Manifestantes marcham rumo ao Congresso e defendem “Fora, Temer”
Por Cristiane Sampaio
Do Brasil de Fato
Milhares de manifestantes se reuniram na manhã desta quarta-feira (7) nos arredores do Museu Nacional, em Brasília (DF), durante o Grito dos Excluídos. Realizado anualmente durante o 7 de Setembro e com uma tradição de 21 anos, o evento coloca em pauta a luta pela soberania nacional e popular. Mais de 80 entidades estiveram presentes no ato da capital federal, que terminou por volta das 14 horas, após uma marcha que percorreu a Esplanada dos Ministérios.
No meio da multidão, múltiplas bandeiras: igualdade de gênero; fortalecimento dos direitos da população LGBT; moralização do sistema de Justiça; reforma política; desmilitarização da polícia; defesa do pré-sal; respeito aos povos indígenas; auditoria cidadã da dívida pública; greve geral dos trabalhadores; defesa da reforma agrária; combate às propostas de reformas trabalhista e da Previdência do governo Temer; campanha pelas “Diretas já”.
E, no meio de todas elas, um grito em uníssono pelo “Fora, Temer”, bandeira que veio se somar à tradicional pauta do evento neste histórico 2016. Os movimentos populares consideram que o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff foi um “golpe parlamentar” e por isso não conferem legitimidade ao governo de Michel Temer.
“É fundamental que o povo esteja nas ruas neste momento porque temos um cenário de golpe no Brasil, com um governo ilegítimo que usurpou o poder. Nós entendemos que o povo está sendo enganado e roubado porque a vontade soberana das ruas não está sendo respeitada. Só quem pode mudar um governo é o voto popular, e o Congresso agiu na contramão disso, em conluio com a grande mídia. (…) Estamos aqui também pra dizer que já sentimos na pele a retirada de direitos que vem sendo promovida por quem está no poder. As propostas que estão sendo feitas no Congresso, por exemplo, não são pra atacar a raiz dos problemas sociais, e sim pra agravar ainda mais”, disse o militante Fábio Miranda, da Consulta Popular, uma das entidades que articulam o evento.
De acordo com a Polícia Militar, o ato teria reunido cerca de 2.700 manifestantes, mas a organização divulgou que o número seria em torno de 10 mil pessoas.
Para Kamuu Dam, do Conselho Nacional dos Povos Indígenas, o ato é um grito de protesto e desabafo. “Os direitos indígenas sempre estiveram ameaçados em todos os governos, nossa luta nunca foi fácil, mas agora a situação piorou porque temos, por exemplo, a CPI da Funai e do Incra e a PEC 215, que eles querem aprovar pra retirar do Executivo a competência para demarcação de terras indígenas, transferindo essa responsabilidade para o Legislativo. Não aceitamos que um Congresso corrupto como esse que está aí tenha essa competência”, criticou o militante.
Para o pesquisador Pedro Júnior, que atua no Partido do Socialismo e Liberdade (PSOL), o momento favorece uma maior aglutinação das forças de esquerda em torno da defesa dos ideais democráticos. “Este é um contexto em que precisamos intensificar a luta porque há uma agenda de retrocessos que não foi amparada pelas urnas e, por mais que o governo anterior já tivesse iniciativas questionáveis, agora parece que não existe mais nenhum pudor em defender coisas indefensáveis. Os que estão no poder representam interesses que estão bem distantes dos interesses populares”, considera o militante.
Já o servidor público Rodrigo Costa compareceu ao ato para demarcar apoio à proposta de realização de uma auditoria cidadã da dívida pública, que surgiu a partir de um movimento da sociedade civil organizada.
“Nós temos no Brasil uma dívida contraída pelo sistema financeiro que ninguém sabe exatamente de onde vem. Eles querem legitimar esses valores sem que haja qualquer transparência ou explicações sobre os juros e os números. Pior que isso, querem legitimar essa dívida em detrimento dos gastos sociais, porque estão aí tentando congelar gastos com saúde e educação, por exemplo, em nome do sistema financeiro e de uma dívida que a sociedade não sabe exatamente onde tem origem. Não podemos nos calar”, disse o servidor público.
Para o militante Arthur Pietro, da Rede Nacional de Adolescentes LGBT, o atual contexto político nacional aponta para a negação de direitos desse segmento da população. “Nós temos no país uma situação ainda muito delicada porque o Brasil é campeão mundial em assassinatos de homossexuais e temos outros dados alarmantes, como, por exemplo, o fato de 90% das mulheres transexuais terem que se prostituir porque não conseguem emprego. Na maioria das vezes, não conseguem nem terminar o ensino médio porque são expulsas de casa, então, lutamos por justiça e igualdade e nós entendemos que lutar contra o golpe é lutar pelos nossos direitos, por conta da onda conservadora que hoje domina a política”, afirmou o militante.
O Congresso e as ruas
Para a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), que compareceu ao Grito dos Excluídos, o ato é importante também para dar aos parlamentares da oposição o respaldo das ruas na luta contra o projeto político de Michel Temer e da base aliada do peemedebista no Congresso.
“Não é o parlamento que vai barrar o golpe, até porque ele faz parte do golpe. Só o povo organizado nas ruas pode conseguir isso, então, é preciso que a gente consiga traduzir pras pessoas o que está acontecendo, traduzir o que são as reformas trabalhista e da Previdência, o que significa perder o pré-sal, etc.”, afirmou a deputada.
Ela destacou ainda que as articulações que levaram ao afastamento definitivo de Dilma Rousseff resultam do empenho de muitos atores. “São o capital financeiro, a mídia oligopolizada, o capital industrial, os fundamentalistas, etc. Todos caçadores de direitos. Não podemos esquecer que existe o golpe e existe também o conteúdo do golpe, que consiste na venda do patrimônio nacional e na negação de direitos, daí a importância de uma articulação como a deste ato”, disse a deputada.
Polícia
Ao final do ato em Brasília, foram registradas pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal a apreensão de um adolescente de 14 anos e a prisão de um homem de 33 anos que teriam se envolvido em uma discussão com uma equipe de jornalistas. Todos os envolvidos, incluindo um repórter e um cinegrafista, foram levados para a delegacia para prestar esclarecimentos.
O Brasil de Fato presenciou o momento em que a Polícia Militar efetuou a prisão e agiu com gás de pimenta contra os manifestantes, atingindo inclusive jornalistas. As circunstâncias da ocorrência ainda não foram devidamente esclarecidas.
*Edição Simone Freire