O que a ONU não quis ver no Maranhão
A CPT/MA, Comissão Pastoral da Terra, Regional do Maranhão, vem, através da presente nota, manifestar ao público a sua decepção com o cancelamento da visita ao Maranhão da Comissão da ONU, chefiada pelo Dr. Jean Ziegler, agendada para 12 e 13 de março deste ano.
Podemos somente imaginar que este desfecho seja fruto de pressões institucionais, que visam contornar um quadro político nacional e estadual confuso e delicado. Cria, porém, surpresa e constrangimento a ausência de qualquer comunicado oficial da ONU sobre o cancelamento da visita.
Se, em relações internacionais valem os critérios, às vezes discutíveis, da diplomacia, na sociedade civil não seria demais esperar ao menos o respeito das regras elementares da boa convivência.
O Doutor Ziegler tinha a missão de pesquisar a situação de emergência alimentar nas cidades e no interior do Maranhão. Ele, com certeza, conhece as causas estruturais da fome no Brasil e as graves responsabilidades dos governos estaduais e federais, que, no contexto financeiro internacional, privilegiam nos orçamentos o pagamento da dívida externa e da dívida interna. A partir destas prioridades escandalosas, impostas de fora e acriticamente aceitas pelos governos, qualquer pessoa sensata sabe que é impossível projetar políticas públicas sociais que não passem de esmolas assistenciais. A fome, com o seu trágico séqüito de doenças, epidemias e de controle social dos excluídos, é o resultado estrutural de um modelo econômico que constrói a morte e destrói a vida.
O Doutor Ziegler, se tivesse honrado o seu compromisso, teria, mais uma vez, confirmado o que, academicamente, já bem conhece: O escândalo dos palafitados em pleno centro de São Luís; o escândalo da fome, da devastação do meio-ambiente e do desvio de dinheiro público do Projeto Salangô, em São Mateus do Maranhão; o escândalo de trezentas famílias de sem-terra, acampadas desde maio do ano passado, nas margens da Fazenda Cantanhede, município de Matões do Norte, sem respostas adequadas por parte do Ministério da Reforma Agrária. São três trágicos exemplos, para levantar um pouco a cortina cínica e oportunista, que tenta esconder o sofrimento do povo do Maranhão.
O Doutor Ziegler teria tido também a oportunidade de conversar com representantes de entidades, sindicatos e movimentos sociais, que lutam contra a miséria e a injustiça no estado e de receber dados e documentos sobre a fome e suas causas.
Esperamos que, apesar disto, a Comissão de Direitos Alimentares da ONU, continue se sensibilizando sobre a realidades dos excluídos do Maranhão.