Cultura

MST no PR realiza 2º Curso de Formação do Carnaval e participa do Carnaval em Curitiba

Com a Unidos da Lona Preta, Movimento participa do Carnaval e realiza segunda edição do Curso de Formação Política do Carnaval
Foto: Leonardo Henrique.  

“(…) Chega de mordaça!
Nosso grito vai valer,
pelo canto das três raças,
o meu povo quer vencer!(…)”
Trecho do samba enredo GRES Leões da Mocidade 2023, por Wilson Paulino e Paulo Bearzoti Filho

Por Juliana Barbosa e Igor de Nadai, do Setor de Comunicação de Cultura do MST no PR
Da Página do MST

 Depois de 3 longos e duros anos sem o carnaval  no estado do Paraná, nem mesmo a frente fria, que trouxe chuva e quedas de temperatura para a avenida, fez com que Curitiba deixasse de sorrir, pular, dançar, cantar e se encantar com os desfiles das escolas de samba e de blocos carnavalescos na avenida Marechal Deodoro. Foi nesse ambiente de reconquista da alegria e de vida pulsante que a Unidos da Lona Preta mais uma vez pisou na capital paranaense junto à escola de samba Leões da Mocidade e seus 400 componentes. 

Assim, o carnaval de 2023 tem a marca de ser um evento histórico, pois é profundamente marcado pelos difíceis anos que as agremiações populares e culturais passaram no período da pandemia, aliado à ausência ou insuficientes políticas públicas dos governos para a manutenção destas agremiações.

Curso de formação do Carnaval: Estudo, vivência e luta!

A chegada dos Sem Terra para o Carnaval começa semanas antes do desfile, quando o Movimento se organizou na 2ª Edição do Curso de Formação Política do Carnaval e participou da preparação final para o desfile da escola de samba. 

A relação do MST com o carnaval de Curitiba começou em 2019, quando alguns militantes do Movimento, junto a famílias de ocupações urbanas da capital, participaram da construção das alegorias e do desfile junto a Leões. No ano seguinte, o Movimento dá um passo adiante e realiza a primeira edição do curso, com duração de 22 dias, em que se aliou a dimensão do estudo teórico e político, a formação técnica (bateria, confecção de alegorias e fantasias) além da vivência de participar do desfile e da escola de samba como um todo.

Já em 2023, o Movimento organizou a 2º edição do curso, com integrantes do MST vindos de acampamentos e assentamentos de várias regiões do estado para participar novamente do carnaval de Curitiba. O curso tem em seu programa estudos sobre a conjuntura política, formação do povo brasileiro, história da música e política no Brasil, agitação e propaganda, entre outros. Há também oficinas de percussão e canto popular, além da vivência e do trabalho prático na confecção de fantasias e alegorias da escola.

“Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer, participando sem medo de ser mulher”. As companheiras estiveram ativamente no Curso de Carnaval, produzindo alegorias, na bateria e na coordenação. Fotos: Leonardo Henrique

“Carlinhos”, como é conhecido Francisco Carlos, um dos educandos do curso e acampado na comunidade Fidel Castro, do município de Centenário do Sul, foi um dos Sem Terra que trabalhou dias a fio na construção de alegorias da Leões: “Sou MST, luto pela terra, pela reforma agrária, e tudo que for de bom pra população brasileira, plantar alimento e plantar cultura. Hoje estou aqui fazendo o carro alegórico da Igreja Nossa Senhora do Rosário, representando os negros, nossa raça, nossa origem. Somos vida, somos luta e somos samba!”, disse o jovem. 

Este ano, as atividades aconteceram entre o dia 6 até o dia 20 de fevereiro, na comunidade Nova Esperança, em Campo Magro, região metropolitana de Curitiba, finalizando o curso com a participando na apuração dos votos das escolas de samba.

Carlinhos (na primeira imagem) fortalece o trabalho coletivo na construção dos carros alegóricos. Fotos: Leonardo Henrique

Ao longo de quase 15 dias de curso, o grupo participou de formações sobre história da música e política no Brasil, agitação e propaganda, oficinas de percussão e canto popular, além da vivência e do trabalho prático na confecção de fantasias e alegorias da escola. Fotos: Juliana Barbosa e Leonardo Henrique

Unidos Da Lona Preta: onde o samba faz a luta e a luta faz o samba!

