Saúde
Saúde é um trabalho de cuidado do indivíduo, comunidade e luta contra todas as opressões
Por Jade Azevedo | Coletivo de comunicação MST-PR
Da Página do MST
Desde a ocupação, o Movimento se preocupa e pensa na saúde de quem está com ele na trincheira. Nos acampamentos, assentamentos, Encontros, Seminários, marchas, conversas e qualquer outra atividade, sempre terá na sua organização o Setor de Saúde. Companheiras e companheiros que cuidam do bem estar social, não só do doente ou de alguma doença em si, mas de todos os aspectos envolvidos no viver.
A partir de uma reflexão que parte do todo, da luta social, do coletivo, mas também de cada espaço, o Setor, a partir da sua organicidade, brigada e regiões, debate as melhores maneiras de se reinventar para atender as demandas, de forma orgânica, de cada acampamento e assentamento, sem perder a atenção na missão de continuar lutando contra o modelo hegemônico do capital, que se entende saúde como negócio.
Um modelo de saúde que a cada dia vem enfraquecendo o Sistema Único de Saúde (SUS), a previdência social, e os direitos à saúde pública, para atender o mercado das indústrias farmacêuticas, dos planos de saúde, do bem estar psicossocial e até do agronegócio através dos agrotóxicos.
Rubens Bernardo, dirigente do Setor de Saúde no Paraná, explica que no âmbito da Saúde Popular, busca-se primeiramente entender quais os prejuízos que o sistema capitalista mercantilista traz à humanidade, e somente a partir desta reflexão constrói-se a saúde, as práticas e os cuidados. “É pensando e tratando o ser humano de forma integral em sua totalidade que reafirmamos que o estado de saúde do indivíduo está determinado também pelo meio em que vive. Neste sentido, buscamos fortalecer a saúde como um direito e não como mercadoria, fortalecendo novas formas de relações no âmbito sociocultural, que seja emancipadora, libertadora, e que traga no seio da saúde o respeito às diversidades”, ressalta.
Ele acrescenta ainda que este trabalho é feito também em alianças com outros profissionais, organizadores e lutadores que fazem e defendem a saúde pública. “É elevando o entendimento dos profissionais da área da saúde, fortalecendo as políticas públicas e exigindo que se garanta o que já está estabelecido por leis, que independente de raça, crença, etnia, gênero, religião ou identidade de gênero, todos têm o direito ao acesso a saúde de qualidade e com equidade, de forma gratuita. Seguimos alerta e atentos, fortalecendo a luta, defendendo o Sistema Único de Saúde, ampliando o acesso às Políticas Públicas de saúde, pois nos tempos de hoje, não basta lutar somente para que tenhamos Saúde Popular, é necessário que as trabalhadoras e trabalhadores tenham condições para viver com qualidade, com renda, alimentação de qualidade, saneamento básico, condições de moradia entre outros direitos do povo e dever do estado”, enfatiza.
Neste mesmo caminho, vem a agroecologia que entende a produção de alimentos de uma maneira socialmente justa, economicamente viável e ecologicamente sustentável. Para Ana Primavesi, importante pesquisadora brasileira em agroecologia, “A ecologia se refere ao sistema natural de cada local, envolvendo o solo, o clima, os seres vivos, bem como as inter-relações entre esses três componentes. Trabalhar ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando a teia da vida. Respeitando as características locais do ambiente, alterando-as o mínimo possível, se aproveita o potencial natural dos solos”.
Dentro do MST, a agroecologia, defendida por Ana Primavesi, é uma opção para a produção de alimentos. Uma escolha que muitos camponeses fazem, mesmo com dificuldade, para produzir comida de verdade, em contraponto ao agronegócio, que agride o meio ambiente, produz monocultura e commodities, envenena a terra e trabalhadores/as no campo e na cidade, provoca doenças físicas e psíquicas, além de potencializar as desigualdades sociais e a fome no Brasil.
Rubens enfatiza que quando se trata de pensar a saúde no MST, é levado sempre em consideração o ser humano na forma integral de relacionar-se com o meio em que vive, com a matriz de produção e as relações. “Enquanto Movimento, seguimos construindo a agroecologia e a produção de alimentos saudáveis, cultivando a vida, combatendo o uso de agrotóxicos e a monocultura para acúmulo de commodities do capital explorador. Praticar e defender a agroecologia é defender a vida, cultivando diversidade, entendendo que fazemos parte do meio ambiente e não ao contrário. Sem uma alimentação de qualidade, é impossível pensar em saúde de forma integral, por este motivo a agroecologia e saúde caminham juntas, não é possível existir saúde onde se envenena a terra, as águas, os alimentos”, explica.
Serla Morais, da Direção Estadual do MST no estado, defende que para se ter uma boa saúde, é preciso ter um ambiente de qualidade.
É fundamental que a agroecologia aconteça em nossos espaços para eliminar o agrotóxico que gera violências e destruições, contaminando nossas águas, alimentos e gerando doenças. Por isso o setor está sempre buscando cursos, formação, capacitação para o coletivo de agentes multiplicadores de saúde popular”
Florescer a agroecologia, produzir vida e construir saúde popular
A saúde no Brasil foi e continua sendo um campo de disputa. No capitalismo, a busca é sempre por lucro. As mudanças no sistema de saúde, na sua prática cada dia mais distante das plantas medicinais, dos saberes populares, dos chás, das rezas e, inclusive na formação, vêm para incentivar a reprodução dos conceitos e práxis hegemônica que está voltada somente para as doenças.
Rubens enfatiza que, “enquanto Setor de Saúde, buscamos sempre fazer a reflexão do período histórico em que vivemos, tendo como referência e ponto de partida a necessidade dos camponeses. Partindo destes elementos, entendendo que passamos por um período difícil, de pandemia, de negação da ciência, buscamos construir coletivamente estratégias para o avanço da Saúde Popular”, conta.
Dentro das estratégias, estão os cursos de formação para elevar o conhecimento dos agentes populares de saúde do Movimento, “as capacitações, formações, intercâmbios de experiências, principalmente com o intuito de fazer um resgate histórico cultural da saúde alternativa, trabalhando e aprofundando saberes nas práticas integrativas, não é possível sem pensar estratégias de saúde que não tenham com ponto de partida inicial a elevação dos níveis de consciência e saberes sobre a saúde”, ressalta Rubens.
No último Encontro Estadual do Setor de Saúde do MST no Paraná, que aconteceu em maio deste ano, Izabel Grein, da Direção Estadual do MST no estado, ressaltou que a luta na saúde é muito ampla. “Não é só na doença, é também na construção de uma sociedade menos opressora”.
Segundo ela, o cuidado é com o corpo físico, a mente, a sociedade, do viver e do se relacionar consigo mesmo, com o outro, no coletivo e com a natureza. “Ele deve ser feito para produzir alimento e a vida. Para quem está no campo, a mudança no jeito de produzir na terra é fundamental. Em um assentamento, acampamento, a agroecologia é libertadora para a mulher e a família. A agroecologia trabalha as mudanças na relação com a terra tratando ela como ser vivo”.
*Editado por João Vitor