Cooperação
Parceria Brasil-China potencializa desenvolvimento tecnológico da Agricultura Familiar
Por Lays Furtado
Da Página do MST
Uma parceria inédita foi firmada em Memorando de Entendimento (MoU), nesta quarta-feira (27), entre a Universidade Federal de Brasília (UnB) e a Universidade Agrícola da China (CAU), no marco do lançamento do Centro Brasil-China de Pesquisa, Desenvolvimento e Promoção de Tecnologia e Mecanização para Agricultura Familiar. O ato de lançamento ocorreu no Auditório da Fundação Oswaldo Cruz e no Parque Científico e Tecnológico da UnB, contando com a participação de autoridades de ambos países, que celebraram a parceria ao longo da cerimônia.
O Memorando de Entendimento foi assinado por Rozana Reigota Naves, Reitora da UnB e Du Taisheng, Vice-Presidente da Universidade Agrícola da China (CAU), em meio a presença de representantes e autoridades dos dois países. No evento foram destaque a participação de Huai Jinpeng, Ministro da Educação da China; Zhu Qingqiao, Embaixador da China; Paulo Teixeira, Ministro do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA); e João Pedro Stedile, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Entre as autoridades presentes, também estiveram no evento: Kelly Mafort, Secretária da Secretaria Geral da Presidência (SG/PR); Alexandre Brasil Carvalho da Fonseca, Secretário da Educação Superior (Sesu) do Ministério da Educação (MEC); Inácio Arruda, Secretário do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTI); Pedro Guerra, Chefe de Gabinete do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e da Vice-Presidência da República (MDIC); Irajá Lacerda, Secretário Executivo do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
A programação também incluiu visitas e apresentações em locais que ilustram a cooperação entre Brasil e China, com a exibição das máquinas agrícolas chinesas; mostra das experiências de Cooperação China-Brasil em Mecanização Agrícola; apresentação do Centro Brasil-China para Agricultura Familiar; do laboratório de Agroecologia Familiar Digital (Living Lab do sistema Bigdata); e Residência Científica e Tecnológica.
O evento contou com o patrocínio da Fundação Banco do Brasil (FBB), e com o apoio da Secretaria Geral da Presidência da República (SG/PR), do MDA, bem como da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (FINATEC). A parceria entre todas as entidades envolvidas representou um marco na colaboração bilateral Brasil-China, aportando o compromisso de ambos os países em fortalecer os laços na educação, na pesquisa científica e no desenvolvimento da agricultura familiar, além de consolidar o compromisso com a inovação tecnológica para a agricultura.
Celebração do marco de cooperação bilateral
João Pedro Stedile, do MST, iniciou sua fala saudando as delegações chinesas e o embaixador Zhu Qingqiao, destacando a importância do momento para os desafios da agricultura familiar no Brasil, que conta com mais de 5 milhões de agricultores. Ele enfatizou que a fome não se combate apenas com a distribuição de cestas básicas, mas sim com a produção de alimentos saudáveis. “Quem produz alimentos são os agricultores/as”, afirmou.
O dirigente Sem Terra também destacou que o ato, embora simbólico, representa um passo significativo para enfrentar os problemas da fome, produzir alimentos, superar a pobreza, reduzir as desigualdades e reconstruir o tecido social. “Os chineses são mais do que nossos amigos, são nossos companheiros”, concluiu.
Já o Embaixador Zhu Qingqiao, ressaltou que, nos últimos anos, as relações entre Brasil e China têm se intensificado e precisam se traduzir em novos projetos que beneficiem diretamente a população. “Brasil e China são dois grandes países, e o fomento à agricultura familiar pode trazer resultados concretos no combate à pobreza e à fome. Essa parceria será fundamental para alcançarmos esse objetivo”, afirmou.
Ele também mencionou a importância de fomentar parcerias em áreas como finanças, infraestrutura e transição energética. “Este é um momento histórico para as relações bilaterais, e queremos aproveitar essa oportunidade para desenvolver parcerias mais abrangentes, especialmente em ciência, tecnologia e educação”, destacou.
A reitora da Universidade de Brasília, Rozana Reigota Naves, evocou os fundadores da instituição, Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira, como inspiração para acolher o Centro Brasil-China para a Agricultura Familiar. Ela destacou a relevância dessa parceria bilateral para a promoção de pesquisas, desenvolvimento tecnológico e intercâmbio acadêmico.
“Essa relação representa uma oportunidade de aprimorar mecanismos e influenciar positivamente as políticas públicas no campo da agricultura familiar”, afirmou, ressaltando o compromisso da UnB com a inovação e a colaboração internacional.
