MP fará auditoria em entidade ruralista acusada de formação de milícias
Por Carlos Juliano Barros
Repórter Brasil
Uma auditoria nas contas da União em Defesa da Propriedade Rural (UDPR), que deveria ter acontecido na sexta-feira passada, 26 de janeiro, foi adiada para o próximo dia 13 de fevereiro. A perícia faz parte do processo de recolhimento de provas para embasar uma Ação Civil Pública (ACP) que solicita a dissolução da entidade, ajuizada pelo Ministério Público Estadual de Minas Gerais na comarca de Ituiutaba – a 150 quilômetros de Uberlândia.
Há pelo menos três anos, o órgão vem investigando a atuação de milícias armadas constituídas por fazendeiros do Triângulo Mineiro com o intuito de promover despejos forçados de movimentos de luta pela terra que ocupem propriedades na região. No entender do MP, a UDPR foi a maneira encontrada pelos ruralistas para viabilizar ações de expulsão dos sem-terra, à revelia da lei. “A perícia se faz necessária para verificar as fontes de receita e o que é feito com o dinheiro, além de fazer um levantamento dos sócios e contribuintes. Queremos saber se os recursos financiaram a compra de armas, contratação de jagunços, entre outras coisas”, explica Afonso Henrique Teixeira, procurador do MP.
Fundada em 1998, no município de Ituiutaba, a UDPR despontou como alternativa à suposta “morosidade” da União Democrática Ruralista (UDR). Sebastião Gonçalves, que já integrou os quadros da diretoria da entidade, afirmou em entrevista ao Jornal do Brasil que ela pretendia ser mais “dura e ágil” do que a associação criada por Ronaldo Caiado em meados dos anos 80, a qual tachou de “soft”. O próprio estatuto inaugural deixa bem claros os objetivos da UDPR: “assegurar assistência aos associados, sob forma de ação comunitária, buscando evitar a ocorrência de esbulho possessório ou invasões de suas propriedades dentro da área de jurisdição, inclusive colaborar solidariamente na coordenação de retirada de eventuais invasores”.
As primeiras denúncias contra a UDPR foram feitas pela Animação Pastoral Rural (APR), braço da Igreja Católica que se dedica à assessoria de movimentos sociais, no Triângulo Mineiro. De acordo com o coordenador José de Oliveira, o surgimento de milícias armadas na região remonta ao acirramento dos conflitos agrários no final da década de 90. “Quando havia alguma ocupação, os jagunços chegavam encapuzados, batiam e atiravam. Felizmente, nunca houve nenhuma morte. Mas ficou o clima de intimidação”, conta. Um dos ativistas da Pastoral, frei Rodrigo de Castro Amedée Péret, chegou a ser espancado no mesmo ano da criação da UDPR. Em fevereiro de 2003, um grupo de 63 camponeses ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi retirado à força da fazenda Bebedouro, em Santa Vitória, cidade vizinha a Ituiutaba, e conduzido até o Estado de Goiás na carroceria de um caminhão. Dois anos e meio depois, nova investida de capangas queimou barracos, expulsando cerca de 40 famílias de outra propriedade localizada em Santa Vitória. Segundo José de Oliveira, mais de 30 ações violentas desse tipo já ocorreram na região.
Na zona rural do Triângulo Mineiro, predominam o cultivo da cana-de-açúcar e a pecuária de leite e de corte. Com o assentamento de mais de mil famílias em municípios daquela porção de Minas Gerais, nos últimos dois anos, a situação fundiária encontra-se bem menos tensa. Atualmente, existem pouco mais de uma dezena de acampamentos de sem-terra na região, de acordo com informações da APR. Número acanhado, perto dos 50 de poucos anos atrás. “Mas não se pode dizer que não existam mais milícias. Elas só aparecem quando ocorre alguma ocupação”, explica. Na opinião do Luís Carlos Martins Costas, promotor de Justiça de Conflitos Agrários do MP, “toda atividade de segurança tem que ser feita nos trâmites da lei. Promover desocupação de terra sem autorização da vara de conflitos agrários é formação de milícia armada com contratação de jagunços”.
Procurado pela reportagem de Repórter Brasil, o presidente da UDPR não foi localizado para comentar o assunto.