Copelmi e Fepam não comparecem a mais um debate sobre a Mina Guaíba
Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST
Quem foi até a Câmara de Vereadores de Porto Alegre na noite de segunda-feira (15) para tirar suas dúvidas sobre a Mina Guaíba, que trata da instalação da maior mina de carvão a céu aberto do país, saiu do Plenário Ana Terra sem respostas. A Copelmi, empresa responsável pelo projeto, e a Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (Fepam), que analisa a concessão de licença prévia ambiental ao empreendimento, se recusaram a participar de mais uma reunião sobre o tema, organizada pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da casa legislativa.
Essa situação se repetiu pela segunda vez em menos de uma semana. Na última quinta-feira (11), a Copelmi e a Fepam recusaram os convites que receberam e não compareceram a uma audiência pública da Comissão de Saúde, Educação, Cultura e Meio Ambiente da Câmara de Vereadores de Guaíba, município que também será atingido caso o projeto seja aprovado. Em Porto Alegre, a decisão foi informada aos participantes pelo vereador André Carús (MDB), presidente da Cosmam.
“A Fepam enviou nota justificando a ausência na linha de que só participará das audiências que estejam conforme o trâmite de licenciamento. Recebemos também, muito embora existisse a confirmação até sexta-feira, hoje um outro declínio de convite por parte da Copelmi, informando que, uma vez não sendo confirmada a presença da Fepam, também não se fariam presentes. Recebemos essa confirmação por WhastApp”, disse.
Uma das batalhas que tem sido travada por movimentos populares, lideranças políticas e diversas organizações que compõem o Comitê de Combate à Megamineração no RS é pressionar para que a Fepam realize uma audiência pública em Porto Alegre. O entendimento é que, mesmo que não conste no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) da Copelmi, o projeto, previsto para ser instalado entre Eldorado do Sul e Charqueadas — a 16 quilômetros da capital —, também impactará de forma direita os porto-alegrenses com a contaminação do ar, da água e dos alimentos que são produzidos na região e consumidos na cidade.
A reunião extraordinária da Cosmam lotou o plenário. O objetivo era esclarecer dúvidas da população sobre o projeto da Copelmi. Entre os participantes estavam representantes do Ministério Público Estadual (MPE), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Tribunal de Contas do Estado (TCE), do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) e do Comitê de Combate à Megamineração. Também participaram os moradores do loteamento Guaíba City, de Charqueadas, e do assentamento Apolônio de Carvalho, de Eldorado do Sul, que seriam expulsos de seus territórios para instalação da mina.
Conforme a promotora do Meio Ambiente de Porto Alegre, Ana Marchesan, o MPE negocia junto à Secretaria de Meio Ambiente uma audiência pública na capital no contexto do licenciamento ambiental. “Se não houver essa audiência pública, com o modelo Fepam, com o regimento interno Fepam, eu já me comprometi que eu vou fazer uma audiência como ato instrutório do inquérito civil”, ressaltou.
Ana acrescentou que esses espaços de debates são importantes porque a sociedade precisa ser informada. “Esse empreendimento não envolve uma geração, ele é o tipo de empreendimento transversal e transgeracional, e nós conseguimos ver o quanto as questões de meio ambiente são sinérgicas. Eu mesma, que nunca estive à frente de um caso que envolve tantos aspectos, e aspectos que vão muito além da questão ambiental, acho que são implicações socioambientais. Eles vão aparecendo na medida em que o empreendimento vai se revelando para a sociedade”, completou.
Projeto gera preocupação
A Mina Guaíba é o maior empreendimento de extração de carvão a céu aberto do país. A previsão é minerar mais de 166 milhões de toneladas. Há quatro anos a Copelmi solicitou à Fepam licença prévia ambiental para a sua implantação. Se aprovada, a previsão é que a estrutura seja instalada em 2020 e comece a operar em 2023. O fechamento ocorreria somente em 2052. A preocupação de lideranças políticas e de ambientalistas é que, assim como já foi ocorre em países como a China, esse tipo de atividade traz danos irreversíveis ao meio ambiente e às regiões impactadas.
