Resistência

Da lona preta para a Feira da Reforma Agrária: Leandra e a luta na terra de Zumbi

Leandra destaca a luta pela terra e a transformação no Acampamento Che Guevara
Foto: Suzany Rodrigues

Por Nicole Mafra
Da Página do MST

Há 12 anos com uma dívida tributária em cerca de 3,4 bilhões, uma antiga disputa de interesses entre as tradicionais famílias alagoanas e inúmeras denúncias de irregularidades, o grande grupo de indústria sucroalcooleira João Lyra decretou um dos maiores processos de falência de sua área.

Nesse cenário infértil e decadente germina em União dos Palmares, mais especificamente da antiga Usina Laginha, pertencente ao grupo João Lyra, em uma área que chega a um total de 16 mil hectares, a semente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e a transformação das terras improdutivas, para a produtividade.

Esse é só o início da história do Acampamento Che Guevara, que possui uma linda vista para a Serra da Barriga que, não à toa, emociona pela simbologia da resistência e representatividade no mesmo território.

“Existe aqui um povo organizado que tá para trabalhar”

Foto: Mykesio Max

Leandra, acampada no Che Guevara, é mãe solo de 6 filhos. Está há 8 anos junto de seus companheiros no processo para a regularização da terra, entre ameaças de despejo, descaso do Poder Público, o acampamento segue como referência da luta pela terra na região.

Existem muitas outras questões que assolam a vida dos acampados, para além da não regularização do território. Leandra destaca, por exemplo, os atrasos na política para a entrega das sementes, rudimentaridade dos equipamentos que adoece os produtores, pragas na plantação, enchentes dos rios, difícil acesso à educação e a atendimento médico. “Mas por outro lado, temos a constante movimentação organizada em busca de melhorias e renovação”, destacou Leandra. “Por exemplo, a recente conquista da sala de aula que deve estar normalizada até o final do ano”.

Leandra também fala muito e com bastante entusiasmo sobre os cursos que são e estão para serem implementados, como o de corte e costura na comunidade. “Um grupo de cerca de 70 mulheres realizou recentemente um curso de derivados do leite que almeja futuramente abrir uma cooperativa para gerar renda para as mulheres no campo”, explicou. “Quanto mais se luta, mais se tem a conquistar”.

De acordo com Leandra, muitas das mulheres que estão no acampamento já sofreram algum tipo de violência, sofreram muito e têm medo de voltar a viver na cidade. “No acampamento existe uma relação de cuidado, união e acolhimento muito forte. Não há como ser diferente num lugar que tudo foi construído a base disso”.

É o legado que o acampamento Che Guevara deixa com a morte de um latifúndio. Uma história de vida!

“O acampamento foi o lugar onde encontrei a cura da alma”

Hoje em dia são mais de 100 famílias residentes na antiga Usina, todas elas, que antes, sem um processo de construção e trabalho coletivo nunca conseguiriam acessar certos direitos, nunca seriam vistas e nem poderiam sonhar.

Leandra, residia na cidade de Maceió, foi direcionada por um amigo que participava de movimentos sociais ao acampamento e diz que sua experiência em coletividade mudou drasticamente sua vida. “Após ter sido vó cinco vezes não me sinto velha, me sinto renovada no acampamento”.

O trabalho coletivo, o mutirão, as formações, a ajuda mútua, transformaram o que antes era apenas cana-de-açúcar, em um território que, para além da produção de alimentos saudáveis, possibilita a reconstituição da dignidade do sujeito e o encontro do sujeito consigo mesmo. “É a cura da alma”, comentou Leandra.

Feira da Reforma Agrária

Foto: Suzany Rodrigues

Dos 8 anos de luta no acampamento, essa já é a quarta vez que Leandra participa da Feira do MST em Maceió. Exibindo os produtos da sua roça, Leandra comercializa na 23ª edição da Feira, que acontece até sábado (7), na Praça da Faculdade, a laranja, batata, milho e uma variedade de produtos resultado do suor e do trabalho .

Além da possibilidade de partilhar da produção da Reforma Agrária e de histórias de luta como a de Leandra, a Feira segue com a programação cultural, atividades de formação e uma ampla agenda de iniciativas gratuitas e abertas ao público.

*Editado por Fernanda Alcântara