Conquista

Cerimônia com entrega de contratos marca implantação do assentamento Olga Benário, no Tocantins

Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária Popular no Tocantins é celebrada com a entrega de contratos para famílias no assentamento Olga Benário, em Fortaleza do Tabocão

Foto: Arquivo MST/TO e Coletivo Tucum

Por Vicente Santos, Karine Corrêa e Matheus Gabriel Rodrigues
Da Página do MST

O Centro de Formação Veredas, antigo galpão da Fazenda Sinuelo, foi palco da cerimônia de entrega de contratos às 58 famílias do assentamento Olga Benário, localizado em Fortaleza do Tabocão, Tocantins. O espaço, que antes armazenava agrotóxicos e máquinas, transformou-se em um símbolo de esperança e resistência. Hoje, suas paredes sustentam a bandeira do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e dão espaço a árvores frutíferas cultivadas com carinho. É um lugar onde a semente da luta e da determinação germina em frutos saudáveis, colhidos pelas mãos de quem cuida da terra com respeito e dedicação.

As famílias assentadas celebram hoje uma longa jornada de luta e resistência, iniciada em 22 de junho de 2013, quando o acampamento Olga Benário foi montado às margens da rodovia Belém-Brasília (BR-153), no município de Tabocão. Desde então, enfrentaram diversos processos de criminalização de sua luta, incluindo uma das ações mais agressivas e violentas realizadas pelas forças de segurança, em 15 de setembro de 2017.

Nesse dia, um grande aparato envolvendo a Polícia Civil, a Polícia Militar, a Polícia Federal e outros órgãos de segurança, com uso de força desproporcional, helicópteros e agentes armados, realizou um dos maiores despejos judiciais da história do Tocantins. Essa ação violenta contra os trabalhadores rurais foi marcada por excessos e abusos, mas não desmotivou as famílias, que continuaram resistindo e lutando por seus direitos.

Após tantos desafios enfrentados ao longo de mais de uma década de resistência, as famílias do assentamento Olga Benário finalmente conquistaram os contratos que marcam a implantação oficial do território. Consolidou-se, assim, a permanência e a força coletiva que tornam possível transformar dor em dignidade e esperança em realidade concreta. A luta e a dedicação de cada família agora são oficialmente reconhecidas como espaço de vida, produção e pertencimento.

Foto: Arquivo MST/TO e Coletivo Tucum

Os Contratos de Concessão de Uso (CCU) entregues às famílias têm o objetivo de assegurar o uso e a exploração dos lotes, além de conceder acesso a programas de apoio à agricultura familiar. Durante a cerimônia, as famílias também assinaram contratos de apoio inicial, no valor de R$ 8.000,00. Esse recurso permitirá que comecem a trabalhar na terra e a melhorar suas condições de vida.

Durante a cerimônia, Maíra Coraci, diretora de Obtenção de Terras do Instituto Nacional de Colonizaçao e Reforma Agrária (Incra), reforçou o compromisso do governo federal com a Reforma Agrária Popular e destacou a importância do assentamento para a efetivação desse projeto:

“Se a gente está aqui dando suor, se a gente está aqui investindo 500 mil reais — porque além da terra, estamos investindo 500 mil reais em crédito de apoio inicial — é porque queremos fazer cumprir o compromisso do presidente Lula. Porque ele sabe que só chegou lá com o esforço de vocês. Porque vocês, eu, Antônio Marcos, todos nós acreditamos. E a gente não pode esmorecer, não podemos esmorecer. Este assentamento representa um passo dentro de uma demanda ainda maior: são 4 mil famílias cadastradas esperando terra aqui no estado. E é por elas também que seguimos firmes”.

