Trabalho Coletivo

Mutirão de esperança: um mês de Brigada de Solidariedade após os tornados no Paraná

Três tornados atingiram o estado no dia 7 de novembro. Confira o resumo do que aconteceu ao longo deste mês de muito trabalho e reconstrução

Em meio à dor e ao medo trazidos pelos tornados, a solidariedade moveu milhares de pessoas, organizações, órgãos públicos e movimentos. Foto: Antônio Santos

Por Setor de Comunicação e Cultura do MST-PR
Da Página do MST

Rio Bonito do Iguaçu (PR): Há um mês, vivemos um dia que vai ficar marcado na memória de nós paranaenses. Na tarde abafada e de muito calor do dia 7 de novembro, três tornados atravessaram 11 municípios do Paraná e deixaram um rastro de destruição. 

Em Rio Bonito do Iguaçu e Guarapuava, na região Centro-Sul do estado, os ventos ultrapassaram os 400 quilômetros por hora, levando a vida de sete pessoas, deixando centenas feridas, arrancando casas, árvores e espaços públicos. 

Entre as dezenas de famílias atingidas, mais de 400 vivem em áreas da Reforma Agrária, e viram lavouras, casas e espaços coletivos serem destruídos em menos de um minuto. 

Nada disso aconteceu ao acaso. A violência desses tornados trouxe para mais perto de nós a realidade enfrentada por cada vez mais pessoas, vítimas de uma diversidade de catástrofes ambientais, mais e mais frequentes. Elas são resultado do agronegócio destruidor e do sistema capitalista que coloca o lucro acima de tudo. 

Em meio à dor e ao medo trazidos pelos tornados, a solidariedade moveu milhares de pessoas, organizações, órgãos públicos e movimentos. Mais uma vez, sentimos que a humanidade e a empatia pelo próximo podem superar o egoísmo e o individualismo. 

Desde aquela noite, começamos a nos organizar enquanto militância Sem Terra do Paraná para somar, com as nossas forças, em diferentes frentes de trabalho. Mais de 800 companheiras e companheiros, de acampamentos e assentamentos, cruzaram estradas por todo o Paraná, deixaram suas rotinas, suas roças, pegaram ferramentas, panelas e coragem para construir um grande mutirão de solidariedade nas áreas afetadas.

A solidariedade do povo para o povo é um valor para o MST. Neste último mês, temos vivenciado esse valor no dia a dia, aprendido e nos humanizado ainda mais com ele. Abaixo, dividimos com você leitora e leitor o vivido até hoje.

O que aconteceu no último dia 7 de novembro?

Após um dia muito quente e abafado, o final da tarde daquela sexta-feira foi de tempestade e muitos raios. Três tornados atingiram os municípios de Rio Bonito do Iguaçu, Turvo, Guarapuava, Quedas do Iguaçu, Espigão Alto do Iguaçu, Nova Laranjeiras, Porto Barreiro, Laranjeiras do Sul, Virmond, Cantagalo e Candói. Ao todo, foram 11 municípios que registraram destruições por conta da força do vento e da chuva!

Rio Bonito do Iguaçu e Guarapuava foram os municípios com os tornados mais violentos, classificados como F4 na escala Fujita, com ventos registrados entre 332 km/h e 418 km/h. Cerca de 90% da área urbana de Rio Bonito do  Iguaçu sofreu algum tipo de dano. 

Ao todo, 11 municípios foram afetados pelos três tornados. Rio Bonito do Iguaçu e Guarapuava os ventos chegaram a 418 km/h. Foto: Diangela Menegazzi

Tragédia climática histórica no Paraná

As pessoas que passaram aquele terror tem as imagens registradas na memória. E a data também vai ficar marcada na história do nosso estado, como um dos maiores e mais severos tornados registrados nas últimas três décadas. Foram 7 vítimas fatais, mais de 800 pessoas feridas, 1000 pessoas desalojadas e milhares de casas, estruturas, postes e árvores danificadas ou destruídas. 

