Inclusão tecnológica

Conheça a IARAA: Inteligência Artificial da Reforma Agrária e Agroecologia

Abrindo um novo front de organização e luta para os movimentos populares, oficina de desenvolvimento ocorreu na última segunda (03) e terça (04), na ENFF, em São Paulo

Foto: Arquivo MST

Da Página do MST

O projeto Inteligência Artificial da Reforma Agrária e Agroecologia (IARAA) é uma iniciativa voltada para o desenvolvimento de uma ferramenta de Inteligência Artificial (IA), com a intenção de fortalecer o processo de massificação da agroecologia. Coordenado pelo MST e pela Marcha Mundial das Mulheres, e impulsionado pela Associação Internacional para Cooperação Popular (Baobab), o projeto nasce com um caráter internacional que prevê o desenvolvimento conjunto com organizações populares de mais países.

A primeira etapa presencial das oficinas de desenvolvimento do projeto, que reuniu dez profissionais da agroecologia de todas as regiões do país, juntamente com a equipe técnica do projeto, aconteceu nos dias 3 e 4 de novembro de 2025, na Escola Nacional Florestan Fernandes.

A IARAA começa a germinar no Curso de Inteligência Artificial para Movimentos Populares do Sul Global, que aconteceu em Shanghai, em julho deste ano. Naquele momento, além de se apropriar de forma crítica e tecnicamente das tecnologias envolvidas na IA, militantes desses movimentos e de outras organizações do mundo tiveram contato com outro modelo de desenvolvimento tecnológico: o modelo chinês, de desenvolvimento socialista, orientado por um projeto econômico e político de prosperidade comum para seu povo. Este modelo é diferente do padrão das Big Techs, com o qual travamos os primeiros contatos.

Para a classe trabalhadora do Sul Global, o impacto perverso da Inteligência Artificial chega primeiro. Ele se manifesta nas bombas que caem sobre Gaza, dirigidas por sistemas como a IA israelense Lavender, no racismo das IAs de reconhecimento facial, usados pela segurança pública ou no monitoramento invasivo de salas de aula.

Durante os dias de formação e trabalho na Escola, o coletivo trabalhou na construção dos fundamentos da base de conhecimento que irá alimentar a IARAA. Diferente dos grandes modelos de IA que se apropriam e se beneficiam privadamente do conhecimento produzido pela humanidade, o projeto IARAA, por princípio, reconhece e exalta a dimensão e o esforço coletivo da produção desse saber, gerado por instituições de pesquisa, universidades, movimentos, coletivos e pelos povos do campo, da floresta, das águas e de comunidades tradicionais.

O grupo também trabalhou no desenvolvimento das instruções, que irão orientar e garantir o rigor conceitual, científico, técnico da agroecologia, assim como o caráter produtivo, organizativo e de luta nas respostas da IARAA. A proposta é que esta seja uma ferramenta de IA diferente do que é oferecido pelo mercado e que não se encerre em uma interação individual e passiva com quem a utilizar, mas que tenha condições de potencializas as organizações dos movimentos populares, suas lutas e produção de conhecimento no caminho da agroecologia.

Projeções da AI no mundo do trabalho

O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que a IA deve eliminar 92 milhões de postos de trabalho nos próximos anos. No entanto, não há sinais de um plano efetivo para lidar com o impacto social que este cenário impõe.

Estes são alguns exemplos dos problemas herdados dos processos neoliberais: desindustrialização e crônica falta de investimento em infraestrutura digital e na formação de mão de obra qualificada. Consequentemente, os impactos da Inteligência Artificial nos países que não estão à frente de seu desenvolvimento têm sido o aprofundamento das desigualdades digitais e da dependência tecnológica.

Cenário que se reflete hoje na disparidade de acesso a essas tecnologias e à conectividade, ainda deficiente, especialmente nas áreas rurais. O que agrava o desafio crítico da falta de controle sobre dados estratégicos e sensíveis dos nossos povos, territórios e produção de conhecimento, hoje hospedados em processados nas nuvens de grandes corporações privadas, como a Microsoft e Amazon, por exemplo. 

Essa dinâmica também está presente no campo. Empresas transnacionais como John Deere, Basf e Microsoft implantam sistemas de internet das coisas e Inteligência Artificial em parceria com o agronegócio. É o aprofundamento da concentração fundiária, que permite a captura de dados de centenas de milhares de hectares pelas big techs. Ao mesmo tempo, os chatbots para agricultura se espalham, prometendo soluções milagrosas quando, na realidade, o objetivo é simplificar e homogeneizar o conhecimento das famílias agricultores e de técnicos/as agropecuários/as.

Neste contexto, por meio do projeto IARAA, os movimentos populares se posicionam, construindo uma ferramenta de IA para potencializar a democratização do acesso a conhecimentos e saberes agroecológicos, populares e tradicionais. Ocupam e dão um caráter popular a um espaço ainda de acesso restrito: o do desenvolvimento de tecnologias digitais.

A agroecologia tem sido construída pelos movimentos populares diante de uma perspectiva estratégica de projeto político e no enfrentamento à crise ambiental e ao modelo insustentável, imposto pelo agronegócio. Socializar esse acúmulo é uma das tarefas fundamentais para a massificação da agroecologia, a qual se conecta à organização produtiva das cooperativas, agroindústrias, associações e da comercialização, fortalecendo a atual forma de fazer a luta pela terra.