Com maioria no Congresso, ruralistas tentam “legalizar a contaminação”

Em entrevista, a engenheira agrônoma, Fran Paula, faz uma análise do atual contexto da luta contra os agrotóxicos e projeto as ações para o próximo período.

 

Por João Vitor Santos
No IHU-Online

Pensar um Brasil que não priorize uma produção agrícola em latifúndios de monoculturas para exterminar o uso de agrotóxicos. É o que propõe Fran Paula, engenheira agrônoma da coordenação nacional da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida em entrevista concedida por e-mail para a IHU On-Line.

Para ela, “o agronegócio utiliza largas extensões de terras, criando áreas de monocultivos. Dessa maneira, destrói toda a biodiversidade do local e desequilibra o ambiente natural, tornando o ambiente propício para o surgimento de elevadas populações de insetos e de doenças”. E a priorização por esse tipo de produção se reforça no conjunto de normas que concedem muito mais benefícios a quem adota o cultivo à base de agrotóxicos ao invés de optar por culturas ecológicas. Um exemplo: redução de impostos sobre produção desses agentes químicos, tornando o produto muito mais barato. Segundo Fran, em estados como Mato Grosso e Ceará essa isenção de tributos chega a 100%.

E, ao contrário do que se possa supor, a luta pela redução do consumo de agrotóxicos não passa necessariamente por uma reforma na legislação brasileira. Para a agrônoma, basta aplicar de forma eficaz o que dizem as leis e cobrar ações mais duras de órgãos governamentais. O desafio maior, para ela, é enfrentar a bancada ruralista e sua bandeira do agronegócio, além de cobrar ações que levem à efetivação da Política Nacional de Agroecologia.

“A bancada ruralista ocupa hoje mais de 50% do Congresso brasileiro e vem constantemente atuando na tentativa do que consideramos legalizar a contaminação. Isso à medida que exerce forte pressão no governo sobre os órgãos reguladores, dificultando processos de fiscalização, monitoramento e retirada de agrotóxicos do mercado. E, ainda, vem tentando constantemente flexibilizar a lei no intuito de facilitar a liberação de mais agrotóxicos a interesse da indústria química financiadora de campanhas eleitorais”, completa.

Fran Paula é engenheira Agrônoma e também técnica da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE. Hoje, atua na coordenação nacional da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida. É um grupo que congrega ações com objetivo de sensibilizar a população brasileira para os riscos que os agrotóxicos representam e, a partir disso, adotar ações para acabar com o uso dessas substâncias.

Confira a entrevista.

No último dia 3 de dezembro, dia internacional da luta contra agrotóxicos, a Campanha contra os Agrotóxicos divulgou que cada brasileiro consome 5,2 litros de agrotóxicos por ano. Como chegaram à contabilização desses dados? O que esse valor indica acerca do uso de agrotóxicos no Brasil em relação a outros países do mundo que utilizam esses produtos na agricultura?

O dado se refere à exposição ocupacional, ambiental e alimentar a que o brasileiro se encontra, devido ao uso indiscriminado de agrotóxico no país. O número se refere à média de exposição de agrotóxicos utilizados no ano em relação ao número da população brasileira. Esse número se eleva quando a referência são alguns estados produtores de grãos, como o caso do Estado de Mato Grosso. No ano de 2013, utilizou 150 milhões de litros de agrotóxicos, levando a população do Estado a uma exposição de 50 litros de agrotóxicos por pessoa ao ano.

Um dado revela que o Brasil é, desde 2008, o campeão noranking mundial de uso de agrotóxicos. Ou seja, somos o país que mais consome venenos no Planeta.

A que atribuem esse consumo elevado de agrotóxicos?

A opção clara da política agrícola brasileira pelo agronegócio é a grande responsável pela situação. O agronegócio utiliza largas extensões de terras, criando áreas de monocultivos. Por exemplo: soja, milho, algodão, eucalipto ou cana-de-açúcar. Dessa maneira, destrói toda a biodiversidade do local e desequilibra o ambiente natural, tornando o ambiente propício para o surgimento de elevadas populações de insetos e de doenças. Por isso este modelo de produção é dependente da química, só funciona com muito veneno. E, além de usar grande quantidade de agrotóxicos e transgênicos, não gera empregos e não produz alimentos.

