Após CCJ, desmonte trabalhista pode ser votado nesta quinta-feira no Senado
Por Lizely Borges
Da Página do MST
Com a conclusão, na noite de ontem (28), do percurso da reforma trabalhista (PLC 38/2017) pelas comissões do Senado, com a aprovação pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), por 16 votos favoráveis e 9 contrários, a matéria pode ter seu rito legislativo concluído ainda nesta quinta-feira (29).
No encerramento da sessão foi aprovado um requerimento de urgência para a votação da matéria pelo Plenário do Senado. Na madrugada desta quinta-feira, o presidente da Casa, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), convocou sessão extraordinária para esta manhã. A sessão deve ser seguida por nova sessão ordinária, no período da tarde. Como o Projeto de Lei possui caráter de urgência, a votação deve se sobrepor a outros itens da pauta.
Somada à apresentação de Carta do presidente Michel Temer (PMDB) pelo líder do Governo, Romero Jucá (PMDB-RR), também relator do PLC, no início da sessão da CCJ pedindo a aprovação da matéria, a apresentação do requerimento de urgência de votação e a convocação de sessão extraordinária evidenciam os esforços da base governista em acelerar, ao limite, a votação da reforma trabalhista. O governo também busca concluir a votação em razão do recesso do Congresso, com início para 18 de julho.
Os esforços para acelerar a tramitação são respostas às fissuras da base do governo, evidenciadas pelo anúncio recente de Renan Calheiros (PMDB-AL) de saída da liderança do Partido no Senado, e a proximidade da Greve Geral, marcada para esta sexta-feira (30).
A mobilização nacional, convocada por centrais sindicais e movimentos populares, busca repetir a paralisação recorde do dia 28 de abril, no qual 35 milhões de trabalhadores paralisaram suas atividades em reprovação às reformas trabalhista e previdenciária, ações centrais ao projeto de Governo de Temer, e pela realização de “Diretas Já”.
Oposição
Ao longo do percurso da reforma trabalhista pelas duas Casas legislativas, movimentos populares e centrais sindicais têm denunciado o impedimento do debate público sobre o projeto, à altura dos impactos da medida. Ontem, na sessão pela CCJ, a população foi novamente impedida de entrar no Senado. O acesso à sessão foi restrito aos parlamentares integrantes da Comissão, assessores e jornalistas.
Desde que foi apresentada à mesa diretora da Câmara, na antevéspera do natal do ano passado (PL 6787/2016), a medida enfrenta duras críticas pela população. A oposição está expressa na enquete online do Senado, com rejeição por 130.941 votos, em contraposição à 5.824 votos favoráveis à reforma (atualização 29.06). “O que a reforma pretende fazer é transformar o emprego formal em bico porque quer acabar com todos os direitos trabalhistas consolidados em lei e fazer com que o trabalhador só tenha a ter direito naquilo que ele conseguir negociar com patrão e de maneira individual”, aponta o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Feitas, em referência “ao coração da reforma” à possibilidade de acordos entre patrão e empregado prevalecer sobre determinações da lei.
No final de maio, os ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) entregaram ao presidente do Senado um documento assinado por 17 dos 27 membros do TST no qual apontam que a grande preocupação com a medida é que ela “elimina ou restringe, de imediato ou médio prazo, várias dezenas de direitos individuais e sociais trabalhistas que estão assegurados no País às pessoas humanas que vivem do trabalho empregatício e similares”, aponta a nota.
A tramitação da reforma, objeto de intensa preocupação pelas organizações, também pulveriza a atenção popular em contexto de intensificação da crise pelo qual passa o Executivo. Na noite desta segunda-feira (26) o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou ao STF nova denúncia contra o presidente por corrupção passiva, com base na delação dos acionistas e executivos do Grupo J&F, que controla a JBS. A oposição tem, desde o início da semana, denunciado a tentativa da base governista em conferir normalidade às sessões, alheias às graves denúncias envolvendo Temer, ao manter a votação da reforma na pauta.
“Nós não podíamos estar discutindo qualquer outra matéria, muito menos as reformas, que retiram direitos dos trabalhadores”, declarou a senadora e presidenta do PT, Gleisi Hoffmann (PT-PR), anteriormente à votação pela CCJ.
Constrangimento da base aliada
Os senadores das legendas PSDB, DEM, PP, PTB, PR e de parte do PMDB integrantes da base aliada de Temer se viram em um presente constrangimento na CCJ em não poderem propor alterações no texto da reforma. Caso o fizessem, a matéria deveria ser reenviada à Câmara para nova apreciação – o que contrairia o governo. Os requerimentos de sobre artigos polêmicos, como os referentes à trabalho insalubre e prevalência do negociado sobre o legislado, e de adiamento da sessão também foram rejeitados.