Em sua fala, o Ministro do MDA, Paulo Teixeira, destacou três pilares fundamentais para fortalecer a agricultura familiar no Brasil: financiamento com juros baixos, Reforma Agrária e compras públicas. Ele frisou os desafios que o setor enfrenta, especialmente no que diz respeito à mecanização agrícola e à tecnificação, que ainda não alcançam plenamente as propriedades de menor escala.
“O Brasil possui uma mecanização adequada para grandes propriedades, mas precisamos avançar para garantir que a agricultura familiar também seja contemplada. Isso é essencial para o desenvolvimento do setor”, concluiu o Ministro.
O Ministro de Educação da China, Huai Jinpeng, celebrou a parceria entre a Universidade Agrícola da China e a UnB, descrevendo o dia como um marco para a colheita de frutos dessa cooperação. “Durante a visita de Estado houve um consenso entre o presidente Lula e as lideranças chinesas sobre a importância dessa colaboração”, destacou.
Ele mencionou que a educação sempre foi uma prioridade na China, sendo um dos alicerces para o desenvolvimento tecnológico e o crescimento econômico. “A formação de mão de obra qualificada é um ativo valioso. Vamos trabalhar com o Brasil para superar a pobreza e promover o desenvolvimento socioeconômico. A educação é uma força pioneira e continuará sendo uma base para nosso progresso conjunto”, declarou Jinpeng.
Fórum Brasil-China
O marco de lançamento do Centro Brasil-China foi um evento antecedido pela programação do “Fórum Brasil-China: Marcos para uma nova cooperação para o desenvolvimento compartilhado”, que aconteceu entre os dias 26 e 27 de novembro de 2024, na UnB, em Brasília. Além da UnB, o Fórum foi organizado pelo Instituto Taihe, com a parceria da Associação Internacional para a Cooperação Popular (Baobab/IAPC) e o MST.
Este evento foi resultado da crescente cooperação entre Brasil e China em pesquisas agrícolas e no desenvolvimento rural, com foco na agricultura familiar. E representou uma oportunidade de aprofundamento da colaboração entre os dois países em temas fundamentais para o desenvolvimento sustentável, visando a promoção de soluções inovadoras e práticas para a agricultura familiar e o fortalecimento das comunidades rurais.
Ao longo do primeiro dia do Fórum, foram compartilhados temas da geopolítica e sobre os modelos de desenvolvimento, já o segundo dia, foi voltado para as mediações sobre o desenvolvimento nacional e a agricultura familiar.
Ao longo dos dois dias, especialistas, representantes de movimentos sociais agrários, empresas de tecnologia, universidades e governos do Brasil e da China reuniram-se para discutir uma série de temas cruciais: como a cooperação entre Brasil e China, no contexto da geopolítica contemporânea; o papel da agricultura familiar no desenvolvimento nacional do Sul Global; a cooperação para o combate à fome, revitalização rural e o desenvolvimento do campo; além de debater sobre os estudos, pesquisas e inovações para a tecnificação e mecanização da agricultura familiar; segurança e soberania alimentar, agroecologia e transição agroecológica.
Debates sobre a cooperação e o desenvolvimento agrário
A mesa de abertura do evento ocorreu na tarde do dia 26 de novembro, no Auditório da Faculdade de Tecnologia da Unb, em que foram apresentadas as “Novas Bases da Geopolítica Contemporânea e Soluções para o Desenvolvimento Nacional no Sul Global”. Para este tema, estiveram na mesa de debate: Marcio Pochmann, Presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Liang Yongmei, do Instituto de Economia Industrial da Academia Chinesa de Ciências Sociais; João Pedro Stedile, do MST e Yue Haiping, vice-presidente da TCL LABS, que apresentaram um panorama da visão global da indústria e localização no Brasil.
Durante o painel, Marcio Pochmann, do IBGE, destacou que esta em construção uma nova era para a classe trabalhadora de 2050. “Neste momento, estamos refletindo sobre como essa classe do futuro se relacionará com a tecnologia. Até agora, o polo dinâmico da economia esteve no litoral, concentrado para o Atlântico. No entanto, o centro econômico está se interiorizando para dentro do Brasil, e talvez, no futuro, essa classe se volte para o Pacífico”, disse Pochmann.
Já Liang Yongmei, representante do Instituto de Economia Industrial da Academia Chinesa de Ciências Sociais, mencionou que, “a estratégia de priorizar o desenvolvimento da indústria permitiu que a China estabelecesse rapidamente um sistema econômico-industrial nacional, relativamente completo e independente em um período de tempo curto.”
