MST denuncia cortes no orçamento com ações em 7 estados
A Jornada Nacional de Lutas do MST, que exige o assentamento das 100 mil famílias acampadas e denuncia os cortes no orçamento da Reforma Agrária com a crise econômica mundial, mobilizou trabalhadores rurais em sete estados sexta-feira (17/04). As ações são realizadas em memória dos 19 trabalhadores Sem Terra assassinados no Massacre de Eldorado de Carajás (PA), que completa 13 anos sem desfecho.
Nesta sexta-feira, foram realizados protestos em São Paulo, Pernambuco, Paraíba, Sergipe, Ceará, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Desde o começo da jornada, já aconteceram ocupações, protestos e marchas no Distrito Federal e em 15 estados (Rio de Janeiro, Goiás, Mato Grosso, Pará, Bahia, Alagoas, Roraima e Minas Gerais).
“A crise econômica demonstra que o agronegócio não tem condições de melhorar a vida dos trabalhadores rurais. Defendemos a realização de uma Reforma Agrária Popular e um programa de agroindústrias em assentamentos para criar empregos e gerar desenvolvimento no campo”, afirma a integrante da coordenação do MST, Marina dos Santos.
Os investimentos para desapropriação aprovados no orçamento de 2009, estimados em R$ 957 milhões, foram cortados ‘em função da crise’ e reduzidos em 41%, baixando o orçamento para R$ 561 milhões. Segundo o Incra, com essa redução será possível assentar apenas 17 mil famílias e não mais 75 mil, meta prevista para o ano de 2009.
“Os cortes no orçamento demonstram que o governo não dá prioridade à Reforma Agrária. Enquanto o agronegócio ganha um pacote de ajuda de R$ 12 bilhões, 100 mil trabalhadores sem terra estão acampados pelo país”, avalia Marina.
Os recursos aprovados para assistência técnica das famílias assentadas eram de R$ 224 milhões, mas foram reduzidos para R$135 milhões. O governo havia se comprometido a garantir a assistência para todas as famílias assentadas. No entanto, com o corte no orçamento, o Incra não tem condições de cumprir a promessa. Atualmente, não tem recursos nem para pagar os trabalhos já realizados em meses passados pelos agrônomos e até hoje não pagos.
Abaixo, um panorama das ações realizadas nesta sexta-feira.
Em São Paulo, cerca de 500 trabalhadores ocuparam a Fazenda Santa Lúcia, no município de Iepê, região do Pontal do Paranapanema. As terras são do Grupo Atala, que atua no estado do Paraná, mas possui uma área com mais de 20 mil hectares em São Paulo, destinadas a usinas e ao cultivo de cana de açúcar. No município de Taubaté (região do Vale do Paraíba), 250 famílias ocuparam a Fazenda Guassahy, que possui 300 hectares e está em situação de abandono e total improdutividade.
Na região de Ribeirão Preto, famílias do acampamento Alexandra Kolontai e dos assentamentos Mário Lago e Sepé Tiarajú fizeram a arrecadação de assinaturas para um abaixo-assinado que reivindica ao governador de São Paulo, José Serra, que seja arrecadada, para fins de Reforma Agrária, a área da fazenda Martinópolis, localizada na cidade de Serrana.
Em Pernambuco, mais de 300 famílias ocuparam a Fazenda Balame, localizada entre os municípios de Poção e Jataúba. A área tem 12.500 hectares e pertence à família de José Cordeiro de Santana, conhecido como Zé de Riva. É a maior fazenda contínua da região do Agreste Pernambucano.
O fazendeiro foi condenado em 2002 como mandante do assassinato do Cacique Xicão Xukuru, liderança indígena reconhecida internacionalmente por sua luta pela retomada das terras tradicionais do povo Xukuru, assassinado no município de Pesqueira em 1998.
Na Paraíba, 200 famílias Sem Terra ocuparam a fazenda Bela Vista, no município de Itaibaiana. A fazenda, de 300 hectares, já havia sido ocupada em 2006, mas poucos dias depois as famílias foram despejadas. “O Incra já fez a vistoria da área, que é comprovadamente improdutiva. Mas devido a uma venda de parte do terreno, o processo ficou travado. Por isso reocupamos a fazenda, para exigir o assentamento de pelo menos 30 famílias na área”, aponta João Porfírio, da direção estadual do Movimento. No estado da Paraíba, mais de 2.500 famílias estão acampadas. As famílias cobram uma política de Reforma Agrária que garanta condições de moradia e produção.
No Ceará, mais de 100 famílias do MST no Ceará ocuparam na Fazenda São Pedro, que está improdutiva. A propriedade, situada no município de Irauçuba, distante 146 quilômetros de Fortaleza, é parte de um complexo de 44 mil hectares e pertence à família de um empresário. A perspectiva é que o imóvel venha a assentar 500 famílias.
Em Sergipe, 30 famílias ocuparam a Fazenda Algodão, em Gararu, no alto sertão do estado. Em Santo Amaro dos Brotos, cerca de 35 famílias ocuparam a Fazenda Nossa Senha das Graças e montaram o acampamento Celso Furtado. Em Ribeirão do Amparo, na divisa do estado com a Bahia, mais 80 famílias ocuparam um latifúndio improdutivo. “Estamos cobrando o assentamento das 12 mil famílias acampadas no estado”, afirma Gislene Reis, da coordenação estadual do MST.
Em Santa Catarina, cerca de 400 trabalhadores rurais do MST liberaram a passagem na praça de pedágio da BR-116, no município de Correa Pinto (região das Lajes), em protesto pela Reforma Agrária e contra as mudanças no código ambiental do estado. “Defendemos a realização da Reforma Agrária e estamos contra a flexibilização da legislação ambiental “, afirma Andréia Borges, integrante da coordenação nacional do MST.
No Rio Grande do Sul, as mobilizações da jornada prosseguiram em quatro municípios. Em São Gabriel, marcha de famílias acampadas e assentadas chegou à cidade após o bloqueio violento da Brigada Militar. O trevo de entrada da cidade foi bloqueado e as famílias caminharam até a prefeitura para negociar a pauta de reivindicação.
Em Canguçu, 200 famílias marcham novamente por dentro da fazenda São João D’Armada e em protesto pelo uso da violência da Brigada Militar em São Gabriel. Na região metropolitana, trabalhadores sem terra bloquearam a RS040 em Viamão e a BR290, no Trevo de Charqueadas, por 19 minutos em memória dos trabalhadores assassinados em Carajás. Em Nova Santa Rita, as famílias acampadas irão simbolizar os 13 anos da tragédia com cruzes na beira da estrada e um ato.
Em Brasília, o senador José Nery (PSOL-PA) lembrou a passagem dos 13 anos do massacre de Eldorado de Carajás, no Pará, em pronunciamento nesta quinta-feira. O senador disse que a maior chacina de trabalhadores rurais Sem Terra da história contemporânea do país continua “absolutamente impune” e que as causas mais profundas da violência praticada contra os Sem Terra permanecem “intactas”.
“Mandantes e executores do massacre continuam impunes, definitivamente livres ou beneficiados por recursos judiciais sem prazo para julgamento, a despeito de tantas provas documentais e testemunhais juntadas contra os mesmos, resultado lógico das farsas montadas para simular o seu julgamento por júri popular”, afirmou Nery.
Ele disse ainda que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva revelou-se entusiasta de um modelo de desenvolvimento nacional baseado na pauta de exportações de commodities (produtos in natura, cultivados ou de extração mineral), o qual, afirmou, só pode ser viabilizado com a apropriação de vastos territórios e a concentração da terra nas mãos de poucos.