A bancada ruralista ocupa hoje mais de 50% do Congresso brasileiro e vem constantemente atuando na tentativa do que consideramos legalizar a contaminação. Isso à medida que exerce forte pressão no governo sobre os órgãos reguladores (principalmente saúde e meio ambiente), dificultando processos de fiscalização, monitoramento e retirada de agrotóxicos do mercado. E, ainda, vem tentando constantemente flexibilizar a lei no intuito de facilitar a liberação de mais agrotóxicos a interesse da indústria química financiadora de campanhas eleitorais. Política essa que permite absurdos como o uso de agrotóxicos já banidos em outros países, havendo comprovação científica do grau de periculosidade destes produtos na saúde dos humanos e do meio ambiente.

No Brasil, um conjunto de normas reduz a cobrança de impostos sobre agrotóxicos. E a isenção destes impostos (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, Programa de Integração Social – PIS e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PASEP, Tabela de Incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados – TIPI) pode chegar a 100% em alguns estados como Ceará e Mato Grosso.

Contradizendo as promessas das sementes transgênicas, os transgênicos elevaram o uso de agrotóxicos no país. Um exemplo é o da soja Roundup Ready, resistente ao herbicida glifosato. Com a entrada da soja transgênica, o consumo de glifosato se elevou mais de 150%. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, considerando o potencial aumento de resíduos do herbicida, determinou o aumento de 50 vezes no Limite Máximo Residual – LMR do glifosato na soja transgênica, passando de 0,2 mg/kg para 10 mg/kg. Assim, a ANVISA demonstra que os argumentos da Monsanto anunciando uma diminuição do uso de herbicida com o advento da soja transgênica não são verificáveis na realidade, o que já estava previsto com a expansão da indústria de Roundup no Brasil.

Quais são as culturas que recebem uma carga mais pesada de defensivos?

Primeiramente: não existem defensivos. Defesa para quem? E do quê? Não existe essa terminologia na legislação. O termo é agrotóxicos e assim devemos tratar do assunto. O termo defensivo é utilizado pelos setores do agronegócio, incluindo as indústrias que os produzem, para tirar de foco a função desses produtos e seus efeitos nocivos à saúde da população e do meio ambiente. Da mesma forma que uso seguro de agrotóxicos é um mito. Isso faz parte do lobby da indústria química para esvaziar o debate sobre o risco que os agrotóxicos representam.

Entre os mais utilizados, destacamos: o Abamectina, um tipo de inseticida altamente tóxico, utilizado em plantações de batata, algodão e frutíferas; o Acefato, que é um inseticida que pertence à classe toxicológica III – Medianamente Tóxico e que é utilizado com frequência em plantações de couve, amendoim, brócolis, fumo, crisântemo, repolho, melão, tomate, soja, rosas, citros e batata; e o Glifosato, um herbicida bastante utilizado no combate a ervas indesejáveis no cultivo de soja, principalmente.

Não é o tipo de cultura que define a quantidade de agrotóxico utilizada. O que define é o modelo de produção. Posso ter um pimentão com alta concentração de agrotóxico, como posso ter um pimentão orgânico.

Quais os efeitos na saúde de quem consome alimentos com traços de agrotóxicos?

Não existe agrotóxico que não seja tóxico. Portanto, não há nenhum que não apresente risco à saúde humana mediante exposição e posterior contaminação. Os agrotóxicos provocam dois tipos de efeitos: os agudos, provocados nas horas seguintes à exposição; e os crônicos, que podem se manifestar em meses, anos e até décadas, como resultado da acumulação dos resíduos químicos no organismo das pessoas.

Um exemplo nacional que tivemos de contaminação por agrotóxicos e acumulação destes resíduos no organismo foi a pesquisa que revelou contaminação do leite materno. Os efeitos de resíduos de agrotóxicos no nosso organismo podem manifestar complicações como alterações genéticas, problemas neurotóxicos, má-formação fetal, abortos, efeitos teratogênicos, desregulação hormonal, desenvolvimento de células cancerígenas. Reforço que a maioria dos agrotóxicos possui ação sistêmica e que medidas como lavar superficialmente os alimentos com água e sabão não são suficientes para eliminar os resíduos de agrotóxicos.

A campanha também alerta que há regiões no país em que o consumo de agrotóxicos é ainda maior. Quais são essas regiões e por que o consumo é tão elevado?

Como já havia citado anteriormente, em alguns estados onde o agronegócio exerce um aparelhamento político forte e detém grandes áreas de monocultivos de soja e outras commodities, o consumo de agrotóxicos é maior.

Além do consumo de alimentos que foram expostos a agrotóxicos, a que riscos as pessoas que vivem em regiões de altos índices de aplicação desses defensivos estão submetidas?

