Educação

Em Alagoas, MST realiza VI Curso Básico de Educação e Agroecologia Nordeste: Turma Aqualtune

Formação com quase uma década de existência se apresenta como um instrumento importante no enfrentamento à crise climática

Foto: Anidayê Angelo

Por Anidayê Angelo
Da Página do MST

Entre os dias 14 e 20 de setembro, educadores, educadoras e militantes Sem Terra vindos de todo o Nordeste se reúnem para vivenciar o VI Curso Básico de Educação e Agroecologia Nordeste: Turma Aqualtune, no Centro de Formação Zumbi dos Palmares, em Atalaia, zona da mata alagoana. São 60 educadores e educadoras das escolas do campo, da EJA, coordenadores(as) pedagógicos(as), militantes da educação, assentados e acampados que, durante uma semana, dedicam-se aos fundamentos teóricos e práticos da agroecologia e da Pedagogia do Movimento, em uma jornada que reafirma a luta pela terra também como luta pelo conhecimento, pela soberania alimentar e pela preservação da vida em todas as suas dimensões.

O Curso de Educação e Agroecologia

Foto: Anidayê Angelo @anidayeangelo / MST em AL

Esse curso nasce da necessidade de formar sujeitos políticos que não apenas dominem técnicas de produção, mas que compreendam a agroecologia como um projeto político de transformação da sociedade. O seu processo de construção iniciou na região Nordeste em 2016, sendo a primeira edição realizada no estado da Bahia (2016), posteriormente na Paraíba (2017), no Ceará (2018), em Pernambuco (2019) e no Rio Grande do Norte (2023).

Desde a origem em 2016, os Cursos Básicos de Educação e Agroecologia assumem uma grande relevância enquanto espaço-tempo de massificação da apropriação dos fundamentos da Reforma Agrária Popular e da agroecologia para continuarmos enfrentando o desafio de construir uma lógica organizativa, didática e pedagógica que propicie o avanço coletivamente na forma de desenvolver metodologicamente a relação entre ensino, trabalho e agroecologia.

Isso porque boa parte das pessoas participantes vem de escolas construídas em áreas de Reforma Agrária, que são frutos concretos da luta do povo Sem Terra. Nessas escolas, a educação não se limita às salas de aula: é uma experiência que se constrói em diálogo com a comunidade, com a terra e com os saberes populares. Assim, o curso é também um reencontro com a própria prática cotidiana desses educadores e educadoras, que carregam a potência de educar em territórios conquistados pela luta.

Foto: Anidayê Angelo @anidayeangelo / MST em AL

O objetivo central desta formação é fortalecer estratégias para enfrentar a crise climática e construir caminhos de defesa do meio ambiente, integrando o Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis à realidade concreta em torno das escolas presentes nos acampamentos e assentamentos do MST. A proposta é ambiciosa e urgente: multiplicar experiências de recuperação ambiental, ampliar o plantio de árvores nativas e frutíferas, e, ao mesmo tempo, garantir a produção de alimentos sem veneno, construindo alternativas ao modelo do agronegócio, que degrada o solo, envenena a água e compromete a saúde do povo. Tudo isso dialogando com as práticas da Pedagogia do Movimento.

A programação do curso foi pensada para articular teoria e prática de maneira contínua. Entre os estudos desta edição, estão a análise da questão agrária no Nordeste, a compreensão do Programa de Reforma Agrária Popular do MST e a retomada da História da Agricultura como campo de disputa entre diferentes projetos de sociedade. Também estão em pauta reflexões sobre a Pedagogia do Movimento e a necessidade de construir uma educação em confluência com a agroecologia, valorizando o vínculo entre prática pedagógica e práxis agroecológica. Outro eixo importante da formação é o estudo da questão ambiental e da construção coletiva do “Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis”.

Esses estudos se entrelaçam com momentos de aprendizado coletivo: produção de mudas de espécies nativas e frutíferas, oficinas de biofertilizantes e visitas de campo que mostram como a agroecologia não é apenas uma teoria, mas o “fazimento” Sem Terra, enraizado no contato com a natureza e com a vida camponesa. Cada prática realizada durante o curso é pensada para ser replicada nos territórios, nos acampamentos e assentamentos do Movimento.