Foto: Arquivo MST/TO e Coletivo Tucum

A cerimônia foi marcada por falas potentes das famílias hoje assentadas, que relembraram os desafios enfrentados ao longo de todo o processo até conseguirem, com muita luta, determinação e unidade, alcançar esse momento tão esperado por cada uma. Elas destacaram a importância da conquista, como expressou Manoel Leite, presidente da associação do assentamento:

“É uma grande alegria. No decorrer do tempo, foi muito sofrimento. Este momento, para mim, é de grande felicidade, algo que eu sempre esperei: uma vitória. Depois de tanto tempo, desde 2013, enfrentando barreiras e massacres… Não é uma luta fácil, mas é pela resistência e pela nossa família que seguimos até agora. Aos companheiros, digo: mantenham-se firmes. Aqui é resistência, é fé para prosseguir, para se garantir e se unir.”

Foto: Arquivo MST/TO e Coletivo Tucum

A seguir, Antônio Marcos Nunes Bandeira, coordenador estadual do MST, também tomou a palavra e emocionou o público com um discurso firme, em defesa da memória, da justiça e da dignidade dos trabalhadores do campo:

“Aos trabalhadores e trabalhadoras deste país, nós elegemos pela terceira vez Luiz Inácio Lula da Silva como presidente da República, e ele quem garante que vocês, companheiras e companheiros, recebam hoje esse documentozinho da terrinha, pequena, mas que é de vocês. É o lugar de vocês cheirarem as velhinhas de vocês todos os dias, os netinhos, de receberem quem quiserem com tranquilidade, e nunca mais ouvirem a sirene da polícia nem o helicóptero da Polícia Militar sobrevoando nosso território à procura de bandidos. Hoje vocês são assentados e assentadas da Reforma Agrária Popular. E nós nunca fomos bandidos, nunca invadimos nada de ninguém, nós lutamos e conquistamos aquilo que é nosso por direito: a terra. E hoje, a gente concretiza isso.

Que fique registrada, nesta fala, a importância da memória, mas também da indignação e da luta, que vamos seguir fazendo neste mês de abril, em homenagem aos nossos mortos que tombaram, e em memória viva dos trabalhadores e trabalhadoras que seguem erguendo suas bandeiras de luta.”

A presença de diversas autoridades marcou a cerimônia, entre elas: Dom Giovane, bispo de referência da CPT Araguaia-Tocantins; Maurílio, representante da Advocacia-Geral da União (AGU); Dr. Pedro Alexandre, defensor público-geral do Tocantins; Edmundo Rodrigues, superintendente regional do INCRA no Tocantins; Eduardo Bovolato, reitor da UFT; Maíra Coraci, diretaria de Obtenção de Terras do INCRA Nacional; Jason Maurinho, prefeito municipal de Tabocão; Marco Túlio, superintendente da CONAB no Tocantins; Manoel Leite, presidente da Associação do Assentamento Olga Benário; Antônio Marcos Nunes Bandeira, coordenador estadual do MST; Eldier Passos, superintendente do MDA no Tocantins; professora Vanuza, vereadora representando a Câmara de Vereadores de Tabocão; Jucilene, presidenta da FETAET; Vilela, presidente do PT de Palmas; e Edy César, representante da Secretaria de Patrimônio da União no Tocantins. A presença dessas e de outras autoridades demonstrou o apoio institucional à luta das famílias do Assentamento Olga Benário.

O ato de entrega de contratos marcou não apenas uma conquista jurídica, mas sobretudo a reafirmação do direito à terra, à dignidade e à vida coletiva. A implantação do assentamento Olga Benário representa a força de um projeto construído com resistência e sonhos compartilhados, que agora se enraíza no chão fértil do Tocantins. A cerimônia foi encerrada com um almoço coletivo, nutritivo e recheado de afeto, como é de costume nas atividades do MST, momento de confraternização que celebrou a luta e renovou os laços de solidariedade entre as famílias e os apoiadores da Reforma Agrária Popular.

No entanto, o caminho da conquista ainda não se encerrou. Os desafios permanecem e novas lutas precisam ser enfrentadas para garantir condições dignas de permanência no campo, como moradias adequadas, acesso à água, energia, saúde, educação e estradas em boas condições. O assentamento está criado, mas o horizonte da justiça social continua a ser construído coletivamente, com organização, resistência e esperança.

*Editado por Fernanda Alcântara e Solange Engelmann