Entidades e movimentos se manifestam contra milho transgênico
Com informações da Agência Notícias do Planalto
Na semana passada, a CNTBio (Comissão Nacional Técnica de Biossegurança) adiou a decisão de liberar o milho transgênico Libert Link, fabricado pela empresa Bayer. Os integrantes da comissão não chegaram a um consenso porque ainda têm dúvidas sobre a semente, que foi proibida em países como a Áustria e não é plantada comercialmente na União Européia.
O milho Libert é resistente ao glufosinato de amônio, herbicida produzido atualmente pela Bayer com o nome de Finale, mas que vai passar a se chamar Liberty. Isso significa que para combater as eventuais pragas que o milho contrair, será preciso comprar o produto fabricado pela mesma empresa.
“Um dos principais riscos, pensando a partir da agricultura ecológica, é que uma vez liberados no meio ambiente este milho vai produzir pólen e vai contaminar as sementes crioulas [sementes derivadas de cultivos tradicionais]. Outro problema está ligado à forma como os transgênicos são produzidos. Eles manipulam também pedaços de vírus que causam doenças em plantas e pedaços de bactérias. E, ao manipular todos estes micro-organismos, existe uma chance enorme de que você dê origem a novos agentes causadores de doenças que não existem até hoje”, afirma Gabriel Fernandes, assessor técnico da ASPTA (Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa).
Com receio que a variedade seja aprovada pela CTBio, a ASPTA, junto com diversas organizações e movimentos como a Via Campesina Brasil, lançou o Manifesto Contra o Milho Transgênico. O texto defende a agroecologia: “há centenas de variedades de milho crioulo desenvolvidas pelos agricultores familiares ao longo de gerações e que são bem adaptadas às condições ambientais e aos objetivos produtivos desta categoria. Em particular, estas variedades são bem adaptadas às práticas da agroecologia e sua desaparição levará a uma grande fragilização deste modo sustentável de produzir que é economicamente rentável e ambientalmente saudável”.
O manifesto cita pareceres e pesquisas sobre produtos transgênicos em todo o mundo e questiona os métodos de avaliação de riscos ambientais utilizados pela Comissão.
Leia abaixo a íntegra do texto:
VAMOS DETER A CONTAMINAÇÃO TRANSGÊNICA!
Novembro de 2006
A CTNBio – Comissão Técnica Nacional de Biossegurança está discutindo a primeira liberação comercial de um produto transgênico desde a promulgação e regulamentação da nova Lei de Biossegurança, que o Presidente Lula afirmou ser um exemplo para o mundo.
Liberada por medida provisória, a soja transgênica já está sendo plantada e consumida no País sem qualquer avaliação de riscos para o meio ambiente e para a saúde dos consumidores e sem rotulagem.
Mas como será que a nova CTNBio vai avaliar os riscos do milho transgênico conhecido comercialmente como Liberty Link? Este milho transgênico é resistente ao glufosinato de amônio, herbicida produzido atualmente pela multinacional Bayer com o nome de Finale mas que vai passar a se chamar Liberty (assim como o herbicida Roundup e a soja Roundup Ready, da Monsanto).
É HORA DE SE APLICAR A CIÊNCIA COM SERIEDADE!
Já são muitas as pesquisas científicas independentes que vêm levantando inúmeros riscos de vários produtos transgênicos para a saúde dos consumidores e para o meio ambiente. Ao contrário das pesquisas feitas pelas empresas para justificar a suposta inocuidade de seus produtos, estas pesquisas independentes são publicadas em revistas científicas, ou seja, seus métodos e resultados são submetidos à revisão crítica por outros cientistas.
As referências que se seguem são apenas uma amostra das críticas científicas de peso aos produtos transgênicos:
– Em 2004, a revista Biotechnology and Engeneering Reviews publicou, no seu número 21, artigo em que os autores denunciam “… que é espantoso que as agências reguladoras [dos transgênicos] se baseiem exclusivamente nas informações fornecidas pelas indústrias e que esses dados não sejam publicados em nenhum jornal científico nem submetidos à expertise de outros cientistas.”
– Em novembro de 2003, cientistas de dois renomados centros de pesquisa do INRA (a Embrapa da França) relataram que o milho T25 Liberty Link da Bayer não mostrou estabilidade nos experimentos por eles acompanhados; que os transgenes tinham se rearranjado e que não correspondiam mais à caracterização genética apresentada inicialmente pela empresa.
