MST 40 anos
Onde eu estava há 40 anos, quando o MST foi fundado, e onde estou hoje quando se celebra o MST
Confira artigo de Makota Celinha sobre os 40 anos do MST

Por Makota Celinha
Da Página do MST
Eu estava na faculdade de comunicação, trabalhava na primeira escola alternativa de BH, o PICAPAU AMARELO, uma cooperativa educacional que fazia educação com integração de classe; escrevia poesia e era uma jovem católica da Juventude Operária Cristã – JOC; participava de um Grupo de Jovens chamado LUPAC – Lutamos Unidos pelo Amor de Cristo, era militante da CUT e do PT. Era um cenário de lutas intensas contra o regime militar que só sabia oprimir e reprimir. Em nosso país ainda não havia democracia plena, ainda sairíamos às ruas por Diretas Já!!! Foi nesse cenário que surgiu o MST, quando trabalhadores rurais no 1º Encontro Nacional em Cascavel, fundam o movimento de forma mais organizada por terra, reforma agrária, democracia e mudanças sociais.
Aqui da cidade sabíamos a importância da luta do movimento, lembro-me dos botons, adesivos e manifestações públicas onde sempre estava o MST. Nós negras e negros nunca tivemos terra, mas tivemos Palmares e vários outros quilombos espaços de resistência e luta. Talvez por isso, me sinto tão próxima do movimento. Um movimento que não se aquieta, não se acomoda e nem se vende às ilusões capitalistas. O MST me traz muito de Guimarães Rosa, quando nos diz que “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem” e é desta coragem que me fala o escrito, que vejo nos olhos e nas faces dos militantes do MST, uma ousadia que não cabe em qualquer lugar a não ser nas ruas e nas terras ocupadas para nela produzir.
Falam de forma apaixonada sobre a importância da reforma agrária, do direito à terra para quem nela produz e produz coisas boas, gostosas, ainda caras para meu bolso, mas essenciais à vida com saúde e dignidade. E digo caras, porque o sistema político desse país não investe nem deixam quem quer investir em alimentação saudável e aí a fábrica de comida com veneno do agronegócio se torna a principal forma de adquirir comida nesse país. Comida que mata lentamente e com autorização do Estado brasileiro.
Mas voltemos ao MST e sua organização que não vê fronteiras e vai a onde precisa ir para ajudar a construir alternativas alimentares saudáveis, tendo para isso as brigadas. Sua proposta de sociedade é uma proposta diferente de tudo o que está aí, e que inclusive setores da esquerda brasileira têm como ideal e que nós sabemos não ser.
Não mais acreditamos na conciliação das classes, pois sempre haverá a que não tem o que comer, onde morar, trabalhar e estudar; e a que tem medo deles. Por isso, esses setores que têm a barriga cheia, moram bem, não precisam trabalhar para comer e têm a educação nas mãos investem tanto nas práticas fascistas, na disseminação do ódio. A radicalização da luta popular e da organização das massas se faz, portanto, nesses 40 anos do MST, mais importante e necessária talvez, do que foi em 1984. Por que hoje vivemos o mundo tecnológico, onde as pessoas não têm mais pudor em disseminar seus preconceitos, destruir a natureza e naturalizar a violência. Em 1984, lutávamos por uma questão comum que inclusive interessava à classe média: o fim da ditadura militar. Hoje, o que vemos inclusive é a inversão do comum, quando vimos setores da classe média, por puro ódio, pedir a volta da ditadura militar.
Por estas e outras é que organizações como o MST são tão necessárias, ainda não dá para colocarmos as redes nos assentamentos e só comer o saudável que ali é produzido. A rua ainda é nossa bandeira principal. E eu vejo essa gana de ir às ruas na militância do MST, de ir a onde a luta se faz necessária sem se prender em fronteiras, sejam elas quaisquer que se apresentem.
E é exatamente esta busca por mudanças radicais, que podem transformar nossas vidas que me faz tão próxima desta gente. Uma gente que se não fosse tudo isso, que já é muito e motivador para quem gosta de lutar, ainda cuida da casa de meus ancestrais. Cuidam da terra, do plantio, da alimentação saudável e eu sou uma mulher de tradição. Eu acredito e busco o melhor para alimentar meu sagrado, a comida que cozinharei e irei oferecer a meus ancestrais tem que ser a melhor possível, a galinha, o cabrito, e os demais animais a serem sacralizados e transformados em alimentos para meus ancestrais e meus convidados a comerem comigo, tem que ser saudáveis, bonitos e bem alimentados. A comida que ofereço a minha ancestralidade não pode ter veneno. A terra tem que estar bem cuidada, revigorada para produzir o melhor e quem é que melhor cuida da morada de quem me mantém viva, acesa e pronta pra luta?? Meus amigos do MST. Por isso, tiro para vocês o meu chapéu e lhes ofereço minha eterna gratidão por cuidarem tão bem de mim. Quem ama os meus, a mim ama!!!
Parabéns MST, vida longa a esta gente tão brava e que sabe o que quer!!!
Makota Celinha Gonçalves
*Editado por Fernanda Alcântara