O sufocamento do debate nas Comissões é reflexo da retaliação do governo às incertezas dos parlamentares diante da matéria e votos contrários já manifestos. Na reprovação da proposta pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), no dia 20, o senador Hélio José (PMDB-DF) e Eduardo Amorim (PSDB-SE) votaram contrários ao relatório. Logo após a votação pela CAS, Hélio denunciou na tribuna do Senado a exoneração de cargos públicos de pessoas indicadas pelo senador.
A derrota na CAS foi compreendida como resultado da incidência das forças populares no Congresso. “O agravamento da crise que está retirando votos dos senadores (…). Os senadores terão muita dúvida em votar com Temer”, afirma o senador e líder do PT no Senado, Lindbergh Farias (RJ), em referência à prestação de contas do senador com seu eleitorado.
Compreensão popular da reforma
Em cenário de taxa de 13,6% de desemprego, atingindo um contingente de 14 milhões de brasileiros, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a proposta de reforma possui forte caráter impopular na medida em que fragiliza ainda mais a relação do trabalhador com o mercado de trabalho. No entanto, o debate sobre a proposta, diferentemente da reforma previdenciária, ainda sofre da dificuldade de enraizamento popular e compreensão pela população.
O presidente da CUT aponta que, gradualmente, a população tem vencido a invisibilidade da proposta de reforma, na sua complexidade, nos meios privados de comunicação. “A imprensa cumpre um papel em transformar a reforma trabalhista na narrativa de que é o sindicalista defendendo imposto sindical. Toda vez que [a mídia] se refere a reforma fala do imposto sindical e a população acaba entendendo que é uma discussão exclusiva para sindicatos e não do povo. Mas compreensão tem sim pouco a pouco avançado”, diz Vagner.
A análise do cutista é compartilhada pelo membro da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), Alexandre Conceição. “As crescentes mobilizações, a ida às ruas, tem possibilitado que o povo debata sobre a violência desta proposta. É mais do que urgente fazer uma greve geral para derrotar esse governo que não pode seguir administrando o país”, diz convocando a população a se somar aos atos do dia 30.
Alterações propostas
A proposta de reforma trabalhista do governo altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em mais de 100 pontos.
Veja abaixo alguns dos principais pontos presentes na proposta. Somado aos itens abaixo ainda há questões referentes à terceirização, parcelamento das férias, trabalho em casa (home-office), entre outros.
Acordado sobre o legislado – principal item da proposta, incide sobre um conjunto de questões (jornada de trabalho, intervalo, banco de horas, etc). Determina que “a convenção ou o acordo coletivo de trabalho tem força de lei e prevalecerá sobre as disposições legais”. Isto significa que o empregado e patrão negociam, sem intermediação de sindicatos e independente do que prevê a lei. Cria a figura do representante dos trabalhadores dentro das empresas.
Como é hoje: Sindicatos representam as categorias. Questões são determinadas por lei.
Trabalho insalubre para gestantes e lactantes – As gestantes e lactantes poderão trabalhar em locais de pequeno ou médio grau de insalubridade, mediante apresentação de atestado médio. Serão afastadas quando atestarem que a atividade laboral pode apresentar risco à saúde sua e/ou do bebê.
Como é hoje: Por lei, gestantes e lactantes são automaticamente afastadas de qualquer trabalho insalubre.
Jornadas de trabalho – De negociação com o patrão, pode chegar a 12 horas diárias, e limite de 48h/semana.
Como é hoje: A CLT determina que a jornada semanal é de, no máximo, 44 horas, com limite de 8 horas diárias.
Transporte – Nos casos em que a empresa fornece transporte coletivo (quando não há acesso ao transporte público), o tempo gasto no percurso entre residência e trabalho não será mais computado na jornada de trabalho.
Como é hoje: O tempo para deslocamento é incluído como parte da jornada de trabalho.
Intervalos de trabalho – Também vulnerável à negociação com patrão, pode ser de tempo menor do que uma hora. O tempo restante, entre 1h e o tempo real de intervalo, passa a ser ignorado.
Como é hoje: Em jornadas acima de seis horas diárias, o trabalhador tem direito a uma hora de intervalo para alimentação e repouso. Nos casos em que o intervalo é de menos de uma hora, o TST determina que empregador pague adicional.
Contribuição sindical – A proposta de reforma torna facultativo o pagamento da contribuição.
Como é hoje: O pagamento é obrigatório e independe se o trabalhador é associado ou não às entidades de classe. O valor equivale a um dia de trabalho para pagamento pelo trabalhador. Para a empresa o valor é definido por uma alíquota, de acordo com parte da empresa.