– Artigo publicado pela revista New Scientist relatou pesquisas de cientistas dinamarqueses constatando que a bactéria Bacillus thuringiensis (Bt) presente em vários produtos transgênicos troca parte de seu DNA com outras bactérias aparentadas e que estas provocam vômitos e problemas respiratórios em seres humanos.
– A argumentação das empresas para pedir a liberação de seus produtos transgênicos não se baseia em testes de toxicologia ou de alergenia, mas no princípio da equivalência substancial. Este princípio já foi amplamente denunciado por vários cientistas como não científico (revista Science, outubro de 1999) pois identifica apenas aspectos da composição química dos produtos transgênicos e convencionais para compará-los, deixando de lado as eventuais diferenças biológicas e toxicológicas. Além disso, não existe uma definição científica de qual seria o nível de discrepância na composição dos produtos que indicaria uma “diferença substancial”.
– Mesmo com a precariedade da equivalência substancial, o Jornal of Nutrition, dos EUA, publicou estudos já em 1994 indicando que existem diferenças significativas entre a soja transgênica RR e a soja convencional tais como 27% a mais de um agente patógeno, a tripsina, que pode inibir a digestão de certas proteínas e retardar o crescimento de animais e uma sensível diminuição de proteínas e do ácido aminado fenilalanina.
– Em Junho de 2002 o diretor do Advisory Committee on Release to the Environment, da Inglaterra, questionou os testes realizados pela Bayer para pedir a liberação do milho transgênico L iberty Link, já que os mesmos indicaram uma taxa de mortalidade duas vezes mais elevada em galinhas alimentadas com este produto em comparação com outras alimentadas com milho convencional. A empresa descartou este fato na sua análise.
– Em setembro de 2004 o Conselho Nacional de Ciências e o Instituto de Medicina dos EUA publicaram um relatório declarando que o princípio da equivalência substancial, usado pelas agências governamentais como base para a liberação de transgênicos não basta para garantir a inocuidade destes produtos e que testes experimentais caso a caso deveriam ser realizados.
– Artigo publicado no Journal of Biomedicine and Biotechnology em 2006 afirma que a inserção de um transgene no genoma de uma planta é raramente um ato preciso e que mutações genéticas são freqüentemente observadas. Lembramos que o dogma da indústria dos transgênicos é que a biossegurança destes produtos repousa na estabilidade do genoma e na precisão da técnica.
– Pesquisa do INRA publicada em dezembro de 2005 indica que o uso de herbicidas cresce com o uso de transgênicos tais como a soja RR e milho Liberty Link, entre outros, ao contrário do que proclamam as indústrias.
– Os debates na Inglaterra para a liberação comercial do milho transgênico Liberty Link, da Bayer, em fevereiro de 2002 levaram a empresa a admitir que a comparação entre a composição química do seu produto e do milho convencional não é uma indicação de segurança. Por outro lado, foi amplamente criticado o fato de que os testes com animais foram realizados com espécies como ratos e galinhas e não com bovinos, já que o milho é indicado como alimentação destes animais. Mais ainda, o milho Liberty Link não passou pelos testes de Identidade, Uniformidade e Estabilidade, exigidos pela legislação da União Européia.
Estes poucos e contundentes exemplos de pesquisas científicas indicando os riscos dos transgênicos deveriam ser suficientes para que um grupo de cientistas e representantes do governo e da sociedade civil membros da CTNBio não aprovassem a liberação do milho Liberty Link da Bayer ou qualquer outro transgênico no Brasil. Porém, pelo comportamento pouco científico de parte desta Comissão, fica a impressão de que os interesses das empresas ainda prevalecem sobre os interesses da biossegurança dos consumidores brasileiros e do meio ambiente do País.
PAREMOS COM A LEVIANDADE NA BIOSSEGURANÇA!
A CTNBio ainda não discutiu critérios e regras de avaliação de risco das liberações comerciais e nem mesmo das liberações para pesquisas de transgênicos fora de laboratórios, no meio ambiente. No entanto, a Comissão aprovou neste ano centenas de pesquisas nestas condições e colocou em pauta a liberação comercial de transgênicos da mesma forma açodada e irresponsável.
