Lutas e Mobilizações
MST celebra a Resistência Camponesa e as Mulheres Negras em todas as regiões do país
Por Solange Engelmann e Lays Furtado
Da Página do MST
Reforçando os marcos das lutas internacionais celebradas neste 25 de julho, o MST realizou diversas mobilizações pelo país, que aconteceram desde a última sexta-feira (22), sobre a importância da Agricultura Familiar Camponesa e da luta das Mulheres Negras Latino-Americanas e Caribenhas.
Ocorreram mobilizações em todas as grandes regiões do país, onde milhares de famílias Sem Terra se uniram com outros movimentos populares organizando marchas, romarias, atos, protestos, feiras, encontros e doações de alimentos para marcar as datas celebrativas em comemoração. Mas também em denúncia sobre os desmontes que o atual governo vem promovendo sobre as políticas agrárias e descaso com a população negra, sobretudo, as mulheres.
Entre as atividades realizadas, se reafirmou a necessidade da Reforma Agrária enquanto política fundamental para fortalecer a agricultura camponesa – paralisada pelo governo de Bolsonaro – debatendo com a sociedade sobre a relevância da classe trabalhadora do campo. E relembrando também na mesma data, o Dia Nacional de Tereza de Benguela, liderança quilombola histórica no Brasil.
Kelli Mafort, da Coordenação Nacional do MST, explica que as diversas ações realizadas pelo país, trouxeram ao longo desta semana a simbologia da luta da Agricultura Familiar Camponesa como enfrentamento à fome, que atinge principalmente a população mais pobre, e impacta em cheio os lares liderados pelas mulheres negras no Brasil. A dirigente afirma que:
“Essas mulheres estão na base social da desigualdade e da exploração, por isso, quando as mulheres negras se movem, mexem com toda estrutura desigual. O 25 de julho também trouxe a força de Tereza de Benguela e a resistência dos povos do campo, das águas e das florestas. Seguimos na luta pelo direito à terra, comida de verdade e direitos”.
População negra e rural é a mais atingida pela fome
Atualmente, são 125,2 milhões de pessoas residentes em domicílios que não têm a garantia de alimentos suficientes para suas famílias e 33,1 milhões em situação grave de fome. Ou seja, 6 em cada 10 lares convivem com algum grau de insegurança alimentar no país, é o que mostram os dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (II VIGISAN), cuja coleta ocorreu entre novembro de 2021 e abril de 2022.
Apesar de ser no campo o lugar onde há maiores condições propícias para a produção de alimentos, sem acesso à terra e de políticas públicas que fomentem a Agricultura Familiar Camponesa, a desigualdade de acesso aos alimentos se manifesta com maior força nessas regiões, onde 18,6% das famílias rurais têm enfrentado a fome em seu cotidiano. Outros traços geográficos também apontam que 25,7% dos lares em situação de fome residem na região Norte e 21% no Nordeste.
A insegurança alimentar também está diretamente relacionada a outras condições de desigualdade. Onde a fome está presente em 43% das famílias com renda per capita de até 1/4 do salário mínimo, atingindo mais as famílias que têm mulheres como responsáveis e/ou aquelas em que a pessoa de referência para o sustento se denomina de cor preta ou parda, é o que aponta o Inquérito. Salientar, ainda, que além da falta de alimentos, pelo menos 12% da população brasileira não tem acesso regular à água para consumo.
Enquanto a insegurança alimentar foi encontrada em 53,1% dos domicílios com responsáveis homens, naqueles onde as mulheres eram a referência 63% apresentaram a mesma classificação. Já os domicílios cujos responsáveis se identificavam como pretos ou pardos 65% viviam com alimentos insuficientes, enquanto nos lares cujos responsáveis eram autorreferenciados como brancos, 46,8% estavam na mesma situação de insegurança alimentar.
