Na Venezuela, militantes protestam contra assassinato de Sem Terra
Claudia Jardim,
de Caracas (Venezuela)
Justiça. Essa foi a palavra de ordem que marcou o ato da Via Campesina na Venezuela em frente à embaixada da Suíça, em repúdio pelo assassinato do trabalhador rural Sem Terra Valmir Mota de Oliveira, o Keno.
Keno foi assassinado em 21 de outubro por pistoleiros de uma milícia armada contratada pela multinacional Syngenta Seeds, após uma ocupação na área da empresa no município de Santa Tereza do Oeste, Paraná. Outros seis integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Via Campesina foram feridos no ataque e estão hospitalizados.
“Agora as transnacionais não somente violam as legislações do país. Com essa ação inauguram a violência como mecanismo para garantir seus interesses”, avalia Joaquin Piñero, da Via Campesina.
A manifestação em Caracas é apenas uma das dezenas de manifestações simultâneas organizadas pela Via Campesina na quinta-feira, dia 8. Embaixadas da Suíça e sedes da Syngenta serão palcos de outros atos de repúdio em diversos países.
“A Via Campesina manifesta seu mais enérgico repúdio à ação covarde, violenta e fascista da empresa suíça Syngenta contra as famílias Sem Terra do Brasil. Exigimos punição exemplar aos diretores dessa empresa responsáveis por esse ato terrorista. Exigimos proteção às vidas dos dirigentes e famílias acampadas nessa área”, diz documento assinado por mais de 50 organizações sociais, o qual foi entregue pela Via Campesina às embaixadas da Suíça e do Brasil.
“Nós lamentamos o incidente, mas acreditamos que a responsabilidade está nas mãos da justiça brasileira”, disse o encarregado de negócios suíço.
A Via Campesina e o MST exigem também a expropriação da área utilizada pela Syngenta e que em seu lugar seja desenvolvido um centro de agroecologia e reprodução de sementes crioulas “para a Reforma Agrária, a agricultura familiar e camponesa para assim garantir a soberana alimentar brasileira”, reitera Piñero.
Além da Syngenta, outra transnacional está na mira dos trabalhadores rurais Sem Terra. A Monsanto – que introduziu ilegalmente a semente de soja transgênica no sul do Brasil – também será alvo de manifestações e denúncias por parte das organizações camponesas que integram a Via Campesina.
Histórico de violações
A empresa suíça Syngenta começou a atuar no Brasil no início de 2001. Em março de 2006, dezenas de famílias camponesas ocuparam o campo experimental localizado em Santa Teresa do Oeste, no Paraná.
A ocupação teve como objetivo denunciar ao governo federal que a transnacional violava a Constituição ao cultivar ilegalmente sementes transgênicas de soja e milho dentro da zona de amortecimento do Parque Nacional Iguaçu. Em julho deste ano, as 70 famílias acampadas deixaram a área após serem ameaçadas.
No dia 21 de outubro, as famílias reocuparam o campo experimental. No mesmo dia, um ônibus que transportava aproximadamente 40 seguranças da Syngenta chegou à entrada do campo experimental. Os funcionários armados entraram disparando na direção das famílias. Nessa ação Keno foi assassinado e os trabalhadores Sem Terra Gentil Couto Vieira, Jonas Gomes de Queiroz, Domingos Barretos e Hudson Cardin. Izabel Nascimento de Souza foi espancada e, agachada, levou um tiro no olho. Ela já não corre risco de vida, mas perdeu a visão.
A Syngenta contratava serviços de segurança que atuavam de forma irregular na região articulados com a Sociedade Rural da Região Oeste (SRO) e o Movimento dos Produtores Rurais (MPR). Uma das diretoras da empresa de segurança NF foi presa e o proprietário fugiu durante uma operação da Polícia Federal em outubro, quando foram apreendidas munições e armas ilegais.
Há indícios de que a empresa funciona como fachada e que na hora das operações são contratados mais seguranças de forma ilegal, formando uma milícia armada que atua praticando despejos violentos e ataques a acampamentos.
No dia 18 de novembro, a denúncia da atuação de milícias armadas ligadas à SRO, ao MPR e à Syngenta, na região Oeste, foi reforçada durante uma audiência pública, com a coordenação da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal dos Deputados (CDHM), em Curitiba (PR).
O assassinato de Keno, assim como de outros camponeses Sem Terra assassinados, continuam impunes.
Foto: Protestos da Via Campesina em Paulínia, interior de São Paulo, no dia 1° de novembro