Recentemente, tentou-se fazer aprovar a importação de milho transgênico da Argentina de forma subreptícia, inserindo a decisão de introduzir no País centenas de milhares de toneladas deste produto no meio de outras que tratavam de autorizar alguns quilos de sementes para pesquisa. Quando este procedimento irregular foi questionado internamente na CTNBio, o debate passou a ser a questão da economia supostamente trazida por esta importação e não a biossegurança do milho argentino, nunca testada no Brasil.
Vários membros da CTNBio protestaram contra a exigência legal de apresentarem cartas indicando os seus potenciais conflitos de interesse nos julgamentos da Comissão. No final foram assinadas declarações tão genéricas que não identificam quaisquer conflitos. No entanto, muitos dos mais fervorosos defensores dos transgênicos na Comissão estão envolvidos em pesquisas de desenvolvimento destes produtos e deveriam deixar claro que pesquisas são essas e quem as paga. Desta forma ficaria transparente a impossibilidade destes membros votarem em processos em que estejam ou estiveram envolvidos ou nos quais empresas que os financiam ou que os financiaram estejam envolvidas. Alguns cientistas sequer deveriam ser membros da Comissão, por serem filiados a organizações de promoção do uso de transgênicos financiadas ou relacionadas com empresas de biotecnologia cujos produtos eles terão que julgar na Comissão.
Porque a Comissão não usa os métodos de avaliação de riscos ambientais desenvolvidos por uma equipe internacional de cientistas de instituições públicas, entre os quais estão pesquisadores da Embrapa? A Comissão poderia tê-los convocado para expor essa metodologia mas não o fez e preferiu pedir pareceres de especialistas externos sem qualquer orientação sobre o que deve ser observado na análise de riscos e como. Em outras palavras, a análise dos riscos (que em geral limita-se à avaliação do dossiê apresentado pela empresa interessada) fica ao critério de cada um desses pareceristas.
EVITEMOS A POLUIÇÃO GENÉTICA!
Além dos riscos para a saúde dos consumidores e para o meio ambiente, a liberação do milho transgênico tem riscos elevados para a diversidade das variedades de milho do Brasil. A contaminação das variedades de milho convencional e do milho crioulo pelo milho transgênico será devastadora.
Há centenas de variedades de milho crioulo desenvolvidas pelos agricultores familiares ao longo de gerações e que são bem adaptadas às condições ambientais e aos objetivos produtivos desta categoria. Em particular, estas variedades são bem adaptadas às práticas da agroecologia e sua desaparição levará a uma grande fragilização deste modo sustentável de produzir que é economicamente rentável e ambientalmente saudável.
Para agravar o problema da poluição genética, as multinacionais de biotecnologia ainda podem reclamar direitos de propriedade intelectual sobre a produção e as sementes contaminadas. Isso acontece em outros países e aconteceu no Brasil com a soja transgênica da Monsanto.
DEFENDAMOS NOSSA SOBERANIA!
Finalmente, é preciso pensar também na soberania nacional. A entrada da soja transgênica no Rio Grande do Sul substituiu dezenas de variedades convencionais desenvolvidas pela Embrapa e bem adaptadas a várias condições ambientais do estado por apenas umas poucas em que o poder proprietário da empresa Monsanto é total, já que detém o monopólio da tecnologia da transgenia.
No caso do milho o problema será ainda maior, pois as empresas multinacionais de biotecnologia detêm mais de 70% da oferta de sementes convencionais de milho e não deixarão de substituí-las pelas transgênicas assim que este cultivo for liberado.
Estas são algumas das poderosas razões que nos levam a cobrar seriedade da CTNBio e a sua independência em relação aos interesses das empresas.
Conclamamos todas as organizações da sociedade civil preocupadas com a real biossegurança do País e da população a se manifestarem de forma contundente contra esta ameaça sinistra ao nosso futuro.
Via Campesina Brasil
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
AS-PTA
Terra de Direitos
Rede Ecovida de Agroecologia
Centro Ecológico IPÊ
Apromac – Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte – Paraná (ONG Conselheira do Conama pela Região Sul) (Conselheira das ONGs ambientalistas no Conselho Estadual do Meio Ambiente do Paraná).
AMAR – Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária – Paraná
Adesões podem ser enviadas para [email protected] ou pelo fax (21) 2233-8363