Turma Aqualtune

Foto: Anidayê Angelo @anidayeangelo / MST em AL

A escolha de realizar o curso em Alagoas carrega um profundo simbolismo. O nome que orienta a formação, Aqualtune, evoca a memória de uma mulher africana escravizada que se insurgiu contra o sistema colonial e se tornou liderança fundamental na organização do Quilombo dos Palmares, maior símbolo da resistência negra no Brasil. Ao trazer o nome de Aqualtune para a formação, o curso reafirma a ligação entre a luta pela terra, a luta quilombola e as múltiplas resistências que marcaram a história do povo nordestino. É um gesto de memória e continuidade, que afirma que a luta atual se alimenta da mesma coragem que moveu Aqualtune e os quilombolas de Palmares.

Marcela Nunes, do Setor de Educação do MST em Alagoas, reforça esse sentido histórico e político ao destacar: “Realizar a formação em Alagoas é também reconhecer a força que pulsa neste território. Aqui, onde Aqualtune se fez história, reafirmamos a educação como prática de resistência e a agroecologia como caminho de futuro. Cada árvore plantada e cada saber partilhado é um gesto de compromisso com a transformação social.” Sua fala reflete o lugar onde teoria e prática se encontram: na consciência de que cada ação educativa se transforma em ferramenta de resistência.

Foto: Anidayê Angelo @anidayeangelo / MST em AL

A dimensão estratégica da formação também foi ressaltada por Valter Leite, da Coordenação Nacional do Setor de Educação do MST, ao afirmar: “Seguimos trabalhando para nacionalizar o Curso Básico de Educação e Agroecologia pelas finalidades sociais e formativas que a Reforma Agrária Popular requer, se faz urgente massificar os fundamentos científicos da agroecologia. E a formação continuada de educadoras e educadores é central para se aprofundar conceitualmente, conceber metodologias e levar isso para as suas práticas pedagógicas. Poderíamos dizer que esse curso é um ‘banho de agroecologia’.

Isso tem sido um potencial imenso porque tem propiciado a implementação de arranjos produtivos agroecológicos, como laboratórios vivos para as escolas estudarem os fundamentos da agroecologia, seja através de viveiros, agroflorestas, hortas, hortos medicinais e entre outros cultivos. Esse é um passo no caminho da formação de uma nova geração de camponesas e camponeses que apostam na agroecologia como alternativa para a construção da nossa soberania alimentar, sendo guardiãs e guardiões da biodiversidade e cultivadores de novas relações humanas”, completou Valter.

Ao longo da semana, o VI Curso Básico de Educação e Agroecologia Nordeste: Turma Aqualtune se reafirma como espaço de construção coletiva de saberes, de fortalecimento político. Cada debate, cada prática, cada gesto compartilhado é uma semente lançada em solo fértil. O curso mostra que a agroecologia e a luta pela terra caminham de mãos dadas como instrumentos de emancipação do povo trabalhador do campo e da cidade, capazes de abrir caminhos de enfrentamento ao agronegócio e à crise ambiental.

Expansão da formação

Foto: Anidayê Angelo @anidayeangelo / MST em AL

Considerando os desafios formativos que sejam vinculados às finalidades sociais e educativas do projeto educativo do MST, em 2023 buscou-se nacionalizar o Curso Básico de Educação e Agroecologia, expandindo sua realização para além da Região Nordeste, sendo realizado também na Região Sul e Região Amazônica. Nesse sentido, o setor de educação do MST, ainda no presente ano de 2025, pretende realizar na Região Sul e na Região Sudeste, no mês de novembro, novas edições.

Levando em conta que a importância do curso está no fortalecimento e reafirmação das raízes da Educação do Campo e o seu papel político, ético, organizativo e pedagógico na atualidade, a formação continuada dos educadores e educadoras se faz imprescindível para alcançar esse objetivo.

Além disso, ainda no âmbito da expansão da formação da agroecologia, Valter ressaltou também o novo Pronacampo (Política Nacional de Educação do Campo, das Águas e das Florestas), uma conquista de anos de lutas dos movimentos sociais e sindicais do campo junto ao governo federal, com relação ao acesso à educação para os povos do campo, das águas e florestas. A política, lançada no mês de julho de 2025, garantiu um eixo nomeado “Ação Climática e Agroecologia”, apresentando-se como um avanço no apoio institucional do governo brasileiro para o enraizamento da agroecologia em todo o país.

Foto: Anidayê Angelo @anidayeangelo / MST em AL

*Editado por Fernanda Alcântara