Mais de 300 Sem Terra realizaram a 14ª Feira da Reforma Agrária em Alagoas
Por Rafael Soriano e Gustavo Marinho
Da Página do MST
No primeiro dia da feira, logo cedo na manhã, o cheiro do campo toma a praça: o pé de moleque assando, as tapiocas e o café impregnando as ruas dos feirantes são um convite ao reconhecimento do trabalho do homem e da mulher do campo. O barulho vem das galinhas, gansos, patos, perus e até pavão e, claro, do zunzunzum da pechincha de cada dona de casa que chega pra encher sua sacola de produtos saudáveis.
“Se o campo não planta, a cidade não janta” – é o recado de uma das palavras de ordem mais conhecidas do MST, onde facilmente se expressa a concepção de complementariedade entre os contextos rural e urbano, em que um não existe à parte do outro.
É este sentido que sugere a ação anual dos camponeses em Alagoas, quando realizam a Feira da Reforma Agrária. Entre os dias 11 e 14 de setembro, mais de 300 trabalhadores rurais sem terra, vindos de assentamentos e acampamentos de todas as regiões do estado de Alagoas, ocuparam a Praça Afrânio Jorge (Praça da Faculdade), no bairro do Prado em Maceió, para realização da 14ª Feira da Reforma Agrária.
A feira é uma realização do movimento social e do Centro de Capacitação Zumbi dos Palmares, em parceria com o poder público.
Organização
Há 15 anos, o MST em Alagoas iniciou o debate da preparação de sua primeira feira, instrumento privilegiado de apresentação das conquistas da luta pela reforma agrária, estabelecimento de um canal positivo de diálogo com a população urbana e celebração com muita animação do sonho de uma nova sociedade.
O trabalho organizado, cooperado, desde o processo de produção nas roças à montagem da estrutura física da feira, é a marca do projeto popular, utopia materializada neste evento.
As centenas de toneladas comercializadas na 14ª edição da Feira da Reforma Agrária são o melhor sinalizador do sucesso dos produtos de base orgânica trazidos pelos camponeses à capital. Foram mais de 100 mil laranjas, mais de 17 toneladas de abóbora, 7 toneladas de inhame, dezenas de toneladas de macaxeira, mais de 800 galinhas vendidas, apenas para dar alguns exemplos da fartura que já tem a Praça da Faculdade como palco consolidado de comercialização.
Segurança alimentar
Dados do Censo Agropecuário 2006, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam que a agricultura camponesa é a responsável pela segurança alimentar do brasileiro, produzindo cerca de 70% do feijão e quase 90% da macaxeira. É o contraponto ao modelo do agronegócio, que apenas produz para exportar e alimentar os rebanhos dos países do Norte, num sistema global de produção e alimentação que vem sufocando há décadas as lavouras do mundo com uma inundação de veneno.
“A 14ª Feira da Reforma Agrária é a materialização do sonho da construção de uma nova sociedade, a partir da produção – sem veneno e respeitando a vida das pessoas”, afirma José Roberto Silva, da Direção Nacional do MST.
Como expressão do modo de vida camponês, ele alega que o sucesso da feira já extrapolou as fronteiras de Alagoas, já que este ano “foram atraídos agricultores também do estado vizinho, Sergipe”.
O atual modelo dominante de posse de terra, cultivo e abastecimento tem dado sinais de fracasso: hoje o Brasil é o país que mais consome produtos agrotóxicos no planeta e a média de ingestão por pessoa é de mais de 5 litros anuais. Esses dados, unidos às estatísticas da escalada do número de casos de câncer na população remetem à necessidade de uma urgente transição para o modelo agroecológico.
Alternativa
Existe uma clareza entre os organizadores da feira, de que somente com o desenrolar das lutas de massas, das mobilizações que acontecem durante todo o ano, nas capitais, nas ocupações de latifúndios, somente com esta ação política dos camponeses é possível trazer à realidade esse outro modelo possível de agricultura e divisão de riquezas.
Para Margarida da Silva, também da direção do MST, a realização da Feira da Reforma Agrária é a prova para a sociedade de que a reforma agrária dá certo. “Enchemos a praça de alimentos saudáveis, comercializados pelos próprios produtores com preço abaixo do que é encontrado nos mercados e livres de agrotóxicos”, justifica.