribuíam na gestão democrática de diversas políticas públicas em distintos ministérios e secretarias federais. Esse decreto extinguiu também a então Comissão Pedagógica Nacional do Pronera (CPN). Esta comissão tinha como tarefa a recepção, avaliação e aprovação de novos cursos e projetos demandados ao programa, e atuava também como espaço de definição das linhas de atuação deste. Algo semelhante ocorreu durante o segundo mandato do governo de Fernando Henrique Cardozo (1998-2001), naquele período o Pronera ficou um ano inteiro sem reunião e com orçamento garantido somente via emendas parlamentares. No atual governo já são quatro anos sem reunião da CPN, que mesmo sendo destituída pelo governo federal, continua como uma frente de trabalho no Fórum Nacional de Educação do Campo (Fonec) e tem articulado as demandas dos movimentos sociais junto às universidades Brasil afora.
No marco dos ataques ao programa perpetrados desde o governo golpista de Michel Temer, destaca-se também o decreto sob nº 10.252/2020, de 21 de fevereiro de 2020, que alterava a estrutura regimental do Incra, extinguia a Coordenação-Geral de Educação do Campo, instância que era responsável pela gestão e execução do Pronera.
Diante da pressão e posicionamento do Fonec, de parlamentares, movimentos sociais e as notificações da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e a recomendação do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) por meio da Resolução nº 8, em que recomenda que seja revogado o Decreto, fez com que o Governo, através do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e do Incra, revesse a extinção do Pronera da estrutura da autarquia, foi assim que em 23 de março de 2020, foi publicado no Diário Oficial da União o novo Regimento Interno do Incra, onde o tema da Educação, com menção ao Pronera, voltou a figurar como um das atribuições do Incra.
No novo regimento foi criada a Divisão de Desenvolvimento e Educação nos Assentamentos (DDA-2), que passou a figurar entre as competências: questões relacionadas à comercialização, meio ambiente, assistência técnica e Pronera, dentre outras.
Um dos desafios nestes tempos é de manter vivo o Pronera, como política pública que se constitui a partir do envolvimento de governos, Universidades e Movimentos Sociais. Essa articulação é força política, que se materializa no número de pessoas estudando e das Instituições de Educação Superior (IES) envolvidas.
As turmas do Pronera envolvem estudantes de diferentes Movimentos, organizações e pessoas que ao entrarem nos cursos, ainda não participam de nenhum Movimento Social. Podemos analisar esse cenário como algo que dá mais força ao programa.
O Pronera continua vivo! Mesmo aos trancos e solavancos, há diversos cursos em andamento. Trabalhando com muitas dificuldades, mas resistindo e inspirando a resistência de forma coletiva.
O Pronera foi responsável pela formação de uma geração de lutadoras e lutadores do povo, camponeses e camponesas, de uma gigantesca massa de jovens oriundas e oriundos do campo, das áreas de reforma agrária. Tem cumprido assim um papel fundamental na garantia de direitos aos povos do campo, fortalecendo a Educação do Campo e a construção de um projeto de país mais democrático e popular.
Estas gerações hoje atuam em diversas áreas como profissionais, contribuindo no fortalecimento das lutas em defesa da Reforma Agrária, da Agroecologia e das relações humanas e socioculturais, de um Projeto Educativo que tenha no campo a valorização do ser humano e sua relação com a natureza, a produção de alimentos saudáveis e um projeto de campo onde possamos desenvolver o que há de mais belo nas nossas potencialidades humanas.
Vida longa ao PRONERA!
*Editado por Yuri Simeon