Trabalho Escravo

Auditoria aponta Basf como empregadora dos trabalhadores resgatados em Uruguaiana

A multinacional recrutava trabalhadores para multiplicar sementes gerenciadas pela empresa e controlava o volume de trabalho e a qualidade do serviço dos resgatados e vai pagar rescisão
A Basf terá de depositar R$ 365,5 mil para pagamento de verbas rescisórias para os agricultores resgatados, no último dia 10, no RS. Foto: Polícia Federal

Por CUT-RS

Investigação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) apontou a multinacional de sementes Basf e proprietários de duas fazendas de arroz como responsáveis pela situação dos 85 trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão em Uruguaiana, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul.

A multinacional recrutava trabalhadores para multiplicar sementes gerenciadas pela empresa e controlava seu volume de trabalho e a qualidade do serviço e por isso deve pagar as verbas rescisórias devida aos resgatados.

A Basf terá de depositar R$ 365,5 mil para pagamento de verbas rescisórias para os agricultores resgatados, no último dia 10, de duas propriedades rurais: a estância Santa Adelaide (onde atuavam 54 pessoas, sendo 10 adolescentes) e a estância São Joaquim (com 31 pessoas, sendo um adolescente).

Basf recrutava trabalhadores

A Basf não apenas comprava a safra, mas também supervisionava (através de engenheiros agrônomos contratados por ela) a arregimentação de mão de obra, o acompanhamento das etapas de trabalho e a autorização de pagamento após a realização dos serviços, pontua o chefe do setor de Inspeção do Trabalho do MTE em Uruguaiana, auditor Vitor Siqueira Ferreira.

“Era uma parceria, já que englobava a gestão conjunta de todas as fases de produção, desde o preparo de solo, o plantio, a irrigação, a aplicação de agrotóxicos, a adubação, o roguing (eliminação de plantas daninhas) e a colheita”, disse Ferreira.

O auditor do MTE ressalta que o pagamento das verbas rescisórias é uma primeira etapa do processo, mas que pode não ser a única verba a ser recebida pelos trabalhadores resgatados.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) poderá exigir, via judicial, indenização por danos morais coletivos ou mesmo individuais para os agricultores que foram lesados em seus direitos trabalhistas. Não só da empresa, mas também dos donos das fazendas.

Caso semelhante aconteceu neste mês de março na Serra Gaúcha, onde as vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi firmaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no qual concordaram em pagar R$ 7 milhões para evitar um processo judicial após o resgate de 207 trabalhadores em situação de trabalho análogo ao de escravo em Bento Gonçalves.

Condições degradantes

De acordo com os auditores-fiscais do trabalho, as condições eram degradantes, os agricultores atuavam 14 horas por dia sob temperaturas próximas aos 40ºC, sem teto, água fresca, sombra e banheiro.

A comida azedava em decorrência do forte calor. Eles também faziam a aplicação de agrotóxicos na lavoura, sem contar com equipamentos de proteção individual.

Conforme os fiscais do ministério, a remoção das plantas daninhas era feita de duas formas: por corte manual (com faquinhas de cozinha, que eles mesmos precisavam providenciar) ou por veneno, aspergido por meio de uma barra química carregada nos ombros pelos próprios trabalhadores, sem qualquer proteção.

“Há de se relatar, ainda, que algumas das vítimas estavam alojadas em local distante cerca de 10 km da granja São Joaquim. O alojamento, na verdade um galpão sem janelas e com seus colchões perfilados lado a lado, não apresentava condições mínimas de higiene e conforto aos trabalhadores, sendo interditado de pronto pelos Auditores-Fiscais do Trabalho”, relata o documento chamado Inspeção do Trabalho, concluído neste sábado (18).

Audiência pública nesta segunda

Sob o tema “Trabalho decente, sim! Trabalho escravo, não”, a Comissão de Economia, da Assembleia Legislativa, promove nesta segunda-feira (20), às 18h30, no Teatro Dante Barone, no centro de Porto Alegre, uma audiência pública, com a presença do ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho.

A iniciativa é do deputado estadual Miguel Rossetto (PT), que já convidou a CUT-RS e centrais sindicais, autoridades, parlamentares e empresários, dentre outros.

Segundo a assessoria do ministro, Luiz Marinho terá uma agenda de dois dias no Estado e o motivo da vinda é debater medidas e ações eficazes que impeçam novos casos de trabalho análogo à escravidão.

Em todo o RS já são 294 trabalhadores resgatados somente em 2023, número que está perto do dobro dos 156 resgatados no ano passado, que já havia representado um triste, absurdo e lamentável recorde.

Editado por: Marize Muniz