Norma do Incra ataca direitos das comunidades quilombolas
O governo resolveu dificultar o processo de regularização das terras de comunidades quilombolas. O texto da nova Instrução Normativa n° 49 do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), já aprovado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, torna mais trabalhosa ainda a abertura do processo, com a exigência de um laudo de antropólogos sem vínculos com os interessados, além de consultas a órgãos ambientais, indígenas e, se for o caso, até militares.
Foi publicada hoje a Instrução Normativa do Incra nº 49, de 29 de setembro de 2008 e que regulamenta o procedimento para titulação das terras quilombolas.
As novas regras aumentam o número de processos burocráticos. Não basta um grupo se identificar como descendente de antigos ocupantes das terras para iniciar o processo. O processo de reconhecimento de uma determinada comunidade só começará com um certificado emitido pela Fundação Cultural Palmares, preparado por antropólogos.
Depois, diversos órgãos públicos deverão ser consultados, como o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), o Instituto Chico Mendes, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Setores militares poderão apresentar parecer, se a área reivindicada for considerada de interesse de alguma das três Forças.
Recentemente, em entrevista à agência de notícias Chasque, o coordenador executivo da Conag (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Quilombolas Rurais Negras), Jhonny Martins alertou que a alteração reflete os interesses de quem defende o modelo do agronegócio no país.
Em 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou um decreto que estabeleceu os procedimentos para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação dessas áreas. À época, ignorantes sobre a dimensão da história da resistência negra no Brasil escravocrata, governo federal e bancada ruralista pensaram estarem distribuindo mais um punhado de migalhas inofensivas. Meses depois, com os diversos pedidos de reconhecimento que chegaram ao Planalto, percebeu-se que os quilombos poderiam por em xeque a titulação de diversas propriedades espalhadas pelo país.
“O interesse é o latifúndio. Eles querem garantir a subsistência do eucalipto, da cana, da soja, até mesmo a criação de bois. É isso que eles querem garantir. Eles pensam em grande propriedade, destruição da natureza”, avalia.
Martins também critica o governo federal, que tem realizado poucas ações para regularizar as terras quilombolas. No entanto, ele lembra que as famílias precisam não só de dos títulos de propriedade, mas também de meios para garantir sua subsistência e sua cultura.
A Conaq estima que existem hoje no Brasil cerca de 5 mil comunidades remanescentes de quilombo, entre as já reconhecidas e as que aguardam reconhecimento. No entanto, os números podem ser maiores, pois muitas famílias ainda resistem em se auto-declararem quilombolas por pressões políticas.