Assembléia Popular: Mutirão por um novo Brasil

Caros amigos e amigas do MST,

Este é um Letra Viva especial, com objetivo de socializar um acontecimento histórico desses 505 anos de Brasil: a reunião, entre os dias 25 e 28 de outubro, de representantes de mais de 40 entidades sociais, movimentos do campo e urbanos, pastorais da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB e organizações, todos com o mesmo objetivo: organizar os pobres para fazer as verdadeiras mudanças estruturais. Não poderíamos ocultar de você este acontecimento inédito: a Assembléia Popular: Mutirão por um novo Brasil.

Mais de oito mil militantes se reuniram essa semana em Brasília, empenhados em contribuir para a construção coletiva de um projeto popular para o Brasil. Todos em Movimento por um Brasil melhor, realizando estudos e debates para atingir esse objetivo.

No dia (26/10), os participantes se juntaram em uma marcha que levantou a bandeira da solidariedade e da soberania. Durante a caminhada, os manifestantes criticaram o imperialismo dos Estados Unidos e a política econômica nacional: hoje mais de 52 milhões de pessoas vivem na miséria, enquanto o país deve mais de 600 bilhões de reais de dívida pública. São 27 milhões de pessoas desempregadas ou atuando no trabalho informal. A reivindicação central foi a mudança no modelo de dependência do capital internacional, que está a serviço do capital financeiro representado pelo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, pelo Fundo Monetário Internacional, Organização Mundial do Comércio, Banco Mundial e Banco Central.

Para simbolizar as críticas, a manifestação passou em frente à Embaixada dos Estados Unidos com uma faixa que dizia “Fora Bush da América Latina”, mostrando que o presidente estadunidense não será bem vindo no dia 6 de novembro, quando visitará a capital federal. Como lembrança, os militantes deixaram mais de três mil placas fincadas na terra com a foto do Bush vestido com a roupa militar alemã de Hitler. “Bush. Inimigo nº 1 da humanidade” era a mensagem transmitida.

Entoando o hino nacional, a caminhada seguiu para o Itamaraty, onde reforçou a luta de cada povo por sua independência e pediu a retirada das tropas brasileiras do Haiti.

Nessa caminhada rumo a construção de um Brasil mais justo, os participantes da Assembléia pediram reformas mais profundas e mais atenção ao povo brasileiro.

Hoje, ao final da Assembléia Popular, os militantes sociais saem com quatro documentos norteadores das práticas e das idéias: Carta da Assembléia Popular: Mutirão por um novo Brasil, Próximos passos e O Brasil que queremos. Com eles, os militantes voltam para as suas bases, avançando mais na construção do nosso país.

MST entrega carta ao presidente Lula

Em 26 de outubro, o MST entregou uma carta ao presidente Lula. Leia abaixo a íntegra do documento:

Exmo.sr
Luis Inácio Lula da Silva

Estimado Presidente,

Estamos aqui em Brasília, milhares de militantes dos Movimentos Sociais, e entre eles, centenas de militantes da Reforma Agrária. Frente às necessidades das famílias acampadas e assentadas e da insatisfação com a sua política de Reforma Agrária, sentimos a necessidade de lhe escrever.

Queremos relembrar nossos acordos, desde 2003. Em novembro daquele ano, quando o governo anunciou o II Plano Nacional de Reforma Agrária, com o assentamento de 400 mil famílias e que dava prioridade às famílias acampadas, bem como a uma nova política de Reforma Agrária, saímos contentes e esperançosos.

O tempo foi passando e nada do governo acelerar a Reforma Agrária. Já estamos a praticamente um ano do final do governo e dificilmente as metas estabelecidas pelo PNRA serão cumpridas. O ministro Miguel Rosseto reconhece publicamente que o governo assentou apenas 117 mil famílias. Há ainda um agravante: 65% destas famílias foram assentadas na chamada Amazônia legal, o que todos sabem se refere muito mais a legalização de terras públicas ocupadas do que propriamente ações que alterem a estrutura fundiária do Brasil.