A origem da Unidos da Lona Preta vem de São Paulo, no contexto das comunas urbanas na região metropolitana da capital paulista, experiência que tem sua origem em meados de 2005, participando das lutas do movimento e tendo composto uma série de sambas enredo com as temáticas da reforma agrária e das lutas populares. 

“No Paraná havia um forte interesse, especialmente da juventude, nas oficinas de percussão e batucadas durante as lutas. Assim, buscamos nos aproximar mais e beber diretamente da fonte das escolas de samba e da Unidos da Lona Preta de São Paulo, por acreditar que esse trabalho aqui no Paraná poderia ir muito mais além, inspirados e referenciados nesse legado cultural e popular que as escolas de samba do Brasil acumularam de norte a sul do Brasil. A Unidos para nós agrega essas duas dimensões , da luta pela reforma agrária e da referência cultural das escolas de samba”, conta Igor de Nadai, membro da Unidos da Lona Preta do Paraná e da coordenação do MST.

A Unidos da Lona Preta se somou a bateria “Bafo dos Leões”, da escola Leões da Mocidade. Foto: Leonardo Henrique e Juliana Barbosa

O trabalho com a Unidos é permanente durante todo o ano, acompanhando as diversas lutas do MST e realizando oficinas de percussão nas escolas, cursos e acampamentos do Movimento. Em 2021, comemorando o centenário do educador Paulo Freire, a Unidos compôs e gravou seu primeiro samba enredo, intitulado “A Unidos conta e canta Paulo Freire” (confira o clipe abaixo).

Para a educanda Andressa Caroline Carvalho, integrante Unidos e acampada na comunidade Manoel Jacinto Correia, em Florestópolis (PR), é importante participar mais uma vez do carnaval, pois reafirma o que já tinha vivenciado em 2020 e fortalece a relação urbana: “É gratificante ver a representatividade do movimento, na arquibancada a bandeira do MST erguida e mostrando que nós estávamos ali representando o movimento”. 

A educanda, que é parte do coletivo da juventude, conclui falando sobre seu instrumento de percussão: “Aprendi a tocar vários instrumentos, na avenida desfilei com o ganzá [chocalho], sou muito ligada a ele sinto que ele transmite o que estou sentindo a energia e a força que tenho vem dele”. 

“Penso, logo resisto! Cultura e cidadania nos chãos da periferia!”

Foi com este enredo que a Escola de Samba Leões da Mocidade trouxe sua mensagem para a avenida no dia 19 de fevereiro. O enredo, elaborado e assinado pelo presidente da escola Wilson Paulino e Paulo Bearzoti Filho, traz uma importante reflexão da luta pelo acesso aos bens culturais na capital paranaense. 

De acordo com Bearzoti, que é autor do enredo e da diretoria da Escola, “o ponto de partida foi debater a desigualdade no acesso aos recursos e instrumentos de cultura, portanto, defender a descentralização e democratização desse acesso. Relacionamos ainda essa desigualdade ao próprio mito de Curitiba como “cidade-modelo” , “cidade-europeia” , e onde não existe carnaval. O tema faz referência ao conhecido aforisma de René Descartes [“penso, logo existo”], porém trazemos um Descartes carnavalizado, a consciência popular e democrática, base da luta e resistência em favor de maior igualdade social e cultural”. 

A Leões da Mocidade, acompanhado de diversas agremiações carnavalescas em todo o Brasil, traz desde sua origem narrativas complexas e muito importantes da população negra e periférica brasileira, não somente das condições sociais e políticas, mas também na defesa da alegria e da possibilidade de sonhar.

“Estamos na Marechal em Curitiba, neste grande carnaval popular, de alegria e de festa, após 4 anos de muita resistência, de muita luta e de impor uma derrota a um governo fascista. Aqui na avenida, é alegria e esperança da vida, do sonho da reconstrução do Brasil. É com este vigor que vamos erguer esse Brasil do povo brasileiro, com muita festa, muito amor, carinho e bastante afeto, para isso contagiar o conjunto da sociedade brasileira e a gente reconstruir o Brasil mais popular, solidário e humano”, comenta Roberto Baggio, da coordenação nacional do MST, que acompanhou e vibrou com o desfile diretamente das arquibancadas.

A maior parte da juventude do MST fez parte da bateria da escola Leões da Mocidade. Fotos: Ana Keil

*Editado por Fernanda Alcântara