Jornada da Natureza
Mata Atlântica ganha reforço com semeadura aérea, em assentamento do MST em Antonina/PR
Por Setor de Comunicação e Cultura do MST no PR
Da Página do MST
O território exuberante do assentamento agroflorestal do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Antonina (PR), José Lutzenberger, foi o cenário do último sobrevoo da 2ª Jornada da Natureza, nesta sexta-feira (7). O helicóptero da Polícia Rodoviária Federal (PRF) acelerou a semeadura de 1.500 quilos de semente de palmeira juçara, árvore ameaçada de extinção pela extração para a produção de palmito em conserva. Com esta ação, a Jornada chegou a cerca de 12 mil quilos de sementes de juçara e pinhão, lançadas em 6 áreas da reforma agrária e uma Terra Indígena, desde o dia 3 de junho.
A ação desta sexta reforçou a tarefa já cumprida pelos pássaros e outros animais que se alimentam do chamado açaí da Mata Atlântica, e também pelo trabalho de reflorestamento da área feito pelas famílias camponesas há mais de 20 anos. A área, antes degradada pela exploração de madeira e pela criação de búfalos, passou a ser reflorestada por famílias camponesas e caiçaras que ocuparam o local em 2002. A produção de alimentos no Sistema Agroflorestal garante renda para as famílias, em harmonia com a natureza.
A emoção tomou conta de moradores/as da comunidade ao ver o pouso da aeronave em uma clareira na mata. As camponesas que subiram para ajudar na semeadura viram do alto a transformação que fizeram no chão com as próprias mãos. “É muito lindo, meu Deus. Eu não imaginava ver assim. É um sonho”, disse dona Maria de Souza, uma das fundadoras da comunidade, que comemorou 84 anos no dia da ação. “Lutem sempre pro povo vencer, porque nós precisamos da terra pra trabalhar”, garantiu a matriarca que vive na região há mais de 40 anos.
Camponesas Sem Terra, protetoras da Mata Atlântica, se emocionaram ao participar da semeadura aérea e puderam ver a floresta de cima. Foto: Juliana Barbosa / MST no PR
O território faz parte da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaraqueçaba, litoral do estado, e reúne as culturas camponesas e caiçaras. Por conta deste trabalho de reflorestamento da área, a comunidade recebeu o prêmio Juliana Santilli de Agrobiodiversidade, em 2017.
Após a semeadura, um ato reuniu representantes da PRF, da Conab, da Embrapa, do Incra, da UFPR, do Ibama, além do próprio MST. Nilton Bezerra Guedes, superintendente do Incra-PR, lembrou das inúmeras ameaças de despejos enfrentadas pela comunidade, com a justificativa de que a presença do MST no local significaria um risco para o meio ambiente: “Aqui se dizia que a reforma agrária iria destruir o meio ambiente. Mas vocês acharam uma solução pra conseguir regenerar. Vocês são exemplos de resistência e persistência para todos nós”.
O Ibama é um dos órgãos que têm feito monitoramento do crescimento da palmeira juçara semeada via helicóptero ano passado, durante a primeira edição da Jornada. Rafael Prado Engelhardt, chefe da Divisão Técnica do Ibama-PR, esteve entre o grupo de servidores dos órgãos que participou de perto das ações deste ano, inclusive em Antonina. Ele relata que o Instituto incluiu o monitoramento das áreas no planejamento anual do órgão. “O Ibama vem acompanhando a germinação, e os resultados preliminares foram muito positivos neste aspecto […]. Agora o monitoramento vai ser no sentido de verificar a permanência e o crescimento dessas espécies no local”, afirma. Pesquisadores da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) também atuam na monitoria da área, de confirmam a eficácia da semeadura aérea.
“A gente fica muito feliz em escutar de vocês esse cuidado como na natureza. Estamos falando em um bioma que tem apenas 12% de remanescente daquela vegetação que ocupava originalmente o nosso território. Então a gente não pode mais falar apenas em reduzir desmatamento, a gente tem que falar em recuperar áreas. Espero que essa parceria possa seguir pros anos futuro”, garantiu o servidor, durante o ato realizado na comunidade José Lutzenberger.
A restauração ambiental aliada ao fortalecimento da segurança alimentar e nutricional são os grandes destaques da ação, na avaliação do Diretor-executivo de Política Agrícola da Conab, Sílvio Isoppo Porto: “Para além da perspectiva ambiental, essa ação vai promover e possibilitar uma exploração sustentável, numa perspectiva de agrofloresta, reforçando uma outra lógica de sistemas de produção bem mais complexas do que monocultivos”.
O comandante operacional da aeronave utilizada para a semeadura, comandante Juliano Kunen, participou da Jornada pelo segundo ano consecutivo, e enfatizou a importância de repetir a ação, para buscar “a perfeição” no método inovador da semeadura aérea. “Temos que usar esse exemplo e seguir em frente, em muito mais áreas e com mais aeronaves. A mensagem final é que voem e vençam”, disse o integrante da PRF, em Antonina.
