Movimentos denunciam militarização da América Latina

Da Página do MST A declaração da Assembleia dos Movimentos Sociais, organizada no IV Fórum Social Américas (FSA), realizado em Assunção, no Paraguai, entre 12 e 15 de agosto, denuncia o processo de militarização da América Latina, com "o aumento da presença militar norte-americana ao longo de nossa América".


Da Página do MST

A declaração da Assembleia dos Movimentos Sociais, organizada no IV Fórum Social Américas (FSA), realizado em Assunção, no Paraguai, entre 12 e 15 de agosto, denuncia o processo de militarização da América Latina, com “o aumento da presença militar norte-americana ao longo de nossa América”.

De acordo com os movimentos sociais, “proliferam acordos de instalação de bases militares, operam a IV Frota em nossos mares. Isto constitui um esforço sistemático de desestabilização da democracia no continente, cada vez mais se reprime e se criminaliza os movimentos sociais”.

Abaixo, leia a declaração.

Declaração da Assembleia dos Movimentos Sociais
IV Fórum Social das Américas
Nossa América está caminhando!
¡Ñane Amérika TeeOñemongu’ Ehína!

Os movimentos sociais presentes no IV Fórum Social das Américas, em Assunção, Paraguai, reafirmamos nossa solidariedade e compromisso com o povo paraguaio, diante da urgente necessidade de avançar em um processo profundo de mudanças, para a recuperação da soberania sobre seu território, bens comuns, recursos energéticos, na concretização da reforma agrária e da democratização da riqueza.

Estamos em um continente onde, nas últimas décadas, se deu o reencontro entre os movimentos sociais e os movimentos indígenas, que desde seus conhecimentos ancestrais e memória histórica questionam radicalmente o sistema capitalista. Nos últimos anos, as lutas sociais foram renovadas e conduziram à saída de governos neoliberais e ao surgimento de governos que têm levado a cabo reformas positivas, como a nacionalização de setores vitais da economia e redefinições constitucionais transformadoras.

Mas a direita no continente está se rearticulando aceleradamente para frear qualquer processo de mudanças. Segue atuando desde seus enclaves político, econômico, midiático, judicial, ao que se soma uma nova ofensiva do imperialismo – inclusive militar – no seu apoio.

Desde o último Fórum Social das Américas, realizado na Guatemala, em 2008, presenciamos o golpe de estado em profundidade, o aumento da presença militar norte-americana ao longo de nossa América. Proliferam acordos de instalação de bases militares, operam a IV Frota em nossos mares. Isto constitui um esforço sistemático de desestabilização da democracia no continente, cada vez mais se reprime e se criminaliza os movimentos sociais.

Denunciamos a ilegitimidade do presidente de Honduras, Porfírio Lobo, ao mesmo tempo que reconhecemos a resistência de seu povo e apoiamos sua luta por uma refundação constitucional, que estabeleça uma verdadeira democracia.

Solidarizamos-nos com a luta do povo do Haiti, que não necessita de uma intervenção militar e de uma ocupação econômica para sua reconstrução. Pelo contrário, exigimos que a soberania do país seja respeitada e que os demais países realizem uma cooperação solidária, nos âmbitos da saúde, educação, agricultura e do que necessitarem. Exigimos o cancelamento incondicional da dívida e rejeitamos o novo processo de endividamento ilegítimo.

Complementando esta ofensiva, continua a onda de tratados de livre comércio em todos seus variantes. É esta a característica central da estratégia da União Européia, a outra potência neocolonial que opera na América Latina e no Caribe. Os braços executores, que são as Instituições Financeiras Internacionais – Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, os bancos regionais de “desenvolvimento” e os grupos bancários privados – estão criando novos e enormes endividamentos com impactos diretos para os povos e a natureza.

Todas estas ameaças se vinculam a um mesmo modelo de desenvolvimento primário exportador, excludente e depredador que se aprofunda sobre muitos territórios, expulsa povos e provoca migrações. A crise sistêmica atual mostra o esgotamento do modelo capitalista – e mais especificamente de seus centros de poder:os bancos, as transnacionais e os governos do G8. Hoje, mais do que nunca, estão visíveis suas tentativas de arrastar o mundo inteiro a uma situação limite, chegando, inclusive, a ter a ameaça de uma guerra nuclear por parte dos Estados Unidos.

A defesa dos bens naturais frente ao capitalismo devorador se volta como ação central da agenda de lutas de mais organizações populares e movimentos sociais. Reforça-se uma frente comum contra a destruição da natureza e contra as falsas soluções do “ambientalismo de mercado” e do “capitalismo verde”, como os mercados de carbono, os agrocombustíveis, os transgênicos e a geoengenharia, que se impulsionam desde os centros do poder à ameaça da mudança climática.

Denunciamos que os governos dos países do Norte geopolítico, antes de pensar em enfrentar os graves efeitos das mudanças climáticas, estão buscando se eximir de sua responsabilidade e desenvolver novos mecanismos de mercado de carbono para obter mais ganhos, como o de “Redução de Emissões por Desflorestamento e Degradação” (REDD), que promove a mercantilização e privatização das florestas, e a perda de soberania sobre os territórios. Rejeitamos, assim, tais mecanismos.

Exigimos que estes países reduzam suas emissões de gases de efeito estufa e que se constitua um Tribunal Internacional de Justiça Climática. Reafirmamos as propostas do Acordo de Cochabamba, produto da Conferência Mundial dos Povos sobre a Mudança Climática e pelos Direitos da Mãe Terra, as quais reconhecem que as soluções reais frente ao aquecimento global são a justiça climática, a soberania alimentar, a recuperação de territórios e a reforma agrária, a agricultura camponesa e a integração e solidariedade entre os povos.

Os movimentos sociais estamos diante de um momento histórico para desenvolvermos iniciativas de emancipação em escala internacional. Só as lutas de nossos povos vão nos permitir avançar para o ybymarane’e (terra sem males) e fazer realidade o tekoporâ (bom viver).

Comprometemos-nos a reforçar a luta pela soberania de nossos povos, pela soberania alimentar, soberania energética, pela soberania das mulheres sobre seus corpos e sua vida, e pelo reconhecimento da diversidade sexual.

Construímos alternativas que partem dos que acumulamos nas resistências desde a inter-relação de diversas ações anticapitalistas, antipatriarcais, anticolonialistas e anti-racistas, ao mesmo tempo que avançamos na busca de outro paradigma centrado na igualdade, no bom viver, na soberania e na integração fundamentada no princípio da solidariedade entre os povos.

Assunção, Paraguai, 15 de agosto de 2010.

(tradução: Cristiane Passos)