Mário Ribeiro, do acampamento Antônio Conrado, em Rio Bonito do Iguaçu (PR), viveu momentos de pânico. As duas casas do lote, dele e da esposa e da sogra, ficaram completamente destruídas. Foto: Diangela Menegazzi

Comunidades da Reforma Agrária atingidas

Mais de 440 famílias acampadas e assentadas da Reforma Agrária também tiveram danos nas moradias, espaços coletivos e estruturas de produção, lavouras e matas. Em Guarapuava, o assentamento Nova Geração foi fortemente atingido, com dezenas de pessoas desalojadas e uma vítima fatal, o nosso companheiro José Neri Geremias. 

Assentamento Nova Geração, em Guarapuava, teve quatro casas completamente destruídas e mais de 20 com danos nos telhados e estruturas. O barracão comunitário, e duas igrejas ficaram totalmente destruídas. Fotos: Mirian Kunrath

Afinal, o que é um tornado?

Ele surge a partir do encontro entre ventos quentes e úmidos vindos do Norte do Brasil e ventos frios da massa polar que vêm do Sul. Esse choque gera movimentos giratórios dentro das nuvens, de onde surgem funis que podem tocar o solo. Isso acontece principalmente em pontos de menor pressão atmosférica, mais quentes – por isso mais avassaladores nas áreas urbanas e com maior presença de concreto e menos árvores. 

Imagem aérea em Rio Bonito do Iguaçu. Crédito: Thiarles França

O que isso tem a ver com a crise ambiental? 

O sistema capitalista funciona com base na destruição da natureza. As consequências têm sido gravíssimas, entre elas o aquecimento global: 2024 foi o ano mais quente da história, e 2025 caminha para bater esse recorde.

Com mais calor e umidade no ar, surgem condições ideais para formações violentas. As mudanças na circulação dos ventos também favorecem eventos extremos. 

Moradias destruídas no assentamento Ireno Alves, em Rio Bonito do Iguaçu. Foto: Thiarles França

Como mudar isso? 

Agroecologia é o caminho! É com a democratização da terra e dos recursos naturais, preservação de bens como água e biodiversidade, produção de alimentos saudáveis e com plantio massivo de árvores. Isso também significa enfrentar o modelo do agronegócio no campo, e a lógica do lucro acima da natureza e da vida. 

Mutirão de plantio de árvores no acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio, em Rio Bonito do Iguaçu, em 22 de outubro deste ano. Foto: Juliana Barbosa

Diante da catástrofe, a solidariedade coletiva! 

Os tornados que atingiram o Paraná trouxeram muita destruição e dor. Mas, na mesma noite do dia 7, um grande mutirão de solidariedade teve início. A militância do MST se somou aos órgãos públicos e outros coletivos, trazendo a organização popular e massiva como forma de atuar. Mais de 800 militantes já passaram pela Brigada de Solidariedade do MST, vindos de acampamentos e assentamentos de todo o Paraná e de outros estados. 

A primeira ação começou com panelas grandes, fogão, utensílios e alimentos, em que um grupo de militantes do MST de comunidades da região iniciaram a organização da primeira cozinha solidária, no Centro da Melhor Idade de Rio Bonito do Iguaçu. Uma cozinha também foi iniciada na comunidade Nova Geração, em Guarapuava, e outra no assentamento 8 de Junho, em Laranjeiras do Sul. Mais de 45 mil refeições/marmitas foram produzidas e entregues para população atingida até agora.

Cozinha comunitária no assentamento 8 de Junho, em Laranjeiras do Sul. Foto: Juliana Barbosa

Mãos que lidam na terra e também reconstroem casas

Os mutirões para cobertura e reconstrução de casas e espaços coletivos iniciaram no dia 9, dois dias após a catástrofe. A experiência popular na construção civil e na carpintaria ajudou as mãos calejadas do trabalho na roça a cobrir e reerguer muitas moradas. Até agora, cerca de 100 casas, escolas do campo e barracões foram restaurados, na área urbana e nas comunidades da Reforma Agrária. E ainda há muito trabalho a fazer. 