Para exemplificar a grave situação da política de Reforma Agrária, queremos citar apenas dois casos. No Rio Grande do Sul, foram assentadas menos de 500 famílias em três anos. O governo Olívio Dutra, com todas as restrições impostas pela legislação da época, conseguiu assentar em 4 anos, mais de 8 mil famílias.

No estado do Maranhão, onde há o maior número de famílias sem-terra e de concentração de latifúndios, nos últimos três anos, o Incra não conseguiu assentar nenhuma família do MST. Isso é uma vergonha!

Em maio deste ano realizamos a histórica Marcha Nacional pela Reforma Agrária, de Goiânia a Brasília, graças ao apoio e solidariedade que recebemos da sociedade brasileira. Mobilizamos mais de doze mil militantes que caminharam durante 17 dias.

Na chegada, os ministros não conseguiram dar respostas concretas às demandas que apresentamos desde o início do seu governo. Graças a sua intervenção, acabamos construindo uma agenda de compromissos, baseados em sete pontos:

1. Garantir a meta de assentamentos, conforme o Plano Nacional de Reforma Agrária.
2. Priorizar as famílias acampadas.
3. Recuperar o crédito especial para os assentados, (das 580 mil famílias assentadas, menos de 15% estão recebendo PRONAF).
4. Reestruturar o Incra.
5. Acelerar a liberação de todos os recursos da Reforma Agrária, ora contingenciados.
6. Normatizar a entrega das cestas básicas para as famílias acampadas.
7. Publicar, em semanas, a nova portaria dos índices de produtividade para desapropriações, (segundo o Ministro da Reforma Agrária esta lhe foi entregue no Palácio, no dia 6 de abril desse ano).

Praticamente nenhum desses pontos foi atendido. Alguns foram de forma parcial e aquém do acordado, como a questão do crédito. Nesta semana, foi publicado o edital do concurso para a admissão dos novos servidores do Incra, o que deveria ter sido feito ainda em 2003.

No final de setembro deste ano, voltamos a nos mobilizar em todo o país, nas dependências do Incra, para chamar atenção do seu governo e da sociedade, para o fato de nenhum acordo ter sido cumprido.

O senhor pode ver que temos hoje 140 mil famílias acampadas em todo o país, que enfrentam todo tipo de dificuldades e veem mais um ano agrícola iniciar, sem que tenham terra para plantar. Para atender essas 140 mil famílias, o Incra nos apresentou uma meta de assentar apenas 15 mil famílias do MST neste ano.

Isso, para nós, é mais um desrespeito aos compromissos assumidos no Plano Nacional de Reforma Agrária. Compromisso assumido também por Vossa Excelência durante a marcha. O não cumprimento desse compromisso é uma afronta ao sofrimento das famílias acampadas e envergonha o seu governo.

Novamente, nos prometeram que até final de outubro será publicada a Portaria com novos índices de produtividade, para desapropriações. Ficamos imaginando que, se o governo fosse tão lento para atender os interesses do agronegócio ou dos bancos, o que aconteceria?

Essa política caracteriza um desrespeito aos compromissos históricos de seu partido e das promessas de suas campanhas eleitorais. Além disso, representa uma penalização aos trabalhadores e trabalhadoras que se organizam e lutam.

Diante disso, Senhor Presidente, viemos à sua presença para lhe pedir que honre com os compromissos de seu governo, pois não sabemos mais a quem apelar.

Certos de sua compreensão e providências, desde logo agradecemos, atenciosamente, em nome dos militantes do MST, da Via Campesina e de todos que lutam pela Reforma Agrária.

Brasília (DF), 26 de outubro de 2005.

Assembléia Popular: Mutirão por um novo Brasil

Atenciosamente,

Secretaria Nacional do MST.