BRICS

Cúpula Popular dos BRICS inicia no Rio com chamado por união entre os povos

Encontro da sociedade civil debate soberania, economia e integração dos povos

Foto: Priscila Ramos

Por Fernanda Alcântara
Da Página do MST

Representantes de movimentos populares, especialistas e autoridades de 21 países deram início, nesta segunda-feira (1º), à Cúpula Popular dos BRICS, um contraponto popular e propositivo ao bloco. O evento, que segue até quinta-feira (4), no Rio de Janeiro, nasce com o objetivo de unir os povos na construção de um mundo internacionalista, livre do imperialismo e da dominação financeira.

A solenidade de abertura contou com a fala de representantes de movimentos populares de todo o mundo, centrais para a articulação do bloco. Coordenada por Marco Fernandes e Judite Santos, ambos do Conselho Civil do BRICS e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a mesa contou com José Reinaldo Carvalho, Presidente Nacional do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (CEBRAPAZ), que ressaltou o papel fundamental do BRICS para o Sul Global e como “este encontro fraterno reafirma a vitalidade das organizações que dão vida à luta de nossos povos.”

“Nada prosperará sem a inclusão de trabalhadores, mulheres, jovens, povos indígenas e todas as realidades que compõem o Sul Global. A determinação e a soberania deste mundo globalizado em que vivemos são primordiais. A multipolaridade já é uma realidade incontornável; os povos não tolerarão mais novas formas de dominação”, afirmou.

Foto: Priscila Ramos

A escolha do Rio de Janeiro para sediar a cúpula dos BRICS foi destaque por Elias Jabour, presidente do Instituto Pereira Passos (IPP), que também representou a Prefeitura do Rio de Janeiro e patrocinadora da Reunião do BRICS. Jabour abordou sobre o papel do bloco em questões complexas, como a crise venezuelana e a emergência climática, temas que demandam respostas coletivas e pressão por uma institucionalização mais sólida e duradoura dentro do grupo.

A estrutura atual de demandas internacionais precisa ser reforçada, pois é o principal instrumento que temos para os avanços. Nesse contexto, o BRICS é um fórum potencialmente único para gerar respostas a desafios que envolvem nossa própria existência, como a soberania dos países e a crise climática”,

Elias Jabour, presidente do Instituto Pereira Passos (IPP)

A vereadora Maíra do MST (PT-RJ) iniciou sua fala destacando o simbolismo do local da reunião, o Armazém da Utopia, construído em um porto que recebeu dois milhões de africanos escravizados. Ela defendeu a importância de pensar eixos como juventude e questões climáticas de forma interligada. Em seguida, a deputada estadual Marina do MST (PT-RJ) ressaltou que o BRICS tem o desafio de encontrar saídas para combater todas as desigualdades em meio à crise global. “Esta crise traz consequência para todos os povos”, afirmou, citando o Papa Francisco: “precisamos pensar nos três Ts (Terra, Teto e Trabalho) para todos, e para isso, precisamos consolidar a cooperação entre os povos”.

Jandira Feghali, deputada federal (PCdoB-RJ), lembrou a importância da mística de abertura, que teve a apresentação do coral das mulheres Guajajara, da aldeia Maracanã, e marcou que esta foi uma afirmação da soberania e da identidade nacional e a importância da cultura entre os povos. Em seu discurso, a parlamentar argumentou que, embora cada povo deva preservar sua autonomia, cultura e visão de mundo, os objetivos globais comuns podem nos unir. A deputada federal ainda demonstrou preocupação com a ameaça à autonomia da Venezuela, onde vemos “um precedente gravíssimo para os povos deste continente”.

Da mesma forma, eu não quero apenas me solidarizar com o povo palestino, mas com suas mulheres e crianças, que têm uma tragédia em mãos, tendo que queimar a madeira das suas casas destruídas para fazer aquecimento para os seus filhos. Sinceramente, eu acho que deve ser resolvido. É preciso quebrar o silêncio que existe, porque não é possível que a gente não radicalize uma posição.

Jandira Feghali, deputada federal (PCdoB-RJ)

Ao abordar os desafios contemporâneos, Feghali situou o combate político dentro de uma disputa cultural mundial que perpassa a defesa da natureza, a agricultura e o domínio das novas tecnologias, como a inteligência artificial e as grandes plataformas, em que o objetivo final é alcançar uma “ética superior” que garanta a felicidade, a igualdade e o fim da fome, transformando utopias em caminhos possíveis.

Em mensagem transmitida por vídeo, Dilma Rousseff, presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), uma instituição multilateral de desenvolvimento fundada pelos países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) em 2014, reafirmou o papel da instituição como um pilar para um sistema financeiro alternativo. Confira o discurso abaixo:

Discurso de Dilma Rousseff, para Cúpula Popular dos BRICS, Rio de Janeiro. Imagem: Reprodução

Em sua fala, Victoria Panova, Diretora do Conselho de Especialistas BRICS/Rússia; Vice-Reitora da Universidade de Estudos Superiores de Economia e Sherpa da Rússia no W20, defendeu que os benefícios de qualquer iniciativa devem alcançar toda a comunidade, e não apenas uma pequena parcela. “Cada um de nós é responsável porque fazemos parte disso e traremos o melhor do mundo”, concluiu.

Por fim, João Pedro Stedile, da direção nacional do MST, iniciou sua fala saudando as delegações internacionais e destacou a escolha simbólica do Rio de Janeiro para sediar o evento, enfatizando que a realização do encontro só foi possível graças à vontade política do presidente Lula e ao apoio do Itamaraty, afirmando que a iniciativa representa um processo de construção que exigirá paciência e cooperação entre os movimentos populares e a sociedade civil organizada.

Foto: Priscila Ramos

Em sua análise, Stedile criticou as agressões imperialistas, apontando a política econômica dos Estados Unidos e a hegemonia do dólar como os principais instrumentos de exploração da classe trabalhadora mundial. Ele argumentou que essa estrutura força os trabalhadores de outros países a subsidiarem o déficit fiscal norte-americano, configurando uma exploração que perpetua condições injustas, sem que as riquezas geradas pelas exportações retornem em benefício para seus povos de origem.

É inaceitável que os recursos para a cooperação internacional sejam controlados exclusivamente pelos ministros das finanças. Queremos ter voz para que projetos de interesse público também possam acessar os fundos do BRICS, porque sem recursos, será muito difícil concretizar as boas ideias de cooperação que todos compartilhamos”,

João Pedro Stedile, do MST.

Por fim, o dirigente do MST defendeu a urgência em os movimentos populares formularem propostas concretas e pressionarem por acesso a recursos, para que projetos de cooperativas e empresas sociais possam sair do papel. E reforçou que, sem a participação ativa das organizações populares nas decisões, os interesses do capital e do imperialismo continuarão a dominar a agenda internacional, impedindo soluções efetivas para crises globais como a fome e as guerras. E finalizou sua fala com um chamado para que o conselho em formação atue como um marco e uma voz firme da sociedade civil perante os governos: “somente o BRICS pode oferecer soluções para impedir que as soberanias sejam violadas”.

*Editado por Solange Engelmann