Internacionalismo
Forjando um novo caminho pan-africano: Burkina Faso, Ibrahim Traoré, e a terra do povo íntegro
À medida que aumentam as tentativas de golpe contra o governo anti-imperialista de Burkina Faso, o Pan-Africanism Today apela às forças progressistas para que demonstrem solidariedade com as revoluções em todo o Sahel

By Pan Africanism Today Secretariat*
From People’s Dispatch
“Juntos, em solidariedade, vamos derrotar o imperialismo e o neocolonialismo por uma África livre, digna e soberana.” – Capitão Ibrahim Traoré no Dia Internacional em Solidariedade com Ibrahim Traoré e o povo de Burkina Faso, 30 de abril de 2025.
Não é realmente terrorismo, é imperialismo. O objetivo deles é que fiquemos em um estado de guerra permanente para que não possamos nos desenvolver, e eles possam continuar a pilhar os nossos recursos.”
– Capitão Ibrahim Traoré, 10 de maio de 2025
Desde a sua ascensão ao poder em 30 de setembro de 2022, o Capitão Ibrahim Traoré tornou-se um poderoso símbolo do pan-africanismo e um forte contraste com a situação anterior em Burkina Faso. A sua liderança incorpora patriotismo inquestionável, soberania comprometida e uma visão clara para o futuro.
O aparecimento do Capitão Ibrahim Traoré e um estilo de liderança semelhante no Sahel reacendeu a confiança no pan-africanismo e inspirou os jovens em toda a África. Este farol de esperança desencadeou aspirações entre os cidadãos de todo o continente em relação à forma como seus países deveriam ser governados. De fato, devido ao seu compromisso inabalável e patriotismo, o Capitão Ibrahim Traoré tornou-se uma estrela, uma inspiração e uma referência do anti-imperialismo, constituindo uma ameaça genuína ao imperialismo em África. Ele está forjando um novo caminho não só para as nações africanas pós-coloniais, mas para o mundo.
Sob a liderança de Traoré, o governo de Burkina Faso está respondendo ativamente às necessidades do povo em tempo real, demonstrando claramente a sua capacidade de resolver eficazmente os problemas do povo. Para mencionar alguns exemplos: As forças militares francesas foram expulsas, e o movimento de civis Voluntários pela Defesa da Pátria (VDP) agora colabora com o governo e as forças fraternas do Níger e do Mali para combater grupos terroristas, protegendo a nação através dos seus esforços. O governo também nacionalizou reservas de ouro no valor de 80 milhões de dólares, estabeleceu uma refinaria de ouro doméstica e aumentou os salários do setor público.
Sob a liderança de Traoré, o governo de Burkina Faso iniciou um esforço audacioso para a autossuficiência ao lançar uma intensa iniciativa agrícola. Isto aumentou significativamente a produção agrícola e levou a um crescimento consistente do PIB de 4-6%. Estas medidas radicais não só impulsionaram a economia, mas também demonstram com confiança que as necessidades materiais do povo Burkinabê estão sendo atendidas. Em março deste ano, Burkina Faso inaugurou a primeira fábrica estatal de laticínios com a marca Faso Kosam, seguida de mais aberturas e planos adicionais para o aumento da produção doméstica de laticínios.
Estas ações ecoam o projeto político do presidente assassinado de Burkina Faso, Thomas Sankara (1984-87), que fez avanços significativos durante sua liderança anti-imperialista. Tal como Traoré hoje, Sankara insistiu na autossuficiência, na reforma agrária, na proteção ambiental, nos direitos das mulheres, na educação, na saúde e na criação de comissões para defender a revolução. Sankara também ficou muito conhecido por, em 4 de agosto de 1984, renomear o país da Alta Volta, que tinha um nome colonial e pouco criativo, para Burkina Faso – “Terra do Povo Íntegro”.