Estão submetidas a problemas de saúde devido à exposição direta aos agrotóxicos, devido à contaminação da água para consumo, do ar que respiram e do solo. Ainda sofrem as ameaças da pulverização aérea, como os milhares de casos pelo Brasil de populações que são banhadas diariamente por venenos, principalmente pelo desrespeito às medidas legais quanto aos limites desta pulverização tanto aérea quanto terrestre no entorno dessas comunidades.

A este contingente de populações expostas a agrotóxicos cobramos atenção especial dos serviços de saúde como forma de promoção da vida e sobrevivência destas pessoas. Por isso uma das bandeiras de luta da Campanha tem sido a criação de áreas livres de agrotóxicos e transgênicos.

O que é possível fazer para frear esse uso tão grande de agrotóxicos? Quais as alternativas junto às plantações para o controle de pragas?

Analisemos a história da agricultura no mundo, com registros de 12 mil anos atrás. Já a história dos agrotóxicos tem registros de pouco mais de 50 anos. Ou seja, desde muito tempo é possível produzir sem usar agrotóxicos. São crescentes os investimentos em países da União Europeia, Japão, Índia, em práticas e técnicas de produção de não uso de agrotóxicos.

O Brasil é um país atrasado na medida em que ainda utiliza um arsenal deprodutos químicos provenientes da guerra. Nosso país precisa urgentemente rever o modelo de produção quem vem adotando, centrado no Agronegócio. Esse modelo concentra a terra, cria áreas de monocultivos e desertos verdes, adota pacotes tecnológicos (adubos químicos, sementes híbridas e transgênicas e agrotóxicos) ofertados pelas indústrias químicas. É preciso implementar o Plano Nacional de Redução de Agrotóxicos – PRONARA,vinculado à Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, construído em 2014.

Essa legislação prevê ações no campo da pesquisa de tecnologias sustentáveis de produção, crédito para o fortalecimento da agricultura de base agroecológica responsável pela produção de alimentos, investimentos em assistência técnica e extensão ruralagroecológica aos agricultores, retirada imediata dos agrotóxicos já banidos em outros países e que são utilizados livremente no Brasil e fim do subsídio fiscal aos agrotóxicos.

Além disso, adoção de práticas de menor impacto, como o controle biológico de pragas e o manejo integrado; adoção de práticas agroecológicas de produção, que permitem a seleção natural das culturas, e variedades crioulas com maior resistência à incidência de insetos e doenças e que permitam a diversificação da produção e oferta de alimentos com base nos princípios da segurança alimentar e nutricional.

Uma das bandeiras da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida é o fim da prática de pulverização aérea das lavouras. Por quê?

A pulverização aérea de agrotóxicos é uma prática ameaçadora à vida. Diversos estudos científicos e casos de intoxicação humana e contaminação ambiental têm reiterado que não existem condições seguras para pulverização aérea. Além de tratar-se de uma técnica atrasada em termos de eficiência de aplicação, requer que sejam pulverizadas grandes quantidades de veneno para se atingir a quantidade desejada do ponto de vista agronômico, por conta das elevadas perdas.

Estudos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPAmostraram que o percentual de perda pode chegar a mais de 80% em algumas culturas. Esse elevado percentual corrobora o fato de que grande parte do que é pulverizado atinge outros alvos que não os desejados, podendo contaminar água, lençóis freáticos e ainda atingir diretamente pessoas e outros seres vivos.

Entre os casos de contaminação via pulverização aérea, temos o ocorrido em 2013 na Escola Municipal de São José do Pontal, localizada na região rural do município de Rio Verde, Goiás. Ali, essa prática resultou em diversos casos de intoxicação aguda de trabalhadores e de alunos de 9 a 16 anos. Nesse episódio, a pulverização teria sido feita sobre a lavoura de milho localizada a poucos metros da escola, não obedecendo aos limites mínimos de distância recomendados na legislação.

O produto pulverizado, segundo a empresa de aviação agrícola, era o inseticida Engeo Pleno, fabricado pela multinacional Syngenta. Um de seus componentes é o tiametoxam, do grupo dosneonicotinoides, produto altamente tóxico para abelhas e que por isso havia sido proibido para uso por pulverização aérea pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente – IBAMA. No entanto, após pressão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, a proibição foi suspensa.

Qual sua avaliação sobre a legislação brasileira no que diz respeito à liberação e uso de agrotóxicos? Recentemente, a ANVISA aprovou a iniciativa para propor o banimento dos agrotóxicos Forato e Parationa Metílica. Como avalia essa iniciativa e quais as implicações desses agrotóxicos?

