LGBT Sem Terra
LGBTQIA+ Sem Terra do RS realizam seminário sobre saúde e alegrimia
Por Maiara Rauber
Da Página do MST
Na segunda-feira, dia 26 de setembro, os LGBTQIA+ Sem Terra do Rio Grande do Sul participaram de um seminário que tratou principalmente da saúde desse público, no Instituto de Educação Josué de Castro, localizado no assentamento Filhos de Sepé, em Viamão. Para falar sobre o assunto foram convidados a ativista trans e membro do Comitê Técnico de Saúde da População LGBT do RS, Sophie Nouveau Fonseca Guerreiro, o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e coordenador do Centro de Referência em Direitos Humanos (CDRH), Guilherme Gomes Fonseca.
O Seminário Promovendo Saúde e Alegrimia: debate sobre a saúde LGBTQIA+ faz parte do calendário de planejamento do Curso Saber Protege, uma experiência de formação de saúde popular à população LGBT do campo, que conta com a parceria do MST e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Essa formação visa instrumentalizar agentes que levem informação aos territórios de Reforma Agrária Popular e que visualizem formas de acesso e de cuidado para a saúde LGBT Sem Terra.
Conforme Daniel Piovesan, do coletivo LGBT Sem Terra do RS, a escolha do nome do seminário Promovendo Saúde e Alegrimia, sobretudo do termo alegrimia é por estar conectado às nossas raízes, a ressignificação do cuidado. “Vai para além da proteção, é a promoção da vida. Valorizando o saber popular, o bem viver e as diversas formas de nos conectar com a vida e existir”, pontua.
Para Piovesan, foi muito importante reforçar a relevância dessa pauta. “O debate sobre diversidade sexual a partir do tema da Reforma Agrária Popular que nós queremos. É sobre pensar todas as dimensões e existência do sujeito, defendemos um campo com diversidade, oportunidade, direito à saúde e à vida. Por isso é super necessário trazermos o debate da saúde LGBT para o campo onde esse debate parece estar tão distante”, destaca.
O primeiro assunto abordado no dia foi apresentado por Sophie Guerreiro, que trouxe a diversidade da sigla LGBTQIA+. Em sua fala, ela enfatiza a importância de cuidado e conhecimento com o corpo do indivíduo. “Conhecer o próprio corpo garante que a gente consiga pelo menos ter um pouco mais de autonomia para reconhecer alguma alteração nele”, explica.
Segundo ela, o autoconhecimento físico também parte do princípio que a pessoa tenha um autoconhecimento do seu corpo mental. “A maneira como a gente liga com os mecanismos que a gente tem a nossa disposição, a nossa personalidade, do que a gente aprendeu da nossa cultura para estar lidando com algumas situações. Por exemplo, eu sei que se eu beber eu tenho um determinado comportamento. Então quando a gente parar para pensar no autoconhecimento do corpo é dentro da lógica da integralidade, ou seja, a gente vai identificar o que nos compõem dentro do espectro biopsicossocial espiritual e sexual e a partir daí a medida que a gente vai se conhecendo vai ficar mais fácil para a gente entender os nossos limites e também impor limites.” afirmou Sophie.
Ela destaca que conhecer o corpo traz benefícios diretos para a saúde. “Isso já deveria ser ensinado desde cedo, na infância. Acho que se torna muito mais fácil se as pessoas tivessem recursos para poder evitar algumas situações ou pelo menos ter um repertório maior de possibilidades para estar lidando com alguns problemas”, pontua.
A prevenção de doenças está integralmente ligada a isso, principalmente ao tratar de doenças sexualmente transmissíveis. Sophie destacou os principais agravos encontrados no serviço de saúde ao realizarem a testagem rápida de infecções sexualmente transmissíveis, sendo elas sífilis, hepatite b, hepatite c, e o HIV.
“Precisamos entender que a saúde sexual, não deve ser tomada como algo só relacionado com doença. Ação sexual integral, é uma dimensão da vida que ela vai estar repercutindo nos outros fatores que vão estar influenciando na forma como uma pessoa vai estar lidando com o ambiente dela mesmo”, argumenta.