E Yue Haiping, da TCL, destacou o interesse que os chineses têm em ampliar as parcerias da indústria de tecnologia no continente latino: “Construímos bases de expansão estáveis no cenário global, validando grandiosas experiências. O mercado brasileiro é uma estratégia importante para a TCL, que segue três princípios nas suas colaborações na América Latina: respeito, transparência e honestidade.”
No painel seguinte da mesa de abertura, foi apresentada a pauta da “Estratégia Tecnológica para a Agricultura Familiar na Cooperação entre Brasil e China”, onde estiveram presentes: Celso Pansera, presidente da FINEP; Ceres Hadich, da coordenação nacional do MST; Miriam Nobre, da Marcha Mundial das Mulheres (MMM); Arnaldo Brito, da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG); Sergio Sauer, coordenador do Centro de Agricultura Familiar Brasil-China e o Professor Dr. Zao Zhang da Universidade Agrícola da China (CAU).
Celso Pansera, disse que nos anos 80, a economia chinesa detinha um PIB nominal equivalente ao do Brasil. “Hoje, no entanto, o PIB da China é de sete a oito vezes maior, representando um crescimento impressionante. A história que se conta sobre a China, desenvolvendo a tecnologia e as fábricas pesadas, mostra um esforço contínuo do país.”
O Coordenador do Centro de Agricultura Familiar BR-CN e professor da UnB, Sergio Sauer, lembrou que: “Menos de 5% da média nacional das áreas de cultivo conhecidas como agricultura familiar têm acesso a tratores. E o trator, vale destacar, é considerado o equipamento inicial, essencial para impulsionar a mecanização e o desenvolvimento da produção.”
O Professor Dr. Zao Zhang, da Universidade Agrícola da China (CAU), contou que: “A produção brasileira é muito importante para a China, tem uma complementaridade de oferta e demanda desse mercado, principalmente na área da agricultura familiar. A China tem interesse em expandir essa relação em toda a América Latina”.
A palestrante Miriam Nobre, da MMM, destacou os desafios das questões de gênero e o desenvolvimento de tecnologias. “A tecnologia se desenvolve dentro de um contexto marcado pela divisão social, sexual e internacional do trabalho. As novas tecnologias precisam considerar não apenas o olhar sobre os corpos masculinos nos seu desenvolvimento, mas trazer as perspectivas das mulheres para esse processo de produção tecnológica.”
Na manhã do dia 27 de novembro, o Fórum continuou suas atividades no Auditório da Fundação Oswaldo Cruz, na Unb, com o propósito de dialogar sobre a “Mecanização, Tecnificação e Agricultura Digital na Agricultura Familiar”. Para este debate estiveram presentes: a professora Yang Minli, da Universidade Agrícola da China (CAU); Giselda Coelho, da coordenação do MST; Alexandre Lima, secretário de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar do Rio Grande do Norte; Wang Yuhang, gerente geral da Sinomach Digital Technology Co., LTD; e Vivian Libório de Almeida, diretora de inovação para a Produção Familiar e Transição Agroecológica (MDA).
A Professora Yang Minli, da Universidade Agrícola da China (CAU), destacou que mais de 80% de todo o setor agrícola da China é de pequenos produtores, com uma produção totalmente mecanizada. “Das 31 máquinas chinesas já importadas ao Brasil, demonstraram mais de 80% de eficiência e eficácia. Todos estamos impressionados com os resultados. Colheitas que eram feitas em 25 dias, hoje podem ser feitas em seis”, contou Minli.
Wang Yuhang, Gerente Geral da Sinomach Agrícola da China, mencionou que o mundo passa por mudanças na geopolítica global, mas a parceria com o Brasil está cada vez mais firme. “Existe um desequilíbrio no desenvolvimento do Sul Global, e queremos contribuir para diminuir essa diferença”, disse Wang.
Durante o segundo painel da manhã em 27 de novembro, também foi debatido o tema da “Soberania Alimentar, Agroecologia e Transição Ecológica”, contando com as exposições de Ana Terra Reis, da Secretaria de Abastecimento, Soberania Alimentar e Cooperativismo do MDA; Valéria Burity, da Secretaria de Combate Contra a Fome; Li Ji, reitor do Instituto de Pesquisa de Reciclagem Orgânica (Suzhou) da CAU; Débora Nunes, do Setor de Produção, Cooperação e Meio Ambiente do MST; Kleytton Morais, presidente da Fundação Banco do Brasil (FBB) e Rodrigo Fonseca, da Secretaria Especial de Articulação e Monitoramento da Casa Civil.
*Editado por Solange Engelmann