“Temos que fazer do nosso luto um processo de luta e organização”
Por Maura Silva
Da Página do MST
Nesta quinta-feira (18), o ódio e a intolerância levaram mais um dos nossos. Luís Ferreira da Costa, 72, morreu após Leo Luis Ribeiro avançar na contramão em alta velocidade contra cerca de 500 Sem Terra do acampamento Marielle Vive, que distribuíam alimentos em protesto pelo não fornecimento de água no local.
O atropelamento aconteceu no quilômetro 7 da Estrada do Jequitibá, em Valinhos, interior de São Paulo. Além de matar Luis, deixou mais de 10 feridos – todos sem gravidade -, entre eles o cinegrafista Carlos Felipe Tavares que acompanhava a mobilização.
O Marielle Vive! Se transformou em sinônimo do atual momento pelo qual passa o país. Cerca de 1100 famílias vindas em sua maioria das cidades do entorno vivem no acampamento na esperança de um futuro melhor.
A área foi ocupada em 14 de abril de 2018. O terreno da fazenda pertence à empresa Eldorado Empreendimentos Imobiliários e está improdutivo há anos. O local é cercado por condomínios residenciais de luxo e a especulação imobiliária tem crescido na região.
Lá, vivem homens e mulheres, muitos destes idosos que, como seu Luis, perderam seus empregos e renda, encontram no acampamento um espaço coletivo de acolhimento, luta e de resistência.
Pessoas que sabem que não é fácil romper a teia da invisibilidade em um país que trata seus idosos como um fardo. Um país que tem um governo que tira a pouca renda daqueles que mais precisam. Um governo que promove assassinatos sistemáticos, aqueles que não são contabilizados, mas que acontecem diariamente nas filas do descaso.
Assim era seu Luis, pedreiro, que sem trabalho, morava de favor antes de chegar ao acampamento. Homem de figura rara que, a despeito das dificuldades, foi logo tratar de aprender a ler e a escrever nas aulas de alfabetização ministradas no acampamento.
Aluno aplicado, logo começou a ver resultados do esforço. Aprendeu a soletrar ganância e descaso, mas também resistência, direitos e luta.
Ironicamente morreu segurando uma placa em que estava escrito: “Água Para a Vida e não Para a Morte”. Foi vítima da brutalidade de um tempo que emburrece e embrutece. Seu Luis foi assassinado, atropelado intencionalmente por um homem que deve ser julgado e punido por seu crime. Mas, lembremos sempre, ele também foi atropelado pelo ódio, pelo fascismo, pela intolerância e pelo desamor.
Prisão
Graças a um vídeo feito de um ônibus que estava parado durante a manifestação foi possível identificar Leo Luiz Ribeiro, de 60 anos, que foi preso em Atibaia (SP) horas depois de ter fugido do local sem prestar socorro. Ele confessou o crime, o que caracterizou flagrante. O delegado Júlio César Brugnoli, titular do 1º DP de Valinhos decretou a prisão preventiva do acusado. O prazo de conclusão de inquérito é de 30 dias.
Resistência
“Estamos num luto profundo pela perda do seu Luiz Ferreira, um maranhense acampado há mais de um ano conosco. Uma pessoa que estava prestes a concluir seus estudos com educadores do próprio acampamento. Seu Luis teve a sua vida interrompida por um assassino que se moveu por esse clima instaurado na sociedade brasileira. Um clima de ódio, de inspiração fascista que temos que combater e derrotar. Por isso, do nosso luto, nascerá um profundo processo de luta e organização”, afirma Kelli Mafort da direção nacional do MST.
Diante disso, um ato já está marcado para esse sábado (20), em memória de Luiz, em solidariedade aos familiares e aos feridos. A concentração está marcada para às 9h da manhã na Praça Washington Luiz, de lá segue uma caminhada até o Largo São Sebastião em frente a Igreja Matriz.