Cultura

Diretora de Terra para Rose participa de atividades dos 40 anos da ocupação da Fazenda Annoni

Tetê Moraes vem a Porto Alegre para exibição de Terra para Rose e debate nesta quarta (22), às 19h30, no CineBancários

Cineasta Tetê Moraes apresenta seus premiados filmes Terra para Rose e O Sonho de Rose no CineBancários, em Porto Alegre. Foto: George Malagaia

Do Brasil de Fato

A cineasta Tetê Moraes, diretora dos premiados filmes Terra para Rose e O Sonho de Rose, volta ao RS para as comemorações da ocupação da Fazenda Annoni, 40 anos depois. Haverá exibições dos filmes no CineBancários, numa parceria do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), com o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região (SindBancários) e o Brasil de Fato RS na mostra Cinema da Terra – 40 anos da Ocupação da Fazenda Annoni.

Abrindo a atividade, na quarta-feira (22), às 19h30, o CineBancários faz uma exibição especial de Terra para Rose, documentário que mostra a luta por terra e pela reforma agrária no Brasil da Nova República. No debate após o filme, além de Tetê, estarão presentes o fotógrafo Cezar Moraes, a diretora gaúcha Tatiana Sager e Marcos Tiaraju, filho de Roseli Nunes. A entrada é gratuita, com retirada de senhas na bilheteria (50% da capacidade da sala antecipada e 50% na hora).

Nos dias 23 e 24, às 15h, o cinema da Casa dos Bancários exibe os outros filmes que compõem a chamada Trilogia da Terra, Sonho de Rose e O Fruto da Terra.

Tetê Moraes também fará gravações com os personagens dos filmes anteriores, durante o evento na Fazenda Annoni, nos dias 24 e 25, com o objetivo de produzir um novo documentário.

Quem é Tetê Moraes?

Jornalista, cineasta, roteirista e produtora, Tetê Moraes nasceu no Rio de Janeiro. Formada em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1966, ela iniciou sua carreira profissional como diagramadora no jornal O Sol, que depois foi tema de um dos seus documentários, e integrou o Ministério das Relações Exteriores.

Após o decreto do AI-5, Moraes foi presa durante a ditadura militar e exilou-se no Chile, Estados Unidos, Portugal e França. Fez mestrado de Comunicação Social na American University. Retornou ao Brasil, em 1979, devido a um processo instaurado de anistia para exilados políticos. Tornou-se, então, professora de Comunicação Social na Universidade PUC/RJ. Foi membro do Conselho Superior de Cinema e faz parte de entidades como Associação Brasileira de Cineastas (Abraci) e Diretores Brasileiros de Cinema e Audiovisual (DBCA).

A consagração como cineasta chega com o lançamento de Terra para Rose (1987), um dos mais importantes documentários da História do cinema brasileiro. Com narração da atriz Lucélia Santos, o filme apresenta a luta pela reforma agrária.

Segundo Moraes, o projeto começou quando pesquisava para um longa sobre mulheres e a questão agrária. “Foi quando me deparei com um imenso acampamento de ocupantes na Fazenda Annoni, no Rio Grande do Sul. Nesse local, conheci e me encantei pela combativa lavradora Roseli Seleste Nunes da Silva e decidi registrar o contexto de sua luta e martírio.” Em meio às gravações, acontece o atropelamento de Rose durante uma manifestação em prol da luta pela terra. Apesar do final trágico, o documentário não trata sobre Rose e sim sobre a luta pela reforma agrária no país. 

Roseli Seleste Nunes da Silva e seu filho Marcos Tiaraju em marcha a Porto Alegre – Foto: Divulgação MST

Em Terra para Rose, Tetê Moraes acompanha a ocupação da Fazenda Annoni, a marcha dos trabalhadores sem-terra até a cidade de Porto Alegre, o acampamento na Assembleia Legislativa gaúcha e a volta para a Annoni.

A obra foi vencedora do Festival de Brasília e Havana. Dez anos depois, Moraes retoma as personagens e a questão agrária em O Sonho de Rose (2000): apresenta experiências bem-sucedidas de assentamento e progresso a partir do MST.

O Sonho de Rose ganhou, entre outros, os prêmios de Melhor Documentário pelo júri popular no Festival do Rio BR; Melhor Documentário pelo júri popular na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo; e Prêmio documentário Memória do Centro Cultural Pablo de La Torriente Brau no Festival del Nuevo Cine Latinoamericano, Havana.

Integra ainda a Trilogia da Terra, o curta-metragem O Fruto da Terra, sobre o primeiro bebê nascido na Fazenda Annoni, o filho de Rose, o hoje médico Marcos Tiaraju. Rose morreu pouco tempo após dar à luz ao pequeno Marcos, então com apenas um ano e quatro meses de idade.

Em uma de suas falas, a ativista pede que sua luta não seja em vão. Rose não viu, mas sua batalha culminou com a conquista da terra e de novas oportunidades de vida. Com 22 anos, em 2008, Marcos ganhou uma bolsa estudos para uma faculdade de Medicina, em Cuba. Mais de duas décadas após o início dessa história, a cineasta relata uma trajetória de superação de desigualdades e injustiças, marginalização e miséria.

Exposição fotográfica

Ainda no dia 22, às 19h, será aberta a Exposição de fotos da ocupação da Fazenda Annoni e de Encruzilhada Natalino do artista plástico e fotógrafo Eduardo Vieira da Cunha, na época fazendo a cobertura pela sucursal Sul de O Globo.

Eduardo lembra que no início dos anos 1980, o chefe de redação, jornalista Felix Valente, lhe chamou para uma missão importante. “Na verdade, eu não tinha a mínima ideia do que seria, nem avaliava a importância histórica do acontecimento.”

Segundo ele, era uma época da organização de grupos de colonos sem-terra, que realizavam ocupações na região norte do estado, como em Encruzilhada Natalino e posteriormente na Fazenda Annoni, próxima ao município de Sarandi. “O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ainda não existia como organização. Fui deslocado para a cobertura de um evento cuja informação nos chegou através de fontes confiáveis. Eu só sabia que deveria me preparar para um tipo de cobertura difícil, com nenhum apoio.”

O jornalista Félix Valente conta que participou do movimento estudantil e depois da resistência à ditadura militar, em organização clandestina. “Eu tinha formação política e convicção ideológica. No Rio de Janeiro, a sucursal gaúcha do Globo era chamada de sucursal vermelha. E foi desativada alguns anos depois. Fomos todos demitidos depois que me neguei a informar a fonte que nos avisou da ocupação da Annoni, o que permitiu acompanhar toda operação”, recorda.

Editado por: Katia Marko