O problema em geral não está na lei 7802/89, que define a Legislação dos Agrotóxicos no Brasil, e sim no não cumprimento da mesma. Quanto ao registro de agrotóxicos, a lei estabelece a proibição para os quais o Brasil não disponha de métodos para desativação de seus componentes, de modo a impedir que os seus resíduos remanescentes provoquem riscos ao meio ambiente e à saúde pública, para os quais não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil.

Ainda proíbe registro aos que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados atualizados de experiências da comunidade científica, que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor, de acordo com procedimentos e experiências atualizadas na comunidade científica. Não permite registro de agrotóxicos que se revelem mais perigosos para o homem do que os testes de laboratório com animais tenham demonstrado, segundo critérios técnicos e científicos atualizados e também cujas características causem danos ao meio ambiente. O risco maior está nas inúmeras tentativas de flexibilização da leipor parte da bancada ruralista, cujo propósito é defender os interesses das indústrias químicas e assim liberar o registro de mais agrotóxicos no mercado.

O efeito danoso dos agrotóxicos é reconhecido e estabelecido em lei. A ANVISA é o órgão responsável no âmbito do Ministério da Saúde pela avaliação da toxicidade dos agrotóxicos e seus impactos à saúde humana; emite o parecer toxicológico favorável ou desfavorável à concessão do registro pelo Ministério da Agricultura.

Quais os pontos mais urgentes em que a legislação precisa avançar ou ser revista?

A legislação brasileira, apesar de conter normas de restrição ao registro de agrotóxicos, não estipula tempo para reavaliação dos agrotóxicos. Acaba ficando a critério dos órgãos responsáveis pelo registro solicitarem a mesma. No Brasil, a validade do registro do produto é de tempo indeterminado, ao contrário de países como Estados Unidos, onde o registro tem validade por 15 anos.

Na União Europeia são 10 anos, no Japão três anos e no Uruguai quatro anos. Apesar de a lei atribuir responsabilidades quanto ao monitoramento e fiscalização, o cenário é de uma capacidade reduzida dos órgãos de saúde e de meio ambiente. Isso ocorre nas três esferas de governo, no que diz respeito ao desenvolvimento de serviços de monitoramento e controle de agrotóxicos.

Um dos herbicidas mais usados e conhecidos no Brasil e no mundo é o Glifosato, chamado “mata mato”. Como acaba com praticamente todas as ervas daninhas, além da aplicação em zona rural, há municípios que usam em áreas urbanas, fazendo o que algumas pessoas chamam de “capina química”. Que problemas para o meio ambiente, no campo e na cidade, o uso indiscriminado dessa substância pode causar?

Mata mato é um dos nomes comerciais do herbicida Glifosato. Possui uma ação sistêmica, ou seja, ao ser aplicado nas folhas das plantas é translocado até as raízes e é não seletivo. Mata todo tipo de plantas, exceto as transgênicas que apresentam resistência a este princípio ativo.

Dentre os riscos ao meio ambiente estão a contaminação do lençol freático e do solo, com a morte de microrganismos e consequente perda da fertilidade. E se tratando de capina química, há uma nota técnica da ANVISA de 2010 recomendando a proibição dessa prática em ambientes urbanos, devido à exposição da população ao risco de intoxicação, além de contaminar a fauna e a flora local.

E para a saúde de quem se expõe ao Glifosato?

Há estudos toxicológicos do Glifosato em diversos países e todos são unânimes nos resultados para efeitos tóxicos na saúde. Estes estudos revelam que a toxicidade do Glifosato provoca os seguintes efeitos: toxicidade subaguda (lesões em glândulas salivares), toxicidade crônica (inflamação gástrica), danos genéticos (em células sanguíneas humanas), transtornos reprodutivos (diminuição de espermatozoides e aumento da frequência de anomalias espermáticas) e carcinogênese (aumento da frequência de tumores hepáticos e de câncer de tireoide).

Os sintomas de intoxicação incluem irritações na pele e nos olhos, náuseas e tonturas, edema pulmonar, queda da pressão sanguínea, alergias, dor abdominal, perda de líquido gastrointestinal, vômito, desmaios, destruição de glóbulos vermelhos no sangue e danos no sistema renal.

O herbicida ainda pode continuar presente em alimentos num período de até dois anos após o contato com o produto. Em solos pode estar presente por mais de três anos, dependendo do tipo de solo e clima. Apesar da classificação toxicológica que recebe no Brasil, o produto é considerado um biocida. Tanto que já foi banido de países como a Noruega, Suécia e Dinamarca.