O almoço servido pela comunidade a todos os participantes trouxe no cardápio pratos típicos da culinária litorânea, como pirão e caldo de peixe e escabeche de palmito pupunha. Os participantes também visitaram uma agrofloresta da comunidade. Como já é tradição nas atividades da comunidade, o grupo de Fandango Caiçara Mandicuera coroou o dia com muita música e dança.
12 mil quilos de semente espalhadas pela Mata Atlântica paranaense
O encerramento da Jornada ocorreu no sábado (8), no assentamento Contestado, localizado na Lapa. Além de uma oficina de manejo de bananeira, o encontro recebeu dezenas de moradores da comunidade, estudantes da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), e integrantes do Ibama, Conab e UFPR.
O superintendente do IBAMA-PR, Ralph Albuquerque, participou da Jornada ao longo de toda a semana, e frisou a importância do enraizamento da ação entre as famílias camponesas, e também na aliança entre os órgãos públicos: “Isso aqui tem uma possibilidade de projeto, de continuidade”.
Para Roberto Baggio, da direção nacional do MST pelo Paraná, a segunda Jornada foi reveladora, porque teve participação ativa e grande mobilização das famílias da Reforma Agrária, nas comunidades indígenas, posseiros, caiçaras e agricultores familiares. “Ela colocou em movimento os verdadeiros agroflorestais que cuidam da nossa natureza e da biodiversidade, somado ao envolvimento de diversos órgãos públicos e universidades.”
“Como síntese final e missão que aprendemos, nós pertencemos à natureza, e ela não nos pertence. Cabe a nós cuidar desse bem coletivo, desse bem maior para que os nossos filhos e as futuras gerações vivam nessa casa comum no tempo que existir nessa terra”, frisou o dirigente do MST.
Cleide de Oliveira Gonçalves está entre as centenas de militantes do MST que demonstraram muita alegria ao participar ativamente da Jornada. Ela recebeu em sua casa a abertura das atividades em Guarapuava, no dia 5, Dia Mundial do Meio Ambiente. “Os grandes não se preocupam com isso, quem se preocupa somos nós, a agricultura familiar, os pequenos […]. Nós juntamos o pouco que temos pra recuperar a natureza, e quando a gente recupera ela, sempre colhemos bons frutos”, sintetizou a camponesa.
Os 12 mil quilos de sementes de palmeira juçara e araucária, lançados de helicóptero, foram lançados nas comunidades do MST em Quedas do Iguaçu Celso Furtado, Vilmar Bordin, Fernando de Lara e Dom Tomás Balduíno; no assentamento Nova Geração, em Guarapuava; além do assentamento José Lutzenberger, em Antonina.
Nesta edição, a Jornada também foi realizada pela Terra Indígena (TI) Rio das Cobras, em Nova Laranjeiras – a maior TI do estado. A atividade teve a presença da ministra dos Povos Originários, Sônia Guajajara, do chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macedo, e da ministra interina do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Fernanda Machiaveli.
Também ocorreram atividades em cerca de 25 escolas de comunidades do MST, e dezenas de oficinas e plantios de árvores em todo o estado.
As atividades do MST no Paraná fizeram parte da Jornada Nacional do MST em Defesa da Natureza e seus Povos. Bárbara Loureiro, integrante da coordenação nacional do “Plano Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis”, esteve na Jornada do Paraná e explicou o sentido das mobilizações em todo o Brasil:
“Denunciamos as ações e os verdadeiros responsáveis pela crise ambiental, que é o agronegócio, a mineração, a bancada ruralista que flexibiliza leis ambientais, e que são de fato quem envenena as pessoas, rios, a nossa água e os verdadeiros inimigos do clima e do meio ambiente”, garantiu, se referindo também à crise enfrentada pela população do Rio Grande do Sul, com a grande enchentes ocorridas desde o início de maio. “É com a reforma agrária popular e com a agroecologia que a gente vai semear a vida e enfrentar a crise ambiental”, completa.
A 2ª Jornada da Natureza foi realizada pelo MST e pela Associação de Cooperação Agrícola e Reforma Agrária do Paraná (ACAP), com patrocínio da Caixa Econômica Federal, e parceria com Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Superintendência do Instituto de Colonização e Reforma Agrária do Paraná (Incra-PR), Superintendência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Superintendência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Itaipu Binacional, Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), Secretaria Comunicação Social do Governo Federal, Cooperativa Central da Reforma Agrária (CCA), Cooperativa de Crédito Rural de Pequenos Agricultores e da Reforma Agrária do Centro Oeste do Paraná (Crehnor), Universidade Federal da Fronteira Sul campus Laranjeiras do Sul (UFFS), Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro), Instituto Água e Terra (IAT) e Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR).
*Editado por Fernanda Alcântara