Solidariedade Sem Terra
“A gente quer o que é nosso de direito”, afirma Raquel da Silva, mulher indígena.
Coletivo Marmitas da Terra visita território indígena Cristo Purunã para conhecer a luta das famílias indígenas e partilhar as doações arrecadadas durante a Marcha do 8 de Março

Por Barbara Zem
Da Página do MST
Na manhã desta quinta-feira (13), mulheres do coletivo Marmitas da Terra do MST visitaram o território indígena Cristo Purunã, localizado no Morro do Cristo, em São Luiz do Purunã (PR). A aldeia, localizada a 50 km de Curitiba, é composta por 10 famílias Kaingang. São cerca de 40 pessoas – entre crianças, mulheres e homens – que lutam para que o espaço se torne definitivo de moradia.
O coletivo levou doações de alimentos, higiene pessoal e roupas que foram arrecadadas durante a Marcha das Mulheres do 8 de março em Curitiba. A atividade faz parte do Dia D da Jornada Nacional de Lutas das Mulheres Sem Terra de 2025, que acontece em todas as regiões do país, com o lema ”Agronegócio é violência e crime ambiental, a luta das mulheres é contra o capital!”. A solidariedade e a defesa do território onde os ancestrais viveram foi o ponto central da atividade.
Em Curitiba, na semana passada, foram realizados mutirões de doação de sangue, roda de cuidados de mulheres, oficina de defesa pessoal e a participação na Marcha do 8 de Março.



Em roda de conversa, companheiras indígenas explicaram como funciona a comunidade e apresentaram demandas. Fotos: Barbara Zem
Em conjunto com as famílias, o coletivo organizou uma roda de apresentação do espaço. Raquel Cassimiro da Silva, mulher indígena e filha do cacique da aldeia, contou a trajetória de como chegaram ali e a situação atual.
Raquel conta que chegaram ao território no dia 2 de julho de 2024. “A gente vive aqui porque a terra é nossa, porque nossos antepassados já passaram por aqui. (…) Agora, aqui vai ser uma aldeia. Já temos as crianças que vão ficar aqui quando a gente ficar bem velhinho, falando da nossa história. E agora vamos ficar cuidando dessa área, porque a gente quer o que é nosso de direito”, afirmou.


Com relação à educação das crianças, grande parte vai à escola para aprender o português. Na própria aldeia, tem aula do idioma Kaingang, com o professor André, irmão de Raquel. Assim, é possível colocar em prática a língua mãe, e reforçar a importância da cultura ancestral para os mais novos.
Desde o início da ocupação, há uma relação de respeito e atendimento nas áreas de educação e assistência social, que funcionam, mas tem muito a melhorar com o desenvolvimento do espaço da aldeia, saindo das lonas e ganhando infraestrutura, com casas, banheiros e cozinhas.

Cacique Valdemar, ou Rui, seu nome em Kaingang, reforça que a retomada daquele território é fundamental por representar um espaço que era de seus antepassados. “Hoje já estamos indo para um ano aqui. Não temos a certeza de que aqui vai ser nosso, aqui não dá plantio, mas vamos ver onde dá pra plantar a nossa batata, feijão, milho, aipim pra gente poder produzir também, e ir construindo nossa aldeia”, conta.

Marco temporal e empoderamento feminino
A demarcação é uma demanda fundamental às famílias. O vice cacique André Mattos questiona o atual processo. “Hoje, esse marco temporal é colocado não só para os indígenas, mas para os pequenos agricultores, e não favorece ninguém. Será que daqui a 40, 50 anos a minha filha ainda vai estar brigando por um pedacinho de terra pra poder viver sossegado?”



Crianças Kaingang. Foto: Barbara Zem
“As mulheres também têm direito nos territórios, têm direito de falar e conversar. E eu, vendo minha filha escrevendo um texto da escola, ela querendo ser uma líder futuramente, isso comove. Dentre os filhos, pelo menos um vai assumir o posto. Então eu sinto orgulho da minha filha hoje, de querer pegar o ritmo que a gente tá indo”, relatou André.

Para fechar o dia, depois de um belo café da manhã, foram entregues as doações de alimentos, roupas, itens de higiene pessoal e brinquedos para as crianças. A solidariedade de todos os tipos é bem-vinda, desde alimentos à infraestrutura, como tábuas de madeira para começarem a construir suas casas e deixar de viver em barracos.
Dessa forma, construindo os espaços comunitários da aldeia, transformando-as em um ambiente mais confortável, com casas, banheiros, cozinhas, escola, demanda de saneamento básico, embelezamento do espaço e ajuda na construção de uma horta comunitária já trariam mais independência para essas famílias.




Solidariedade uniu as camponesas na Jornada de Lutas. Fotos: Barbara Zem
*Editado por Fernanda Alcântara