Tal como Sankara, o governo de Traoré está removendo símbolos coloniais por todo o país. A vestimenta dos juízes e advogados e os uniformes escolares estão sendo mudados para tecidos e estilos produzidos localmente. Embora isto seja algo simbólico, também transmite uma mensagem direta e clara de orgulho patriótico pelo país, por sua cultura, história e patrimônio. Simultaneamente, esta iniciativa defende a produção têxtil local. Como parte da celebração do 36.º ano do assassinato de Sankara em 15 de outubro de 2023, o Boulevard Général Charles de Gaulle em Ouagadougou foi renomeado Boulevard Thomas Sankara. Mais do que um símbolo, esta ação representa um esforço para recuperar a memória coletiva da valorosa história de resistência do povo Burkinabê e reviver o legado de Sankara dentro do imaginário popular do país.
Em muitos aspetos, os passos dados por Sankara e Traoré estão no centro dos objetivos e aspirações que levaram o povo Burkinabê a lutar pela independência do domínio colonial francês. A independência, garantida em 5 de agosto de 1960, nunca foi destinada a ser reduzida a “independência de bandeira”. Embora a adoção de um hino nacional e de uma bandeira tenham sido passos importantes, o povo estava, parafraseando Amílcar Cabral, lutando por coisas concretas; estas coisas concretas estão finalmente encontrando expressão nos esforços do governo de Traoré, seguindo os passos de Sankara.
Ninguém, pelo menos de todos os “povos íntegros de Bukina Faso”, está disposto a tolerar o seu status de décimo terceiro país mais pobre do mundo indefinidamente. A popularidade do governo de Traoré deve, em parte, ser entendida como um produto da intolerância do povo Burkinabê à pobreza e ao trabalho árduo que lhe foi imposto através de décadas de escravidão, colonialismo e neocolonialismo.
Uma breve análise das estatísticas da expectativa de vida e da mortalidade infantil ilustra isto claramente: uma criança nascida em Burkina Faso tem uma probabilidade 16 vezes maior de morrer em seu primeiro ano do que uma criança nascida na França. Se sobreviver, essa criança terá a expectativa de vida cerca de 20 anos mais curta do que sua homóloga francesa.
O legado da pilhagem colonial da França e de outras potências imperiais deixou cicatrizes profundas. Mesmo depois da independência, mecanismos como os acordos de cooperação “Françafrique” perpetuaram a dependência monetária, militar, econômica e política da França.
A desestabilização da Líbia pela OTAN, em 2011, desencadeou uma onda de atividades terroristas em todo o Sahel. A Líbia de Gaddafi servia como um amortecedor para a região e quando caiu a insegurança se espalhou. Apesar do deslocamento de milhares de tropas do antigo presidente francês François Hollande durante a Operação Barkhane, os soldados locais de Mali, Burkina Faso e Níger ficaram frustrados – muitas vezes servindo como carne para canhão – enquanto os civis sofriam assédio tanto de tropas terroristas como de tropas estrangeiras.
Muitos líderes atuais da Aliança dos Estados do Sahel (AES) testemunharam estes abusos em primeira mão. O seu compromisso com a soberania e o desenvolvimento e uma firme rejeição à interferência ocidental – especialmente francesa – decorre dessas experiências.
Burkina Faso promulgou algumas das reformas mais ousadas dentro da Aliança dos Estados do Sahel. As políticas da junta são radicais, e Traoré, um líder jovem e carismático, conta com apoio generalizado através do seu país e da África. Na verdade, ele pode ser o líder africano mais popular desde Thomas Sankara. Da mesma forma, a AES representa um avanço pan-africano significativo – um farol do anti-imperialismo e um impulso renovado pelo socialismo da tradição de Kwame Nkrumah, de Gana. Isto marca a necessidade crucial de solidariedade com a AES, uma vez que incorpora as aspirações partilhadas do povo africano para uma liberdade verdadeira.
Para gerações de revolucionários africanos, a AES não é apenas uma fonte de otimismo, mas um farol de esperança. Nenhum líder da AES declarou o socialismo como um objetivo final; em vez disso, concentraram-se na construção das fundações sociais necessárias. A AES, e Burkina Faso especificamente, sob Traoré, representam o elo mais fraco da cadeia do imperialismo no continente africano, enquanto também encarnam a representação mais forte das aspirações do nosso povo em prol de uma liberdade verdadeira.
