Educação no Campo
“Hoje a gente materializa um sonho coletivo numa comunidade de reforma agrária que valoriza a educação”
Por Jaine Amorin e Jade Azevedo MST no Paraná
Nesta sexta-feira (03), foi realizado o ato de inauguração da Escola Municipal do Campo no Assentamento 8 de Junho, em Laranjeiras do Sul no Paraná. O ato foi organizado pela comunidade juntamente com a prefeitura de Laranjeiras do Sul e contou com a presença do prefeito Berto Silva, o deputado federal Zeca Dirceu, deputado estadual Professor Lemos, dirigente do MST, Roberto Baggio, representações de escolas, assentamentos e acampamentos da região e as famílias assentadas.
A programação iniciou com mística apresentada pelas crianças e pais, em seguida o ato oficial de entrega da estrutura para a comunidade e logo em seguida foi servido um almoço comunitário preparado pelas famílias assentadas para aproximadamente 300 pessoas.
“Hoje a gente materializa um sonho coletivo numa comunidade de Reforma Agrária que valoriza a educação” afirmou, Thaile Lopes, moradora da comunidade e dirigente do MST na região. Lopes destaca a inauguração da escola como a concretização de um direito humano e fundamental que é o direito à educação que historicamente foi negado aos povos dos campos.
“A educação do campo afirma a importância dos camponeses, dos agricultores para o desenvolvimento territorial e da nossa nação. Ela vem como política pública de construção de conhecimento científico histórico da humanidade e hoje a gente materializa um sonho coletivo numa comunidade de reforma agrária que valoriza a educação”, ressalta.
A Escola Municipal do Campo Profª Silvia Veigant da Silva atenderá as crianças da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental do Assentamento 8 de Junho e de comunidades rurais próximas. Podendo atender até 240 crianças, o espaço da escola foi construído no modelo padrão do Fundo Nacional Desenvolvimento da Educação (FNDE). E conta com salas de aulas, biblioteca, parquinho, refeitório/auditório, cozinha e demais espaços administrativos além de poder contar com as estruturas de quadra esportiva e campo de futebol da comunidade. As crianças terão acesso a uma educação de qualidade e em diálogo com a realidade.
Segundo o prefeito Berto Silva, que esteve presente no ato e garantiu que a escola receberá o mesmo tratamento das escolas municipais e irá garantir a todos os alunos e alunas uniformes escolares completos, alimentação saudável, equipamentos, e, segundo ele num futuro breve, notebooks e educação digital. “É uma alegria pra mim e será para as crianças e todos os professores quando chegarem aqui pela manhã serem saudados pelo Paulo Freire, esse ícone da educação brasileira”, afirma ele em referência ao desenho do pedagogo no muro da escola.
Durante a fala, o prefeito se comprometeu em transformar esta escola na primeira escola do campo com ensino integral. “Eu gostei do desafio de transformar esta escola na primeira escola de educação integral no campo no Paraná. Vamos atrás desse desafio!” afirmou Berto Silva.
O início das aulas e inauguração é apenas um passo, a educação é uma construção diária que exige lutas permanentes, para não regredir na qualidade, seja no que diz respeito aos conteúdos estudados, seja em garantias estruturais da escola, transporte e estradas, dentre outros.
As escolas do e no campo se inserem num contexto mais amplo do que o modelo de educação tradicional e o estudo de livros, buscam convergir com a realidade/entorno onde estão inseridas. Possibilitando para as crianças e jovens conhecimentos que os façam pensar, refletir e agir para transformar a realidade em que vivem e lutar pela construção de uma sociedade mais justa.
“Queremos uma educação de excelência e aí dialogamos com o Paulo Freire que representa uma simbologia muito importante para nós de um projeto de educação e de escola que a gente defende, como base teórica do Movimento”, afirma Thaile.
Jones Fernado, dirigente do Setor de Educação do MST no PR, defende a importância das escolas no campo com um projeto pedagógico que valorize a cultura camponesa, uma vez que a escola estando situada numa comunidade camponesa, em área de reforma agrária e atendendo crianças de famílias camponesas, deve buscar, além do estudo padrão das escolas do município de Laranjeiras do Sul, estar sintonizada com a realidade da comunidade.
Para ele, a inauguração da escola foi uma vitória da classe trabalhadora. “Principalmente numa área que é do MST que sempre se preocupou com a educação, com o acesso à educação, mesmo com as ofensivas que o movimento veio sofrendo, conseguir formar lutadores e lutadoras, construtores e construtoras, se fez presente”, ressalta.
Como já afirmou o patrono da educação brasileira, Paulo Freire, homenageado em arte na parede da escola, “Se a Educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”.
“A conquista e a inauguração da Escola Municipal do Campo no Assentamento 8 de Junho, simboliza o início de um novo ciclo na luta política pela educação nos territórios de reforma agrária. Inaugura um ciclo de retomada da política pública voltada para a educação dos povos do campo, das águas e das florestas e da luta pela democratização do conhecimento enquanto instrumento do desenvolvimento social, cultural, tecnológico e científico no campo”, afirma Valter Leite, da coordenação nacional do Setor de Educação do MST.
A educação é fundamental para o MST e a construção da Reforma Agrária Popular, uma nova sociedade só pode ser construída com educação de qualidade. Desde o ensino infantil até o ensino superior, a educação deve proporcionar aos estudantes a capacidade de enxergar o mundo de forma crítica e ter a ousadia de lutar para transformá-lo. Deve convergir com a história e cultura do povo que a constrói.
Histórico do assentamento
O Assentamento 08 de Junho tem origem no processo de luta que começou em 1997, com o acampamento às margens da BR 158, onde as famílias permaneceram até o ano de 2000, quando houve a conquista da área para a reforma agrária. Ainda no acampamento viu-se a sensibilidade de cooperação entre as famílias, mecanismo que ao ser estimulado a partir da organização do Coletivo de Mulheres, levou a criação de grupos de produção e da Associação Comunitária (2001). Em 2005, as famílias estruturaram uma cozinha comunitária, que se expandiu para panifício e em 2009 criaram a Cooperativa Agroindustrial (Coperjunho), para acessar programas institucionais de aquisição de alimentos e merenda escolar – PNAE e PAA, além do fornecimento de serviços de alimentação em eventos.
Desde 2009 também se organiza o Grupo de Agroecologia, que atualmente possui 6 famílias, certificadas pela Rede Ecovida de Agroecologia, que produzem alimentos saudáveis e plantas medicinais, livres de transgênicos e sem agrotóxicos.
Originalmente, foram assentadas 74 famílias, oriundas da região de Laranjeiras do Sul, do Sudoeste do PR e um grupo de famílias de Santa Catarina. No entanto, atualmente o assentamento tem 71 lotes de reforma agrária, tendo em vista que 3 famílias foram realocadas para Assentamento Celso Furtado em Quedas do Iguaçu, porque a comunidade, com a autorização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), fez a doação de uma parte do terreno, uma área correspondente a 3 lotes, para a construção do campus da Universidade Federal da Fronteira Sul. Isso demonstra a preocupação e a importância que esta comunidade atribui à Educação.