De acordo com a ativista trans e membro do CTSPLGBT do RS é preciso entender que todos os agravos citados têm tratamento com alguma intervenção e essas intervenções acabam sendo muito efetivas. “Sabemos que a sífilis quando tratada adequadamente tem cura, a hepatite b tem chance de cura, tem vacina. As doses podem ser buscadas em qualquer serviço de saúde, no centro de vacinação”, assinala.
Já o HIV é o único dentre todos esses que ainda não tem cura. “Mas mesmo que não tenha cura para o HIV, temos algumas alternativas, tratamentos eficazes. É importante a gente ter essa ciência se essa pessoa contrai o HIV, o que pode acontecer com qualquer pessoa, essa infecção ela não precisa ser como era antigamente, temos vários tratamentos nos últimos 10 anos”, explica Sophie.
Durante o seminário, também foram abordados os principais locais de apoio para o público LGBTQIA+ no estado gaúcho. De acordo com Guilherme Fonseca, existem diversos espaços que cumprem esse papel. Como o Centro de Referência dos Direitos Humanos da UFRGS, ONGs; Construindo Igualdade, em Caxias; Girassol, em São Borja. Já em Porto Alegre, tem a Somos – Comunicação, Saúde e Sexualidade, a Igualdade – Associação de Travestis e Transexuais, o Nuances – Grupo Pela Livre Expressão Sexual, o Grupo de Apoio à Prevenção da Aids (Gapa-RS) entre outras organizações nas diversas cidades gaúchas.
Além disso, existem no estado ambulatórios trans que estão ligados ao atendimento seguro e gratuito para pessoas trans. O público LGBTQIA+ também pode contar com as delegacias de polícia que combatem a intolerância e a violência contra essas pessoas. No âmbito da educação, há projetos de extensão como no Instituto Federal que tem o TransEnem que é um projeto de formação para pessoas trans. “Esses vários serviços podem ser encontrados e indicados pelo CRDH. Nesses espaços são oferecidos atendimentos, social, jurídico, psicológico. Tem lugares que fazem atendimento de saúde à população trans e contamos com trabalhadores e trabalhadoras comprometidos com a pauta e os serviços de assistência social, da educação, da justiça e dos direitos humanos”, simplifica o professor.
Outro assunto abordado no seminário foi a violência enfrentada pelo público LGBTQIA+. Para Guilherme o ideal é as pessoas buscarem o cuidado para a saúde mental após enfrentarem situações de perigo e ou de constrangimento. Mas também recorrer a uma assessoria jurídica, e um aconselhamento jurídico para encaminhamento gratuito dessa situação de homofobia, transfobia e violência, por fim, eventualmente abrir um processo criminal num processo judicial. “Mas sobretudo buscar um espaço de escuta, para poder falar sobre a sua experiência com a violência e uma experiência traumática nesse caso”, assinala o professor.
Ele ainda ressalta a importância do diálogo com a sociedade sobre as pessoas LGBTQIA+. “Eu acho que a gente só consegue mudar as coisas quando a gente fala delas. Nós que trabalhamos no social temos a esperança que as coisas mudem, que as pessoas possam refletir mais sobre esse tema. Eu sempre acho que a educação e os direitos humanos, a educação é diversidade sexual de gênero, ela nos ajuda a caminhar para uma nova sociedade, uma outra forma de vida. Que é essa luta progressista emancipatória e que busca a liberdade para todas as pessoas”, conclui.
O coletivo LGBT Sem Terra do RS, de acordo com Daniel Piovesan, vem pensando formas de criar esses espaços de debate, nas instâncias, nos territórios, nas escolas, e com a nossa juventude. “Precisamos nos fortalecer para resistir e para avançar na luta por direitos”, salientou.
Por fim, o Sem Terra enfatizou a importância de seguir com esses encontros e falou sobre os próximos passos do coletivo. “É a questão da pertença, do reconhecimento como um movimento social de luta e com isso ter vez e voz nos nossos espaços. Estamos construindo uma cartilha de estudo para infância e adolescência sobre as diferenças, e também de formação orientada aos professores para tratar o tema em sala de aula”, finaliza Daniel.
*Editado por Solange Engelmann