“Não consigo enxergar produtividade nesse tipo de atividade. Não consigo, em pleno século 21, entender que tal tecnologia ainda possa ser considerada viável. Sabemos que a ganância movimenta a sociedade, mas não consigo entender como seres humanos ainda defendem neste momento a matriz energética que movimentou a primeira revolução industrial. São séculos de inviabilização de algumas formas de vida. Porto Alegre será impactada e teria prejudicada a sua saúde, além da contaminação do lago Guaíba [que abastece a cidade]”, argumentou o vereador Alex Fraga (PSOL).
O professor Francisco Milanez disse que a tendência de todas as capitais inteligentes do mundo é buscar em seus arredores atividades que sejam compatíveis com o aumento da qualidade de vida da população. Assim, a produção orgânica próxima a nascentes é incentivada para evitar a contaminação da água e do ar. A região Metropolitana tem algumas vantagens nesse sentido, pois há o Parque Estadual Delta do Jacuí, uma Unidade de Conservação de proteção integral que abrange áreas de Porto Alegre, Canoas, Nova Santa Rita, Triunfo, Charqueadas e Eldorado do Sul.
Além disso, Milanez reforçou que os assentamentos da Reforma Agrária da região se destacam por produzirem alimentos orgânicos como hortaliças e arroz. As famílias do MST são responsáveis pela maior produção do cereal livre de agrotóxico da América Latina, e o Assentamento Apolônio de Carvalho é o terceiro maior produtor. “Colocar uma mineração de carvão aqui significa assinar uma marcha à ré acelerada contra tudo o que fizemos sempre, contra todo o pioneirismo que fez de Porto Alegre uma boa cidade para se viver”, destacou.
O camponês Marcelo Paiakan, que vive no Assentamento Apolônio de Carvalho, alertou que a Copelmi espalha mentiras e que tenta comprar famílias que ainda estão desinformadas sobre os impactos do projeto para apoiá-lo. “Estamos muito preocupados, porque eles falam em emprego, mas vão destruir empregos. Nós trabalhamos na agricultura, nós estamos empregados. Algumas famílias do Guaíba City trabalham na agricultura também, outras nas fábricas. É uma contradição. Vão desempregar muitas pessoas por causa desse projeto”, lamentou.
Novos debates
Outras atividades serão realizadas em Porto Alegre para debater os impactos da mineração na região e no estado. Nesta quarta-feira (17), às 19 horas, terá o evento “Direitos humanos e meio ambiente: não à megamineração”, na Escola de Educação Infantil Marista Tia Jussara (Rua Santa Rita de Cássia, 90, Ilha Grande dos Marinheiros). Os palestrantes serão Julio Alt, do Conselho Estadual de Direitos Humanos/RS; e John Wurdig, engenheiro e ativista ambiental.
No dia 22 de julho terá a atividade “As teias da mineração”, a partir das 13 horas, no salão de atos da Universidade Federal do RS (UFRGS) (Avenida Paulo da Gama, 110). A iniciativa é da Reunião de Antropologias do Mercosul, com o apoio de diversas entidades, entre elas a Via Campesina e o Comitê de Combate à Megamineração.
Já no dia 6 de agosto, o Goethe-Institut e o Sul 21 promovem uma discussão sobre os impactos ambientais e sociais da mineração na metade sul do estado. Participam Michele Ramos, do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM); Juliana Mazurana, assessora programática da área de justiça socioambiental da Fundação Luterana de Diaconia (FLD); e Tatiana Ribeiro, do Grupo de Estudos e Pesquisas Socioambientais da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). A agenda será no Goethe-Institut (Rua 24 de Outubro, 112).
*Editado por Fernanda Alcântara