Monsanto tenta lavar imagem doando plantas em reduto paulista da agroecologia
Por Inês Castilho
De Olho nos Ruralistas
Um truck branco delicadamente pintado em verde numa tarde de sábado num parque, em São Paulo. Flores, ervas e folhagens em vasinhos coloridos, com técnicos de branco e verde explicando como plantar, fazer muda, compostar. Tudo de graça para a população. O projeto Plantaria, da Monsanto, quer “deixar a capital mais verde”. Em São Paulo desde o inicio de agosto, já passou por vários lugares e, até 7 de setembro, faz ponto no Parque da Água Branca, um dos berços da agroecologia na cidade, com sua tradicional feira de produtores orgânicos.
De Olho nos Ruralistas foi conferir a iniciativa. A fila que rapidamente se formou diante da carroceria era de pessoas simples, a maioria de idosos, que ficaram uma meia hora sob o sol quente até chegar a vez de conversar com uma jovem agrônoma. Ouviram dela que a Monsanto quer incentivar o cultivo de plantas dentro de casa e receberam instruções: é só comprar as sementes e a terra adubada; se for outra terra é preciso juntar o adubo “10 10 10”, de nitrogênio, fósforo e potássio, colocar pedrinhas no fundo do vaso e escolher um lugar onde bata ao menos três horas diárias de sol.
Puderam então escolher uma mudinha, embalada em papel com aparência de reciclado, e sair dali carregando-a como um pequeno troféu.
“Típica ação de greewashing, lavagem verde, que as empresas fazem para fingir que são ecológicas e do bem”, afirma a ambientalista Claudia Visoni, agricultora urbana, voluntária em hortas comunitárias. “Diante da gravidade das consequências do uso dos produtos da Monsanto na saúde pública, nos ecossistemas e nas fontes de água, repudiamos essa ação”.
Posicionada ali perto, uma equipe do SOS Abelhas Sem Ferrão entrevistava as pessoas que saíam do caminhão. A maioria nada sabia sobre a Monsanto e ouvia, espantada, incrédula ou mesmo indiferente, um pouco da sua história: a fabricação de agrotóxicos que envenenam a terra, a água, o ar e os alimentos; os estudos que comprovam a ligação dos agrotóxicos com várias doenças e mortes; as sementes transgênicas que prometiam reduzir o seu uso mas só fizeram aumentá-lo e tornar os agricultores, obrigados a comprá-las, reféns da empresa.
Julgamento em Haia
A Monsanto é hoje o símbolo do agronegócio, um modelo que ameaça populações nativas, pequenos agricultores e a soberania alimentar de vários povos, ao patentear sementes e privatizar a vida. Criada nos EUA no início do século 20, desenvolveu produtos que têm danificado permanentemente o ambiente e, segundo seus críticos, causado doença e morte em milhares de pessoas – entre eles o herbicida glifosato Roundup, utilizado com sementes transgênicas em monoculturas de larga escala.
Entre 14 a 16 de outubro de 2016, em Haia, na Holanda, o Tribunal Monsanto vai julgar as acusações contra a empresa e avaliar os danos por ela causados. O tribunal é fundamentado nos “Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos”, adotados pela ONU em 2011, e vai avaliar a possível responsabilidade criminal da corporação com base no Estatuto de Roma, de 1998, assinado por 122 Estados, do qual o Brasil é signatário desde 2002.
A empresa deve também ser julgada pelo virtual crime de ecocídio, cuja inclusão na lei penal internacional vem sendo proposta. Os organizadores do Tribunal estão promovendo uma campanha internacional de financiamento. “Defender a sanidade do planeta e a condição da própria vida diz respeito a todos nós”, lembram. “Somente uma ação coletiva pode parar essa máquina de destruição”.