Agronegócio lucra sobre a devastação e a fome no Brasil
Nesse cenário de crises, Kelli ainda pontua que, não é possível admitir que enquanto mais da metade da população brasileira enfrenta algum nível de insegurança alimentar, o agronegócio vai bem com safras e lucros recordes nos últimos anos, à custa do aumento da fome do seu povo, apontando uma grave contradição que esbarra no discurso de que é o agronegócio que “alimenta” o país.
Dessa forma, a tal “riqueza” anunciada pelos ruralistas como produto do segmento do agronegócio, “avançam sobre territórios indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, causando violência contra os povos, destruição ambiental e saque de bens naturais”, denuncia a dirigente, em artigo sobre A luta da mulher negra e a resistência da agricultura camponesa contra a fome.
“Sim, o agronegócio gera a fome! (…) sua produtividade se dá mais por ampliação de área plantada do que por investimento em ciência e tecnologia. Sua produção de commodities avança sobre áreas de produção de alimentos de assentamentos e da agricultura familiar, mas também sobre áreas desmatadas, e em geral, griladas, pois essa tem sido uma forma de demarcação territorial das empresas”, afirma Kelli.
Frente a todo esse desmantelo contra a vida, direitos e a soberania brasileira, a dirigente menciona que não há outra saída senão a luta. “Lutemos, com a força guerreira de Tereza de Benguela e dos povos do campo, por terra e Reforma Agrária”, sintetiza Mafort, convocando o povo para o enfrentamento permanente contra todos os retrocessos e o aumento da exploração e das desigualdades, promovidas pelo capitalismo e pelo desgoverno de Bolsonaro.
Confira as ações realizadas nas grandes regiões do país:
Lutar! Construir Reforma Agrária Popular!
Em Alagoas, a mobilização aconteceu desde o último domingo (24), e faz parte da Jornada de Luta em Defesa da Reforma Agrária, contra a Fome e a Miséria, com a participação de diversos movimentos de luta pela terra no estado. Onde cerca de 3 mil camponeses e camponesas saíram em marcha percorrendo 14 km até o centro de Maceió, para denunciar a paralisação da Reforma Agrária e reivindicando fomento à agricultura familiar.
Desde segunda-feira (25), as famílias camponesas montaram um acampamento em frente ao Palácio do Governo na capital, e na manhã desta terça (26), chegaram a ocupar a superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
Após as mobilizações realizaram audiência com o governador Paulo Dantas (MDB) para pautar a necessidade de políticas públicas para o campo. Além do MST, participam do ato unitário a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Frente Nacional de Luta (FNL), o Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST), Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL), Movimento de Luta pela Terra (MLT) e Movimento Terra Livre.
Outras atividades celebrativas com o tema da luta pela terra aconteceram no estado de São Paulo durante este fim de semana. A Comuna da Terra Irmã Alberta, território conquistado pelas famílias do MST localizado em Perus, na periferia da zona norte da capital, comemorou seus 20 anos de existência com um ato político-cultural exaltando a produção de alimentos saudáveis desenvolvidas por meio da agricultura familiar camponesa.
Ainda neste final de semana, ocorreu a 23ª Romaria da Terra, das Águas e das Florestas de São Paulo. A atividade foi organizada pelo MST e a CPT no Acampamento Marielle Vive, em Valinhos, interior paulista, e contou com café da manhã coletivo, celebração ecumênica, mística e plantio de mudas de árvores.
Em Minas Gerais, as celebrações foram feitas no Assentamento Dênis Gonçalves em Chácara e Goianá, durante a festividade camponesa da região que completa 177 anos de tradição da Festa de Nossa Senhora de Sant’Anna, reunindo assentadas e assentados da região e público visitante. A festividade teve programações de caráter político-cultural e contou comidas típicas, cavalgada, missa, procissão e o tradicional churrasco com almoço partilhado.
Na região Norte, em Belém do Pará, o MST promoveu uma noite cultural neste sábado (23), durante a II Feira da Agricultura Familiar no distrito de Mosqueiro, na praça do Carananduba. A feira é um dos principais espaços cotidianos onde as famílias Sem Terra dialogam com a sociedade sobre a importância da agricultura familiar, da agroecologia e Reforma Agrária Popular, o local também é palco de atos políticos-culturais que ocorrerão aos finais de semana até o próximo dia 8 de agosto.
