Agroecologia e Educação
Artigo | Escola Agroflorestal do MST
Por Márcio Metzker
Da Página do MST
Enquanto crescem os atos de truculência dos milicianos do Invasão Zero aos índios pataxós e aos sem-terra aqui neste Sul da Bahia, crescem também os exemplos de formação humana no respeito à natureza dados pelo MST. Recebi do amigo João Pedro Stédile a sugestão de visitar um deles. Em companhia da minha esposa, a socióloga Franzlália Metzker, e da veterana médica Jean Albuquerque, fui conhecer a Escola Popular Egidio Brunetto, às margens da BR-101.
Para quem viu os acampamentos de plástico preto e cabanas improvisadas do início das ocupações do MST, a escola surpreende: dois prédios amplos e modernos com salas de aula e refeitório e três casas para hospedar os professores. A coordenadora Dionara Soares Ribeiro esclarece que já são 23 as fazendas ocupadas por milhares de famílias de sem-terra no Sul da Bahia, num testemunho eloquente da expulsão e do desemprego provocados pela monocultura do eucalipto.
A própria área onde está a escola era a famosa fazenda Colatina, onde se realizavam leilões de gado, e foi ocupada logo que concretizada a venda, há 12 anos, para uma indústria de celulose. Estava destinada a se tornar um eucaliptal contínuo. Graças à atuação do MST, hoje vai se tornando um exemplo de diversidade agrícola e ecologia humana, com múltiplos cultivos, experiências de plantios consorciados de frutíferas e pesquisa de espécies mais adequadas para aquela região degradada pelas pastagens. E também de árvores nativas capazes de recompor trechos devastados pelo pisoteio do gado e abrigar a fauna original.
Quem cuida disso é o Rafael Rangel, um cientista num vigoroso corpo de trabalhador rural. Ele é doutor em Ciência do Solo, e percorre diariamente todos os plantios e viveiros, examinando as melhores opções para o manejo dos solos. Rafael nos mostrou variedades de pitaya, café conilon e arábica, cacau de sombra e de sol aberto, e o projeto de pimenta-do-reino com estacas vivas, que já gera renda para a escola. Ele usa a gliricídia, uma árvore de tronco reto e fino, que sustenta e sombreia as trepadeiras de pimenta, evitando o gasto com estacas de eucalipto tratado. Neto de sitiante, Rafael tem a facilidade de traduzir a linguagem técnica para a fala comum dos agricultores da região.
“Difícil é mudar a cabeça de quem cresceu aprendendo a fazer monocultivo e usar venenos, sem preocupação com a conservação do solo e o equilíbrio com a natureza”, esclarece Rafael. Ele recebe demandas de quem procura um cultivo com retorno financeiro rápido, mas sempre procura oferecer alternativas de uma produção natural saudável que tende a ganhar mais preço.
Para mudar a mentalidade do agricultor sem desrespeitar seus conhecimentos ancestrais, a escola conta também com o idealismo da coordenadora Dionara e com a capacidade de persuasão do agrônomo Felipe Otávio Campelo, diretor pedagógico da escola. E também com a atuação de uma centena de técnicos em agroecologia que já formaram, além de 70 especialistas em agroecologia e educação do campo que passaram por suas salas de aula. Atualmente há 70 estudantes no curso técnico de agroecologia e a perspectiva de iniciar um curso de agronomia em março. Causa espanto que a Embrapa, com tantos sucessos no desenvolvimento da agricultura brasileira nas décadas passadas, ainda não tenha ido oferecer sua competente ajuda nas áreas que a escola precisar.
A escola Egidio Brunetto é uma ilha de biodiversidade num oceano de eucaliptais, cafezais contínuos e extensas pastagens de gado de corte, e nos arredores desfilam frotas de camionetas Hilux com seus ocupantes exibindo e às vezes disparando winchesters comprados na recente farra armamentista que o país conheceu. Ou seja, o ambiente em torno é hostil àquele nicho de ecologia humana e relação do trabalhador com o seu ambiente natural. Mas os 40 anos de história do MST são cheios de exemplos de coragem e resistência.
*Editado por Fernanda Alcântara