Maceió Afunda
Crime ambiental, indiciamentos e recomendações: entenda o relatório da CPI da Braskem
Por Gustavo Marinho
Da Página do MST
Encerrada na última terça-feira (21), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou a ação da Braskem em Maceió (AL), aprovou seu relatório final apontando a responsabilidade da petroquímica pelo crime ambiental, já considerado o maior do mundo em área urbana. A CPI ainda indicou o indiciamento de três empresas e 11 pessoas pelo crime que atingiu mais de 200 mil famílias direta e indiretamente, nos bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e parte do Farol, afetando cerca de 20% da capital alagoana.
A CPI criada em dezembro de 2023, a partir do pedido do senador Renan Calheiros (MDB/AL), atuou na investigação do crime ambiental e os efeitos das responsabilidades jurídicas e socioambientais da Braskem no afundamento do solo em Maceió.
O relatório aprovado acusa a Braskem pelos crimes de “lavra ambiciosa”, caracterizado quando a exploração ultrapassa o permitido, deixando as minas improdutivas, além dos crime de falsificação ideológica dos relatórios encaminhados às agências reguladoras e do crime contra a natureza.
Presidida pelo senador Ormar Aziz (PSD/AM) e com o senador Rogério Carvalho (PT/SE) como relator, identificou elementos para indicar investigação de oito pessoas ligadas à petroquímica.
São elas: Álvaro César Oliveira de Almeida, Diretor Industrial da empresa no período de 2010 a 2019; Marco Aurélio Cabral Campelo, Gerente de Produção da empresa; Paulo Márcio Tibana, Gerente de Produção entre 2012 e 2017; Galileu Moraes Henrique, Gerente de Produção entre 2018 e 2019; Paulo Roberto Cabral de Melo, engenheiro responsável pela primeira mineração da Braskem entre 1976 e 2006; Alex Cardoso Silva, responsável técnico pela empresa em 2007, 2010, 2017 e 2019; Adolfo Sponquiado, responsável técnico da empresa no local de mineração entre 2011 e 2016; Marcelo de Oliveira Cerqueira, Diretor Executivo desde 2013 (atualmente Vice-Presidente Executivo de Manufatura Brasil e Operações Industriais Globais).
Além desses nomes, a CPI recomendou indiciamento de engenheiros que apresentaram, segundo o relatório, laudos enganosos ou falsos sobre a situação dos bairros; bem como o indiciamento de empresas ligadas à Braskem.
De acordo com Evelyn Gomes, do Observatório do Caso Braskem, a CPI que teve alguns pontos de tensão em seu andamento, teve como principal marco a demonstração das contradições do sistema de regulação da mineração no Brasil.
“A CPI demonstrou o quanto nosso sistema regulatório de mineração é frágil, favorável às empresas, e o quanto essas empresas podem ser negligentes com suas ações”, destacou Evelyn. “A CPI quase que inteira se debruçou em como as agências reguladoras não estão cumprindo seus papéis e em como suas relações com as empresas aumentam o risco de suas atividades”.
Ainda como sinalização do relatório, a CPI recomendou aos órgãos públicos a redefinição da propriedade da área afetada pela ação da mineradora, a instalação de memorial à cidade atingida pela mineração, a revisão do valor dos imóveis vizinhos à área de risco, o acompanhamento da aplicação dos recursos recebidos pela Prefeitura de Maceió, além da elaboração imediata do Plano Diretor de Maceió e do Plano de Mobilidade Urbana.
Próximos passos
Segundo Evelyn Gomes, existem agora uma série de expectativas para o desdobramento da CPI que investigou a mineradora. De acordo com a criadora do Observatório que se dedica a acompanhar o caso da Braskem em Maceió e suas consequências junto às comunidades afetadas, os próximos passos precisam se debruçar sobre a situação das famílias atingidas.
“As expectativas são que no campo do judiciário e dos Ministérios Públicos a gente consiga avanços em reabrir e recalcular o acordo com as famílias atingidas pela mineradora, além da continuidade das investigações e processo criminal sobre o caso, agora com provas e sistematização dos processos. Precisamos ir atrás dessas pessoas que têm a responsabilidade sobre o crime”, pontuou.
Ainda paralelo aos desdobramentos da CPI, a Polícia Federal dá continuidade à segunda fase da operação “Lágrimas de Sal”, que efetuou na manhã desta sexta-feira (24) o cumprimento do mandado de busca no endereço de investigados pelo crime da mineradora.
A Polícia Federal apreendeu celulares, computadores e equipamentos eletrônicos, na busca de novos indícios que comprovem a falsidade de dados que foram apresentados em relatórios e laudos topográficos para esconder o processo de afundamento do solo.
Entenda o caso
Resultado da exploração de sal-gema, material utilizado na indústria química para a produção de policloreto de vinila (PVC), soda cáustica, bicarbonato de sódio e ácido clorídrico, que começou em Maceió ainda nos anos 70, iniciada pela empresa “Sal-gema Indústrias Químicas”, que foi estatizada e privatizada novamente em seguida. Em 2022, a partir da fusão com outras empresas passou a ser chamada de Braskem, com controle do Grupo Novonor (antigo Odebrecht), a exploração do solo na capital alagoana foi realizada em área urbana a partir de dezenas de poços de extração do minério, que após a instabilidade das crateras causou danos que foram visíveis na superfície.
Em virtude de uma falha geológica na região hoje atingida, a instabilidade no solo levou a um tremor de terra sentido em março de 2018, provocando rachaduras nos bairros. De lá para cá o caso foi se agravando e, como consequência, diversas famílias precisaram desocupar suas casas nos bairros, que se tornaram bairros fantasmas em Maceió.
Leia mais: 7 pontos para entender o crime ambiental da Braskem em Maceió
*Editado por João Carlos