Campesinato cultivando a vida, agroecologia e solidariedade
No Nordeste, durante as ações da Jornada em Alagoas, o conjunto do campo unitário doou 10 toneladas de alimentos de sua produção, que beneficiaram centenas de famílias vulneráveis da comunidade da Vila Brejal, área periférica da capital, em Maceió. Ainda como parte das ações de solidariedade, os movimentos do campo também mobilizaram agrupamentos para a realização de doações de sangue no Hemocentro de Alagoas (HEMOAL).
Já na região Sul e Sudeste do país, as ações de solidariedade vinham sendo articuladas ao longo de todo o mês de julho, marcando presença nos bairros populares e apontando a agroecologia como matriz tecnológica na produção de alimentos saudáveis, sem agrotóxicos, apresentando soluções emergenciais em combate à fome no país.
Assim, o MST distribui mais de 40 toneladas de arroz orgânico, produzido por cooperativas conquistadas na luta pela Reforma Agrária Popular, e que estão sendo distribuídos nas capitais de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, beneficiando 160 organizações populares na luta contra a fome. A iniciativa tem sido feita em parceria com a campanha Gente é pra Brilhar não pra Morrer de Fome, envolvendo amplo setores da segurança alimentar e chefes de cozinha como Rodrigo Mocotó e Bel Coelho.
Além da ação em conjunto com a campanha Gente é pra Brilhar não pra Morrer de Fome, que beneficiou famílias vulneráveis na capital do Paraná, Curitiba. Outra ação solidária desenvolvida no estado ocorreu na última sexta-feira (22). Onde cerca de 25 comunidades do MST, localizadas em 10 municípios das regiões Centro, Centro-sul e Centro-oeste do estado, dedicadas à agricultura familiar camponesa, se juntaram para doar 52 toneladas de alimentos para famílias urbanas do município de Guarapuava. Com a ação, o MST no Paraná ultrapassa a marca de mil toneladas de alimentos partilhados desde o início da pandemia da Covid-19 com famílias em situação de vulnerabilidade no estado.
Julho das Pretas, Camponesas e Indígenas
Na última sexta (23), na região Norte do Brasil, em Roraima, o MST em conjunto com organizações do campo popular, participaram das atividades promovidas no Julho das Pretas no Espaço Cultural Paricá, onde foi debatido sobre o tema do racismo, e os desafios do empoderamento e bem viver das mulheres negras e indígenas.
Também nesta sexta-feira (23), na região Centro-Oeste, no Mato Grosso do Sul, o conjunto da militância Sem Terra e organizações populares desenvolveram ato político-cultural no Armazém do Campo de Campo Grande, celebrando o Dia das Mulheres Negras Latinas e Caribenhas, debatendo com o conjunto da sociedade sobre a importância deste marco de lutas com muita mística, reunindo amigas e amigos do Movimento e público em geral.
Ainda em celebração ao Dia da Mulher Negra Caribenha e Latino-Americana e ao Dia da Agricultura Familiar, nesta segunda (25), as mulheres Sem Terra do assentamento Mário Lago, em Ribeirão Preto, São Paulo, se reuniram em atividade comunitária, refletindo sobre o tema das relações humanas emancipadas e os desafios da atualidade imposto pelas diversas camadas de violências do sistema capital, acumulando experiências que têm sido promovidas pelo Setor de Gênero do MST. No interior de São Paulo, também foi realizado um encontro com as mulheres do campo e da cidade no município de Rosana.
No Rio Grande do Norte, as mulheres Sem Terra do assentamento popular José Martí, localizado no município de Canguaretama, também celebraram o dia 25 de julho, reunindo as companheiras assentadas em mutirão de plantio de mudas em área coletiva do assentamento.
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*Editado por Diógenes Rabello