Construção Coletiva

Três décadas de cooperativismo fortalecem a agricultura familiar em Nova Santa Rita (RS)

A Cootap celebra 30 anos com festa na Comunidade São Francisco, no assentamento Capela

Famílias assentadas e lideranças celebram os 30 anos da Cootap no Assentamento Capela, em Nova Santa Rita. Foto: Katia Marko

Por Marcela Brandes | Nova Santa Rita (RS)
Do Brasil de Fato

No último domingo (14), a Comunidade São Francisco, no assentamento Capela, em Nova Santa Rita, Rio Grande do Sul foi palco de um encontro marcante: a celebração dos 30 anos de fundação da Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre Ltda (Cootap).

Formada a partir da união de agricultores familiares e assentados da Reforma Agrária, a cooperativa surgiu em 1994 como uma resposta coletiva para fortalecer a produção agrícola, a permanência no campo e a geração de renda. Ao longo de três décadas, consolidou-se como referência regional na produção e comercialização de alimentos, em especial no desenvolvimento de cadeias produtivas sustentáveis e atividades agroecológicas.

Cooperativa de agricultores assentados celebra 30 anos de organização coletiva no campo. Foto: Katia Marko

A Cootap, composta por famílias assentadas, atua em microrregiões incluindo Eldorado do Sul, Nova Santa Rita, Viamão e outras, conectando produção e comercialização de arroz orgânico, leite, hortaliças e serviços de apoio à agricultura familiar. Segundo registros oficiais do setor agropecuário, a cooperativa hoje envolve centenas de famílias e produz, anualmente, cerca de 300 mil sacas de arroz livre de veneno, com produtos certificados e modelos de produção baseados na agroecologia.

Desafios e visões a partir dos atores

Durante a homenagem, representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao qual a cooperativa está historicamente ligada, refletiram sobre o significado da trajetória da Cootap. Maurício Roman, integrante da direção nacional do MST no Rio Grande do Sul, ressaltou a importância da decisão coletiva na construção da cooperativa. “Essa ferramenta que completa 30 anos é uma síntese da nossa organização: ela vai da terra, do plantio à colheita, à materialização e à comercialização.” Roman destacou ainda que as decisões coletivas garantem clareza política e avanços concretos, como a consolidação de cadeias produtivas e conquistas de terra para agricultura.

Maurício Roman, integrante da direção nacional do MST no Rio Grande do Sul, ressaltou a importância da decisão coletiva na construção da cooperativa. Foto: Katia Marko

Por sua vez, Revilino Ernesto Fornazieri, que foi o primeiro presidente da Cootap, em 1995, enfatizou a importância das políticas públicas e do apoio institucional para o desenvolvimento da agricultura familiar. “A gente sabe que as políticas públicas têm um papel importante, fundamental para que a gente consiga se desenvolver. A política pública é fundamental para dar sequência na atual conjuntura que está colocada para a agricultura”, afirmou. Fornazieri também destacou o orgulho pela trajetória da cooperativa, mesmo diante das dificuldades enfrentadas ao longo dos anos.

Revilino Ernesto Fornazieri, que foi o primeiro presidente da Cootap, em 1995, enfatizou a importância das políticas públicas e do apoio institucional para o desenvolvimento da agricultura familiar. Foto: Katia Marko

Políticas públicas, mercados e sustentabilidade

Desde sua criação, a cooperativa tem navegado pela complexa interação entre políticas públicas, mercado e práticas de produção sustentável. A produção de arroz orgânico – que começou de forma experimental no fim da década de 1990 – transformou-se em uma das principais atividades econômicas da Cootap, desafiando a hegemonia do modelo convencional de produção agrícola e valorizando a autonomia das famílias envolvidas.

O fortalecimento dessa cadeia produtiva tem sido considerado, por parceiros como o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), um elemento importante para a agroecologia no estado, marcando a presença de assentados em processos coletivos de produção e agregação de valor.

Em eventos recentes do setor, a cooperativa foi destacada como parceira em iniciativas que buscam ampliar o uso de arroz agroecológico, promovendo tanto a saúde ambiental quanto melhores condições de renda para as famílias envolvidas.

Cootap prestou uma homenagem a Pedro Munhoz que ajudou na produção da música de 30 anos. Foto: Katia Marko

Reconhecimento político e institucional

A celebração dos 30 anos contou com a presença de autoridades e lideranças políticas, reforçando a articulação da Cootap com diferentes esferas de governo. Estiveram presentes o prefeito de Nova Santa Rita, Rodrigo Battistella, os vereadores Andrea Margarete Fochezatto (PT) e Emerson Giacomelli (PT), o deputado estadual Adão Pretto Filho (PT) e o deputado federal Dionilso Marcon (PT/RS), o superintendente do Instituto Nacional da Reforma Agrária (Incra/RS), Nelson Grasselli, e o secretário de Abastecimento, Cooperativismo e Soberania Alimentar do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Milton José Fornazieri.

Para o prefeito Rodrigo Battistella, a cooperativa simboliza os valores da agricultura familiar no município, destacando sua contribuição para o desenvolvimento sustentável local.

Deputado Marcon destacou a trajetória da cooperativa na produção de alimentos e no fortalecimento da agricultura familiar ao longo de três décadas. Foto: Katia Marko

Contribuições sociais e econômicas

A atuação da Cootap vai além da produção de alimentos. A cooperativa tem participado de programas estruturados de aquisição institucional, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), em parceria com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que torna possível a doação de alimentos produzidos por assentados para entidades que atendem famílias em situação de vulnerabilidade.

Projetos conjuntos entre cooperativas da Reforma Agrária têm resultado em centenas de toneladas de alimentos destinados a comunidades urbanas e rurais, beneficiando milhares de pessoas e fortalecendo laços de solidariedade e mercado popular.

Deputado estadual Adão Pretto Filho também celebrou a força do cooperativismo. Foto: Katia Marko

Perspectivas e permanência no campo

Ao completar 30 anos, a Cootap enfrenta um contexto marcado por desafios econômicos, mudanças nas políticas agrícolas e pressões de mercado, mas também por conquistas significativas na estruturação de cadeias produtivas coletivas. A cooperação entre assentados, a expansão de produtos orgânicos e a articulação com políticas públicas de apoio à agricultura familiar são alguns dos elementos que, segundo participantes do evento, apontam para a continuidade e ampliação das atividades da cooperativa nas próximas décadas.

O superintendente do Instituto Nacional da Reforma Agrária (Incra/RS), Nelson Grasselli, paabenizou a organização coletiva de agricultores assentados. Foto: Katia Marko

O encontro no Assentamento Capela não foi apenas uma celebração histórica, foi também um momento de reafirmação de um modelo de organização coletiva que busca integrar produção, sustentabilidade e inclusão social no campo brasileiro. Com base nos desafios superados e nas estratégias construídas, a Cootap segue projetando sua contribuição para a agricultura familiar, sem perder de vista o compromisso com práticas agroecológicas e a valorização do trabalho coletivo.

Editado por: Katia Marko