Bionatur leva sementes agroecológicas para todo o país
Por Luiz Renato Almeida
Fonte Agência Chasque
Começa nesta terça-feira, em Candiota, na região sul do Rio Grande do Sul, o terceiro encontro nacional da Rede Bionatur de Sementes Agroecológicas. A Bionatur é uma empresa ligada a cooperativas de assentamentos do MST. Atualmente, cerca de 230 famílias assentadas em 20 municípios dos estados do Sul do Brasil e de Minas Gerais participam do projeto. Na última safra, foram produzidas 22 toneladas de sementes livres de agrotóxicos, certificadas pelo Ministério da Agricultura.
Marino de Bortolli, um dos coordenadores da Rede Bionatur, fala sobre a importância do projeto e as dificuldades vividas pelos agricultores.
Qual é o histórico da Bionatur?
As primeiras famílias do MST chegaram na região sul do Rio Grande do Sul em 1989. Fomos assentados em uma região com bastante dificuldade de solo, clima, estrutura básica de produção, mas, por outro lado, em relação à produção de sementes de hortaliças, o clima é bem favorável. Quando nós chegamos aqui algumas empresas já iniciavam a produção de sementes de hortaliças e nós, do MST, nos organizamos na Cooperal (Cooperativa Regional dos Agricultores Assentados) em 1992. Começamos a desenvolver a produção: primeiro de grãos, depois de leite. Então nós percebemos que a produção de sementes também seria interessante. Começamos a nos envolver com as empresas que já estavam na região. Ao longo do tempo, percebemos que a forma da produção das sementes não era adequada à nossa realidade, nossa proposta de viabilidade dos assentamentos. Construímos a proposta da produção de hortaliças agroecológicas e daí nasce a idéia da Bionatur. Em 1997 já produzimos a primeira safra orgânica e a partir daí começamos o debate. Surgiu então a marca Bionatur dentro de um setor da Cooperal. Avançamos na produção e na comercialização.
Qual é a importância de se produzir sementes agroecológicas?
A produção agroecológica não está relacionada exclusivamente com as sementes. A idéia da semente está relacionada ao clima, ao solo, à realidade da nossa região. A produção agroecológica é um projeto em discussão no MST desde 1987, 88, com o nascimento do Centro de Tecnologias Alternativas Populares (CTAP), que vem debatendo uma produção sustentável e que garantisse a viabilidade da agricultura. Nós entendemos que a dependência dos insumos químicos e do uso de máquinas, ainda mais depois da revolução verde, veio para endividar os agricultores. Nossa proposta, da Rede Bionatur, que hoje se expande para todo o país, é não só produzir sementes, mas que todo o lote, todo o sistema de produção seja agroecológico. Desde a produção de leite, grãos, sementes, insumos, causando uma independência dos agricultores em relação aos produtos químicos. Tem uma dependência também em relação ao isolamento, por isso o debate tem que ser ampliado. Onde o vizinho usar um produto químico, por exemplo, ele pode contaminar a produção daqueles que estão produzindo agroecológico. Então tem que ser um debate amplo, para construir esse projeto a nível regional e assim por diante.
O que caracteriza as sementes produzidas pelas famílias da Bionatur?
Em primeiro lugar, são as sementes orgânicas, livre de todo e qualquer produto químico. Mas também há por trás a questão social, de organização dos agricultores no debate e na formação, da não dependência de receitas das empresas produtoras de insumos químicos. E tem essa construção que estamos fazendo com agricultores de organização de núcleos. O núcleo tem que estar organizado, assim como a família. Isso leva a um avanço social e econômico da família.
Muitos dizem que a Reforma Agrária não dá certo, mas a Bionatur nasceu com 12 famílias e hoje já tem 230. Fale sobre a situação econômica delas.
Nossa proposta de construção da agroecologia e da agricultura sustentável teve seus primeiros passos, começou com poucos agricultores, nesse caso das sementes. Hoje já temos uma cooperativa nacional, com um número bem maior de agricultores que estão se viabilizando economicamente. As sementes são um produto de alto valor comercial, então os agricultores têm uma vida econômica bem desenvolvida, por mais que nós tenhamos passado por dificuldades nos primeiros anos. Hoje qualquer agricultor da Bionatur pode ter um faturamento anual de 12 a 15 mil reais com as sementes, fora as outras atividades do lote. Então isso se torna interessante para o desenvolvimetno da Reforma Agrária e para a viabilidade econômica das famílias, tendo em vista que trabalhamos no conjunto da produção do lote, na questão do leite. Isso dá uma tranqüilidade para a família se desenvolver no assentamento.
Quais são as principais dificuldades da Bionatur hoje?
A principal dificuldade é as famílias absorverem e construírem a proposta, tendo em vista que desde a II Guerra Mundial e da revolução verde, se implementa na agricultura um projeto de dependência de insumos químicos e equipamentos. Portanto reconstruir isso na cabeça de cada agricultor e se desenvolver atividades relacionadas a agroecologia é difícil. Mas também temos outras dificuldades, legais também, por exemplo, no registro das sementes para comercialização. È necessário um selo, que tem um custo altíssimo, e nós não estamos construindo desenvolver um projeto que possa legalmente servir para o desenvolvimento de sementes orgânicas que seja um selo participativo, com todos os produtos agroecológico produzidos pelos assentados e por outros agricultores familiares, que tem outras linhas de produção além das sementes. Estamos debatendo isso no nosso encontro. A partir daí pretendemos desenvolver uma proposta de registrar os produtos agroecológicos que seja participativo com os grupos de agricultores que trabalham com agroecologia.
Nesse momento em que a Rede Bionatur realiza o seu III Encontro Nacional, quais são os desafios colocados para esse projeto?
Um dos desafios é ampliar a rede. No primeiro encontro, debatemos que a produção de semente é feita apenas na região sul do estado, praticamente nos três municípios onde fica a sede da Bionatur. E construímos essa proposta de desenvolver uma rede nacional. Tivemos a assembléia de fundação da Conaterra (Cooperativa Agroecológica Nacional Terra e Vida) em 8 de junho do ano passado. Isso está proporcionando o desenvolvimento de atividades em outros estados.