Qual o papel de outros órgãos, como Ministério Público, nas discussões e no combate ao uso indiscriminado de agrotóxicos?

A atuação do Ministério Público é fundamental diante do contexto e cenário que o Brasil se encontra, de ineficiência de aplicação da lei e da omissão dos órgãos de monitoramento e fiscalização. O Ministério Público do Trabalho lançou em 2009 o Fórum Nacional de Combate aos Efeitos dos Agrotóxicos.

Criado para funcionar como instrumento de controle social, o Fórum Nacional conta com a participação de organizações governamentais e não governamentais, sindicatos, universidades e movimentos sociais, além do Ministério Público. Além do Fórum Nacional, foram sendo criados os fóruns estaduais de combate aos impactos dos agrotóxicos com o mesmo objetivo.

A Campanha participa do Fórum Nacional e dos estaduais, com objetivo de levantar elementos e embasar o Ministério Público em ações que visem à redução do uso de agrotóxicos e promoção da agroecologia.

A Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida já destacou que 2015 será um ano em que se desenvolverão diversas políticas nacionais de agroecologia e produção orgânica. Que políticas são essas?

Em agosto de 2012, a presidenta Dilma Rousseff instituiu a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – PNAPO, por meio do Decreto nº 7.794, de 20-08-2012, resultado de intensos diálogos e reivindicações dos movimentos sociais. A partir de então, governo e sociedade civil se debruçaram na tarefa de construção de um Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – PLANAPO.

No campo produtivo, o Plano propõe mecanismos capazes de atender à demanda por tecnologias ambientalmente apropriadas, compatíveis com os distintos sistemas culturais e com as dimensões econômicas, sociais, políticas e éticas no campo do desenvolvimento agrícola e rural.

Ao mesmo tempo, apresenta alternativas que buscam assegurar melhores condições de saúde e de qualidade de vida para a população rural. Assim foi criado, no âmbito da PNAPO, o Programa Nacional de Redução do Uso de Agrotóxicos – PRONARA. É construído numa parceria da Campanha com diversos ministérios e órgãos subordinados, além de outros movimentos sociais. O PRONARA contém 35 iniciativas que, se levadas a cabo, melhorariam drasticamente as condições de saúde do povo brasileiro em relação aos agrotóxicos.

A lógica do PRONARA se desenvolve como base em iniciativas estruturadas de forma articulada, cobrindo seis dimensões: registro; controle, monitoramento e responsabilização da cadeia produtiva; medidas econômicas e financeiras; desenvolvimento de alternativas; informação, participação e controle social; e formação e capacitação.

O prazo de três anos para execução desta primeira edição do Plano Nacional de Agroecologia vincula suas iniciativas às ações orçamentárias já aprovadas no Plano Plurianual de 2012 a 2015.

Trata-se, portanto, de um forte compromisso para trazer a agroecologia, seus princípios e práticas, não só para dentro das unidades produtivas, como para as próprias instituições do Estado, influenciando a agenda produtiva e de pesquisa e os mais diferentes órgãos gestores de políticas públicas. Em síntese, um grande avanço da sociedade brasileira na construção de um modelo de desenvolvimento sustentável.

O que mais deve pautar a luta do movimento em 2015?

Já avaliamos que 2015 será um ano de grandes desafios e lutas intensas, a começar pelo cenário sombrio da nomeação de Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura. Ela tem sido até agora uma representante atuante da bancada ruralista no Congresso e defensora dos interesses do agribusiness brasileiro. Também queremos garantir mobilização social articulada e contrária às iniciativas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBIO para a não liberação de mais variedades transgênicas.

Hoje, a Campanha tem mais de 100 organizações e movimentos sociais atuando de ponta a ponta do país. A meta para 2015 é ampliar e fortalecer nosso diálogo com a sociedade, alertando para o risco que os agrotóxicos representam, reforçando a necessidade e urgência da efetivação de políticas públicas de promoção da agroecologia, solução para a produção de alimentos saudáveis a todos os brasileiros.

Temos, ainda, nossa agenda de luta, onde são organizadas as ações massivas da Campanha: 07 de abril – Dia Mundial da Saúde e o aniversário de quatro anos da Campanha, 16 de outubro – Dia Mundial da Alimentação Saudável e 03 de dezembro – Dia Mundial de Luta contra os Agrotóxicos.

2015 será um ano das Conferências Nacionais, a exemplo da Conferência Nacional de Saúde e a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. São espaços onde estaremos reforçando a necessidade do controle social e da importância da efetivação das políticas públicas de promoção da agroecologia e do não uso de agrotóxicos.