“Vamos fazer a maior luta da nossa história para exigir a condenação dos crimes em MG”
Por José Coutinho Júnior
Da Página do MST
No dia 20 de novembro de 2004, cinco trabalhadores sem terra foram brutalmente assassinados, e mais vinte ficaram feridos após a invasão do acampamento Terra Prometida, no município mineiro de Felisburgo, pelo latifundiário Adriano Chafik Luedy e seus jagunços.
Por José Coutinho Júnior
Da Página do MST
No dia 20 de novembro de 2004, cinco trabalhadores sem terra foram brutalmente assassinados, e mais vinte ficaram feridos após a invasão do acampamento Terra Prometida, no município mineiro de Felisburgo, pelo latifundiário Adriano Chafik Luedy e seus jagunços.
Após oito anos do massacre, cujos responsáveis ainda não foram julgados, a violência no campo em Minas Gerais permanece: em uma manifestação dos quilombolas, que reivindicam uma área em Varzelândia, cuja posse já foi decretada, um jagunço assassinou um quilombola com um tiro nas costas.
De acordo com Afonso Henrique de Miranda Teixeira, coordenador das promotorias agrárias de Minas e membro da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, “a causa principal da violência é a não realização da Reforma Agrária, que já é uma violência em si. Sem ela é que temos a eclosão dos conflitos. Se concebemos que os conflitos agrários se dão por causa da terra, o maior responsável pela violência é o governo ao não realizar a Reforma Agrária”.
A violência no campo ocorre de três maneiras distintas: por meio da contratação de jagunços e pistoleiros pelos fazendeiros, pela formação de milícias armadas, com policiais militares a serviço do agronegócio e dos fazendeiros, e por meio do Judiciário, que tem assinado mandados de despejo com regularidade.
De acordo com Silvio Neto, da direção Estadual do MST, “nem o governo federal nem o estadual vem fazendo ações para reprimir a violência; pelo contrário, são responsáveis pela violência ao não desapropriar terra, deixando os trabalhadores vulneráveis à pistolagem, às milícias e ao poder judiciário”.
Um fator que impulsiona a violência no campo é a negligência com a qual os trabalhadores rurais são tratados ao denunciar aos órgãos oficiais condições de conflito. Segundo Silvio, “o massacre em Felisburgo vinha sendo anunciado três anos antes de acontecer. O MST e a Pastoral da Terra vinham denunciando ao governo, e nada foi feito. Os trabalhadores além de ter que exigir um direito do governo, não são ouvidos diante do clamor de justiça, para que os governos pudessem intervir no massacre anunciado”.
Na mesma linha segue Afonso: “trinta dias antes do massacre, fiz um ofício à regional de polícia local alertando a eles que tomassem providências, porque estava se formava um quadro que poderia levar a consequências muito ruins. Mesmo com o Ministério Público em cima, a ineficiência estatal se fez presente, aliada a um preconceito em relação aos trabalhadores rurais e ao atendimento de suas reivindicações. Isso para mim é o que determinou Felisburgo. O preconceito inviabiliza ações mais efetivas e energéticas por parte do poder público”, denuncia.
O julgamento do mandante do massacre de Felisburgo está marcado para 17 de janeiro de 2013. Para pressionar por justiça e pelo assentamento e indenização das famílias vítimas do massacre, o MST pretende realizar em Minas Gerais diversas lutas e mobilizações. “Estamos nos articulando com um conjunto de outras organizações, e até 17 de janeiro, vamos fazer a maior luta da nossa história para exigir a condenação desses crimes e pedir o assentamento imediato das famílias”.
Milícias
A formação de milícias armadas, formada por policias militares em conluio com os latifundiários, constitui uma das forças mais graves de repressão aos trabalhadores rurais. Os policiais aproveitam da distância e invisibilidade do campo e se utilizam dos equipamentos do estado para cometer atos de violência.
Segundo Silvio, nos locais “onde o agronegócio vai se consolidando, a exemplo do triângulo mineiro, essas milícias vão tendo mais regularidade e atuam com mais freqüência, com métodos repressivos, como despejos forçados nos quais se usam veículos da PM, dirigido por policiais sem farda. Ou então patrulhas da PM com emblemas da sociedade rural, o sindicato patronal dessa região”, relata.
Afonso analisa que, apesar das milícias serem um agravante na violência do campo no estado, medidas estão sendo tomadas para combatê-las. “Temos hoje cerca de 80 jagunços e 20 fazendeiros processados por formação de milícias, em várias regiões do estado. Fizemos prisões preventivas, requeridas pelo MP, chamadas de prisão cautelar, enquanto há o processo de apuração dos casos.
O procurador afirma que o Ministério Público está agindo contra a violência no estado, e que até hoje, com o apoio do Judiciário, não se perdeu nenhum caso. Para ele, o problema está na morosidade com que os processos são julgados no país. “Se as pessoas processadas não foram julgadas até hoje, isso advém das causas relativamente comuns no Brasil, em particular a morosidade judicial. Os processos estão em andamento. A justiça no Brasil não funciona com eficiência. A causa da impunidade aqui tem como causas os meios processuais existentes”.
Dois pesos, duas medidas
Se a lei é morosa para condenar fazendeiros e pistoleiros, ela não falha na hora de ser usada contra os trabalhadores. A juíza da vara agrária federal de Minas Gerais, Rosilene Martins,assinou no último período 14 liminares de despejo para acampamentos dos sem terra, alguns com mais de dez anos de existência, sem verificar se os terrenos cumpriam a função social da terra.
Segundo Silvio, os despejos ocorrem porque “o poder judiciário impõe, diante dessa morosidade do Incra e dos governos em criar os assentamentos, os despejos das famílias, sem que haja para elas nenhuma alternativa para onde ir”. A violência durante as ações de despejos também é comum. “Na hora do despejo é corpo de bombeiro, polícia montada, tropa de choque, geralmente se aliando com a burguesia agrária, usando fogo, veneno e maquinários para destruir os acampamentos”, afirma o dirigente do movimento.
“Na área penal, se o Judiciário anda bem, na área civil é um desastre, sobretudo nas reintegrações. É uma violência cometida contra os trabalhadores rurais no dia a dia. A reintegração de posse é rápida e eficiente porque é uma decisão política, no sentido de manter o status quo, sem qualquer questionamento, baseada no preconceito contra os
trabalhadores. É uma catástrofe jurídica”, completa Afonso.
Para resolver o problema da violência no campo, não só em Minas como no resto do Brasil, é preciso que se realize uma política efetiva de Reforma Agrária. No entanto, não há vontade política do poder público de realizar a Reforma Agrária. “Temos 2200 pessoas assentadas, 2900 acampadas, algumas delas há mais de 14 anos. Não há nada que impeça jurídica e tecnicamente o assentamento dessas famílias, a não ser uma posição política do governo em decretar isso”, afirma Silvio.
Enquanto não houver vontade política para fazer a Reforma Agrária, os trabalhadores e lutadores do campo continuarão sendo alvo de violência. “Na verdade a sociedade brasileira nunca quis fazer a Reforma Agrária, e continua não querendo, e quem se propõe a lutar por ela sofre as diversas formas de violência. Estar num barraco de lona dentro de um grande latifúndio já é uma violência, e ser retirado dali por um estado que não cumpre seu papel é uma violência maior ainda”, diz Afonso.