Internacionalismo

Na Zâmbia, epidemia de cólera evidência Estado omisso e ações populares em saúde

Solidariedade internacionalista chega em um dos momentos mais cruciais e críticos da saúde pública no país
Foto: Brigada Samora Machel

Por Brigada Samora Machel
Da Página do MST

Enquanto na Zâmbia o Estado tem demonstrado ineficiência em lidar com a epidemia de cólera, uma doença que pode ser controlada simplesmente garantindo o acesso à água limpa e ao saneamento adequado, por outro lado, ações populares e a mobilização popular para que os zambianos se organizem em torno das ações preventivas contra a cólera são realizadas pelo Partido Socialista da Zâmbia, atual oposição do governo em exercício.

Segundo o Presidente do Partido Socialista, Fred M’membe, esse momento que o país está vivendo é uma crise séria epidemia de cólera, considerando que apenas acabamos de sair de uma pandemia de Covid e sequer houve tempo de recuperar-se totalmente das perdas.

“As pessoas estão morrendo, as famílias perdendo seus entes queridos. Estamos completando 60 anos da nossa independência e ainda temos mortes por doenças como essas, que já sabemos como enfrentar e combater. Isso é um reflexo do tipo de líder político que temos em nosso país. Portanto, precisamos da participação de todo povo zambiano para combater essa crise, não podemos nos sentar diante disso. Por isso começamos essa iniciativa popular para incentivar o povo a contribuir na busca de resoluções coletivas para os nossos problemas”, salientou.

Iniciativa popular define a ação realizada durante essa semana entre a Brigada Samora Machel juntamente com o Partido, buscando ressaltar a importância de atendimento básico e cuidados preventivos para o povo zambiano com uma Clínica Popular.

Com o lema: “Popular health, we can do it!” (Saúde Popular, nós podemos fazer isso!), em dois dias de experiência, a Clínica montada em frente ao escritório do Partido, realizou 310 atendimentos de zambianos e zambianas da comunidade local, prestando o serviço básico de checagem de pressão arterial, diabetes, orientando sobre a prevenção contra a cólera e distribuindo chlorine para tratamento da água.

Para Elizabeth Cerqueira, da coordenação da Brigada Samora Machel, a Clínica Popular junto com o Partido, chega em um dos momentos mais cruciais e críticos da saúde pública no país.

“Desde outubro de 2023, tivemos mais de 14 mil casos de cólera em todo o país, nas áreas rurais, mas principalmente na capital. Em períodos de chuvas esses índices se multiplicam e as consequências são um surto de cólera. Essa iniciativa vem como uma forma de contribuir com o combate à epidemia de cólera, mas também promover a conscientização sobre a importância da prevenção contra essas enfermidades”, afirmou.

Foto: Brigada Samora Machel

A equipe de saúde doou cloro aos membros da comunidade que compareceram para verificar a pressão arterial e o nível de açúcar no sangue como um esforço suplementar na luta contra a cólera. Além disso, também instruiu as pessoas sobre a importância da higiene básica para prevenir a doença e também oferece orientação sobre hipertensão e diabetes.

Desde outubro de 2023, a Zâmbia enfrenta um aumento do surto de cólera, vivendo a pior epidemia desta doença desde 2011. De acordo com o Ministério da Saúde, já são mais de 500 mortes registradas desde então no país. São diversas as situações atuais que possibilitam que um surto como esse aconteça e todas elas estão longe de serem simples. Normalmente, ocorrem em contextos de conflito armado, onde as pessoas deslocadas vivem em ambientes superlotados. Em outros casos, a cólera surge após eventos climáticos extremos, como tempestades e inundações, exacerbados pela mudança climática.

Este último é o caso da Zâmbia, onde a cólera tem ceifado muitas vidas e a intensidade da epidemia está ligada a chuvas fortes e inundações, resultando no fechamento de escolas nacionais até o início de fevereiro de 2024 e na conversão de instalações esportivas em centros de tratamento.

Foto: Brigada Samora Machel

Com uma taxa de fatalidade de aproximadamente 4% – em comparação com o padrão <1% – o surto na Zâmbia é um motivo significativo de preocupação. As autoridades de saúde pública receberam 1,4 milhão de doses de vacina por meio dos mecanismos da OMS, mas somente essas doses não serão suficientes para impedir a disseminação da doença.

A ausência de infraestrutura em saneamento básico adequado, acesso à água potável, moradia em locais adequados são os principais fatores para que anualmente a Zâmbia lide com surto de cólera no período das chuvas. A principal questão é que nessa luta, o país lida com os sintomas e não com a causa. A cólera é um problema social que se manifesta como uma emergência médica que gera medo e ansiedade. A naturalização das desigualdades e a ausência de uma educação adequada que formem sujeitos críticos em uma sociedade tem impactos concretos. O país tem construído uma futura geração com a informação de que viver em um lugar sem saneamento básico e água potável é natural.

Porém, a Zâmbia é o segundo maior produtor de cobre do continente africano. O cobre representa cerca de 13% do PIB da Zâmbia e 70% de suas exportações, sendo, portanto, uma importante fonte de divisas. É um país que tem bons recursos disponíveis para lidar com esse cenário, principalmente se compararmos com outros países da região, incluindo paz, estabilidade e previsibilidade. No entanto, por uma questão de fragilidade de governabilidade não se consegue fornecer o mínimo de água potável e saneamento para a população.

*Editado por Fernanda Alcântara