Luta pela Terra
MST no RS monta acampamento em Hulha Negra movido pelo sonho por um pedaço de terra
Da Página do MST
Desde a última quinta-feira (19), a luta pela reforma agrária ganha força com a instalação de um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na cidade de Hulha Negra. As lonas pretas à beira da BR-293 voltaram a fazer parte da paisagem da Região da Campanha, berço de 58 assentamentos. A área foi cedida por um assentado.
O acampamento começou com 100 famílias. Mesmo com a chuva na região, durante a semana foram chegando novos integrantes. Principalmente, jovens, filhos de pequenos agricultores. Segundo o dirigente estadual do MST Ildo Pereira até o final de semana são esperadas cerca de 500 famílias.
“Está bonito o acampamento. Temos muitas pessoas da região, mas também de Pedras Altas, Herval, regiões Central e Norte e até de Porto Alegre. O nosso objetivo é terra. Estamos na região há mais de 30 anos e percebemos que muita gente quer um pedaço de terra para plantar e viver com dignidade”, salientou.
Integrante da direção nacional do MST, Maurício Roman afirma que o movimento é independente de partidos e preza por sua autonomia. “Desde o nascimento do movimento há 40 anos, os acampamentos em beira de estradas são instrumentos de luta por terra, moradia e vida digna. Esse sempre vai ser nosso método e vai continuar a acontecer em todo o Brasil.”
Solidariedade da comunidade local
A escolha de Hulha Negra como local para o acampamento não é casual. A região Sul do Brasil ainda possui uma grande concentração de terras nas mãos de poucos proprietários.
Mas enquanto alguns veem o movimento como uma ameaça à propriedade privada, outros o apoiam como uma maneira de combater a desigualdade no acesso à terra e promover o desenvolvimento da agricultura familiar. Os acampados estão recebendo solidariedade dos assentamentos da região.
Cidades nascem a partir dos assentamentos
Este ano, essa região completa 34 anos da conquista de assentamentos. Em 1989, quando os Sem Terras se deslocaram para lá, existia somente a cidade de Bagé. Depois da implementação de mais assentamentos, foram criados outros três municípios: Hulha Negra (1992), Candiota (1992) e Aceguá (1996).
A partir da luta pela terra, na época foram criados seis assentamentos. Os que atualmente estão localizados em Hulha Negra são os Assentamentos Nova União, Missões Alto Uruguai, Santa Elmira e Conquista da Fronteira. Já os situados em Candiota são os Assentamentos Santa Lúcia e Nossa Senhora Aparecida. Hoje nesses dois municípios, juntamente com Aceguá e Pedras Altas, há 2250 famílias assentadas em 58 áreas de Reforma Agrária.
A região da Campanha, depois de mais de 30 anos de lutas, acumulou diversas conquistas. As cooperativas e as associações do Movimento somam-se em várias áreas da produção, como a Cooperativa Agroecológica Nacional Terra e Vida (Coonaterra), a primeira do Brasil a produzir, beneficiar, embalar e comercializar sementes de hortaliças agroecológicas, além de ter uma diversificada produção de grãos, forrageiras e adubação verde.
Para Ildo Pereira, os assentamentos da Reforma Agrária Popular para a região da Campanha foram fundamentais para o desenvolvimento da população e dos municípios daquele local. “Nós somos parte concreta e direta da emancipação de Hulha Negra e Candiota. No nosso assentamento nos orgulhamos de dizer que desde a nossa existência não teve nenhum caso de criança que morreu por má alimentação”, salienta.
Outro fato de orgulho para os assentados da região é a sua contribuição para a sociedade através de lutas do MST. “É difícil você pegar um município e não notar o crescimento das lojas e mercados com a chegada dos assentamentos na região. Os pequenos agricultores contribuíram para as comunidades, principalmente de Hulha Negra e Candiota, com a manutenção das estradas, acesso à energia e água potável”, relata Pereira.
O MST estima que atualmente estejam assentadas no RS mais de 10 mil famílias. Na macro-região do Pampa, são cerca de 5 mil famílias assentadas. Já nos 58 assentamentos localizados entre os municípios de Hulha Negra, Candiota e Aceguá são cerca de 2 mil famílias, perfazendo em torno de 7 mil pessoas.
Três décadas depois da chegada dos primeiros sem-terra, o cenário é bem diferente do encontrado naquele tempo. O gigantesco latifúndio improdutivo foi entremeado de pequenas unidades produtivas de matriz camponesa. A agroecologia aos poucos foi se transformando em alternativa ao pacote nocivo do agronegócio. E as pessoas, pouco a pouco, foram dominando o jeito do solo, aprendendo a resistir às nuances do clima, encontrando os caminhos da água e desenvolvendo métodos de aproveitar e proteger, fazendo da hulha escura e aparentemente hostil uma terra fértil onde se plantariam sonhos e esperanças.
*Editado por Fernanda Alcântara