Criminalização

CPI alavanca desinformação e discurso de criminalização contra MST nas redes

Levantamento feito pela Lupa mostra que houve um aumento em publicações no Facebook sobre o MST com o início da CPI, sendo muito conteúdo desinformativo
Foto: José Cruz/Agência Brasil

Por Catiane Pereira/Rio de Janeiro – RJ
Da Lupa

A abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na Câmara dos Deputados inflamou discussões nas redes sociais a favor e contra o movimento. Um levantamento feito pela Lupa a partir da ferramenta CrowdTangle mostra que houve um aumento no número de publicações no Facebook sobre o MST com o início dos trabalhos da CPI  — muitas delas com conteúdo desinformativo. 

Entre os boatos estavam o de que um veículo apreendido com munições no Maranhão teria relação com o MST e o de que animais estariam sendo roubados de propriedades rurais por integrantes do movimento. A acusação de que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), teria tentado boicotar a CPI do MST ao solicitar uma investigação acerca de seu presidente, o deputado Tenente-Coronel Zucco (Republicanos-RS), também teve alcance relevante em canais de extrema-direita. 

Os dados mostram também que a comissão mobilizou uma disputa de narrativas no Facebook entre representantes do PT e do PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro. Do lado do governo, os discursos ressaltaram a legitimidade do movimento, enquanto opositores tentaram criminalizá-lo. 

Duelo de narrativas

Na semana em que a CPI foi instalada na Câmara, houve um total de 5,1 mil publicações com conteúdos referentes ao MST — um aumento de 30,7% em relação à semana anterior. 

Houve também um crescimento das interações. Após a instalação da CPI na Câmara, no período entre os dias 17 e 30 de maio foram 2,2 milhões de interações com conteúdos referentes à CPI e ao MST na rede social — nas duas semanas anteriores, entre os dias 3 e 16 de maio, esse índice foi de 924 mil interações.

A partir do dia de instalação da CPI até o dia 1º junho, os parlamentares que dominaram o debate foram os deputados Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), Capitão Alden (PL-BA), Carol de Toni (PL-SC) e Gleisi Hoffmann (PT-PR). Suas publicações são apontadas no Crowdtangle como as que tiveram mais interações entre os perfis que citaram a CPI no Facebook.

Opositores ao governo apostaram na narrativa de que o MST é uma associação criminosa ligada à gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para isso, compartilharam discursos de ex-integrantes do MSTdenunciaram a existência de um suposto “centro de doutrinação ideológica” e criticaram outros integrantes da CPI que são associados ao movimento social

Em contrapartida, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que o MST estaria sendo atacado pela oposição como modo de proteger supostas atividades ilícitas que atribuiu ao agronegócio. Para isso, questionou a indicação de Ricardo Salles (PL-SP), alvo de investigações criminais relacionados à sua gestão no Ministério do Meio Ambiente, como relator da comissão. Ela também se colocou como defensora do MST ao defender a trajetória de luta do movimento.  

Houve ainda parlamentares, como a deputada estadual do Rio Grande do Sul Luciana Genro (PSOL-RS) e a vereadora de Campinas (SP) Mariana Conti (PSOL-SP), que publicaram posts que somam mais de 370 mil visualizações. Elas repercutiram os episódios em que a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) teve seu microfone cortado pelo presidente e pelo relator da comissão. A deputada foi interrompida em, ao menos, três ocasiões na CPI.

CPI do MST domina debate nas redes

Um outro levantamento, produzido pela Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV, em parceria com a Lupa, mostra que a CPI do MST gerou um volume maior de publicações de parlamentares em comparação com outras comissões, como a dos atos golpistas de 8 de janeiro. No período de 13 a 23 de maio, houve um total de 147 posts publicados por parlamentares na rede, com destaque para a base do PL, com 39 publicações, seguido pelo PT, com 32.

Segundo o estudo da FGV, em um primeiro momento, parlamentares da base do governo dominaram o debate nas redes. Entretanto, com a apresentação do plano de trabalho da CPI do MST, a oposição conseguiu equilibrar o jogo, que enfocou na afirmação de Salles de que ele acionaria o Comitê de Ética por ter sido chamado de “bandido” pela deputada Talíria Petrone (PSOL-RJ).

O levantamento também aponta o número de discussões sobre a CPI do MST em outras redes sociais. No Twitter, a CPMI do 8 de Janeiro e a CPI do MST motivaram as discussões mais volumosas em relação às comissões parlamentares em andamento. Já no Telegram, o principal debate girou em torno de supostos crimes atribuídos ao MST, como o de um veículo apreendido com munições no Maranhão que seria de integrantes do movimento. Essa informação, no entanto, foi desmentida pela Lupa

Também circulou a informação, também falsa, de que o MST foi responsável pela morte de 17 bois em uma fazenda em Santa Catarina. Na madrugada do dia 18 de abril, criminosos tentaram roubar o gado em uma fazenda localizada no município de Conde (BA). A Polícia Civil do estado informou, em nota enviada por e-mail à Lupa, que dois suspeitos foram localizados e que não há indícios do envolvimento de integrantes do MST na ação. 

Nota: Este conteúdo faz parte do projeto Mídia e Democracia, produzido pela Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas (FGV ECMI) em parceria com a Lupa. A iniciativa é financiada pela União Europeia.

Editado por Bruno Nomura e Ítalo Rômany