Nas comunidades da Reforma Agrária, o mutirão de reconstrução tem sido feito pelos próprios moradores, vizinhos e também com reforço da Brigada de Solidariedade. Além da cobertura de casas, as ações prioritárias foram em espaços comunitários como escolas e cooperativas. 

Na área urbana de Rio Bonito do Iguaçu, além de cobrir e reconstruir casas, a principal demanda tem sido a de limpeza de ruas e terrenos. Com pás, carrinhos de mão e muito trabalho e disposição, a companheirada tem se dedicado a recolher entulhos formados pela destruição do tornado. É um trabalho exigente e muito importante para ver a cidade novamente organizada. 

Saúde Popular: cuidado como resistência

O setor de Saúde do MST também se junta à Brigada de Solidariedade com o Espaço da Saúde Popular Luiza Aparecida, no assentamento 8 de Junho, em Laranjeiras do Sul, e no Nova Geração, em Guarapuava. Nos primeiros dias após o tornado, os esforços foram especialmente para atender a militância que está contribuindo na Brigada. Depois, a ação se ampliou para o apoio às famílias atingidas nas áreas rurais e urbanas. As ações ocorrem em conjunto com a Força Nacional SUS, a FOR-SUAS e a Fiocruz. 

Nos primeiros dias após o tornado, os esforços foram especialmente para atender a militância que está contribuindo na Brigada. Foto: Marcos Bueno e Foto: Antônio Santos 

Retomadas das atividades educativas para crianças

O CMEI Dona Laura, de Rio Bonito do Iguaçu, foi bastante atingido pelo tornado. As atividades retomaram no dia 18, depois de muito trabalho de reconstrução. A Brigada de Solidariedade do MST contribuiu com o mutirão de limpeza e reorganização do espaço, e também na cozinha e com práticas integrativas de saúde. O Setor de Educação do Movimento também somou nas atividades práticas com crianças de 6 meses a 5 anos.

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Fotos: Juliana Barbosa 

Muralismo da Juventude Sem Terra 

Entre os escombros também rebrotam flores: depois dos trabalhos urgentes de reconstrução, limpeza e garantia de comida, a ação da Brigada de Solidariedade começou a revolver a falta das cores nos muros da cidade de Rio Bonito do Iguaçu. A Juventude Sem Terra está organizando uma frente de muralismo: é uma técnica de pintura em muros e paredes, que pode ser feita a muitas mãos! 

A Juventude Sem Terra está organizando uma frente de muralismo com as famílias afetadas. Foto: Antônio Santos 

E a luta também se torna poesia… 

“Aqui se habita sonhos

Sobre os nossos pés sentimos a terra 
Sobre nossas cabeças há um céu de sonhos 
Pois não somos um povo que só habita a terra 
Pois aqui não há tempo para o pessimismo
Pois a lágrima e o suor tem o mesmo sabor
Mais  tem o peso de valores diferentes 

Suor movimento do nosso corpo 
sour movimento tempo 

Como o Sol movimenta o dia 
Tipo solidariedade leva Sol brilhar novamente 
Pois a solidariedade não se faz só  
Se faz com o povo para povo 

A vida não é só servidão 
por isso cantaremos

Conjugaremos verbos de fartura e ternura 
Construiremos barricadas de resistência de sonhos.

O sonho não é terminado 
Como sujeito formado pelo tempo caminhamos sobre a terra.”

(Roan Teixeira, militante do Coletivo Palavras Rebeldes MST-PR) 

Foto: Juliana Barbosa

Contribua e faça parte desse mutirão!
Os trabalhos seguem intensos até o dia 19 de dezembro. Você pode ajudar a garantir o deslocamento das brigadas que vêm de outras regiões do Paraná:

Conta para doações:

Razão Social: Associação Marmitas da Terra

CNPJ: 55.025.405/0001-76

Banco: Crehnor Laranjeiras – 350

Agência: 3001

Conta Corrente: 33506-1

Chave Pix: [email protected] 

*Editado por Solange Engelmann