Neste contexto, estamos alarmados com o crescente número e sofisticação de tentativas de golpe e de assassinato que contra o governo de Burkina Faso. Mais recentemente, foi descoberto um plano que se originou na Costa do Marfim. Esta conspiração envolveu soldados atuais e ex-soldados trabalhando em coordenação com “líderes terroristas”. Seu objetivo era “espalhar o caos total e colocar o país sob a supervisão de uma organização internacional”. O ataque planejado ao palácio presidencial estava marcado para 16 de abril de 2025. O governo de Ouagadougou interceptou comunicações que revelavam os detalhes do plano e, portanto, conseguiu impedir sua execução.
Estas grandes conquistas dentro de Burkina Faso e a crescente inspiração não somente na Aliança do Sahel, mas em todo o continente, desafiam o status quo do imperialismo e dos governos fantoches em África e em outras partes. Consequentemente, houve inúmeras tentativas de derrubar o Capitão Ibrahim Traore para reduzir a propagação da chama de Traore pelo continente.
Temos de compreender que, apesar de todas as conquistas exemplares e corajosas ações patrióticas, a revolução de Traoré, como as de toda a AES, permanece frágil; é jovem e enfrenta imensos desafios, incluindo a pressão econômica, preocupações contínuas com segurança, e sabotagem das potências imperialistas e seus simpatizantes. O governo e o povo de Burkina Faso operam num ambiente altamente hostil.
Qual deve ser então a postura das forças de esquerda?
- Temos de reconhecer e confrontar as ameaças a Traoré, à AES e a seus líderes. Apesar das muitas contradições (incluindo o fato de ninguém poder prever se estas revoluções continuarão num caminho progressista ou se reverterão em direção a políticas reacionárias), segue claro que um retrocesso aqui poderá atrasar em décadas as perspectivas revolucionárias de África.
- Devemos encorajar o povo da AES – especialmente Burkina Faso – a defender as suas revoluções, uma vez que estas são as revoluções populares lideradas por fações militares progressistas. Não podem ser restringidas por críticas demagógicas liberais ocidentais pela “democracia”. A sua verdadeira medida deve ser a vontade do povo. Enquanto seguirem recebendo o apoio popular, devem seguir.
- Nós, que estamos fora do Sahel (na mãe África e em todo o mundo) devemos declarar a nossa solidariedade inabalável com os governos que continuam a adotar medidas patrióticas para recuperar a soberania política e econômica sobre seus territórios e recursos naturais. Somos encorajados pelas centenas de milhares de pessoas que saíram às ruas para defender Traoré e a AES logo depois da recente tentativa de golpe de Estado, não só em Burkina Faso, mas também em Gana, Quênia, Libéria e mais.
- Devemos usar canetas e ações simples para mostrar nosso apoio sólido às revoluções em Burkina Faso e em toda a AES.
Apesar da vasta propaganda e hesitação entre forças progressistas não-familiarizadas, o sentimento público no Sahel permanece firmemente comprometido com a soberania, segurança e prosperidade. Agora é a hora de atender ao apelo destes governos e dos seus povos: uma simples exigência de não-interferência.
Vamos construir sobre o sentimento do Dia da Libertação de África para nos unirmos com as forças populares e revolucionárias do Sahel na sua luta pela soberania completa, libertação nacional total e o objetivo mais amplo de uma África unificada e livre.
Que a liderança decisiva, a bravura e as ações corajosas demonstradas por Traoré e seus camaradas na AES continuem a nos ensinar lições valiosas.
Viva o patriotismo, o anti-imperialismo e o pan-africanismo.
*A Secretaria do Pan-Africanism Today coordena programas de educação popular, solidariedade internacional e colaboração de pesquisa que visa unificar e fortalecer o trabalho dos sindicatos, movimentos sociais, grupos camponeses e organizações progressistas no continente africano.
**Tradução: Natalie Illanes Nogueira