Apesar das incertezas PLs tentam flexibilizar ainda mais os transgênicos



Por Viviane Tavares
Da EPSJV/Fiocruz

Após 10 anos de liberação dos transgênicos no Brasil, as promessas atreladas a ele passaram a ser apenas mitos, como muitos movimentos sociais apontavam desde a época de sua liberação. Entre os mais difundidos, estavam a geração de plantas mais produtivas, produzindo assim mais alimentos e acabando com a fome mundial; e a redução do uso de agrotóxicos na plantação.

Por Viviane Tavares
Da EPSJV/Fiocruz

Após 10 anos de liberação dos transgênicos no Brasil, as promessas atreladas a ele passaram a ser apenas mitos, como muitos movimentos sociais apontavam desde a época de sua liberação. Entre os mais difundidos, estavam a geração de plantas mais produtivas, produzindo assim mais alimentos e acabando com a fome mundial; e a redução do uso de agrotóxicos na plantação.

No entanto, a realidade mostra, ao longo da última década, que o número de desnutridos aumentou, os alimentos que mais estão sendo produzidos com semente transgênica são milho e soja, e as sementes utilizadas em conjunto com agrotóxicos são resistentes a eles e contaminam tudo que está ao seu redor. Embora as evidências mostrem o contrário, a legislação ainda encontra forças para mais flexibilizações.

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Atualmente, no Congresso Nacional e no Senado tramitam quatro projetos sobre  o tema. O projeto de lei 4148/08, do deputado Luis Carlos Heinze (PP/RS), e o projeto de decreto legislativo da senadora Katia Abreu (PMDB-TO), PDL 90/ 07, focam na rotulagem dos produtos transgênicos, que pretendem eliminar o símbolo que informa sobre a transgenia do produto na embalagem. Já o projeto de lei 5575/09, de Cândido Vaccarezza (PT/SP), que além de propor a retiragem do símbolo na embalagem propõe ainda a autorização de tecnologias genéticas de restrição de uso, como a semente terminator, se juntando ao projeto de lei 268/07 do deputado Eduardo Sciarra (PSD/PR), que conta com a mesma finalidade.

Flávia Londres, do Agricultura Familiar e Agroecologia (AS-PTA), explica que o caso da semente terminator é grave porque, além de ter riscos ambientais e de saúde, produz uma semente estéril e deixa o agricultor dependente.

Semente suicida

“É uma semente suicida. Uma espécie de patente biológica. O agricultor que compra a semente transgênica não pode replantá-la, tem que comprar todo ano mediante contrato. Atualmente, existe uma moratória internacional no âmbito da biodiversidade biológica que não aprova essa tecnologia nem para experimento de campo em nenhum país do mundo, e os nossos deputados colocam isso em pauta para aprovar. A outra tecnologia que contém nesta semente é que para um determinado tipo de planta expressar algum tipo de característica, precisa receber um indutor químico externo”, explica a representante da AS-PTA.

O professor da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), André Burigo, aponta outro problema que, segundo ele, é ainda mais grave: a tentativa da aprovação do plantio de sementes transgênicas de soja e milho resistentes a um agrotóxico mais agressivo, o 2,4-D (ácido diclorofenoxiacético), mais conhecido como o agente laranja, da Guerra do Vietnã (Box link).

Atualmente, o projeto está em análise na Comissão Nacional de Biotecnologia (CTNBio), órgão vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia. “Os movimentos sociais consideram isso uma perda de soberania alimentar muito grande e, se aprovado o 2,4 D, estaremos diante de uma realidade muito séria: na classificação toxicológica, este agrotóxico é considerado extremamente grave, o mais grave de todos para saúde humana; e na classificação de impacto e toxicidade ao meio ambiente fica em segundo lugar”, ressalta André Burigo.

Questionamentos

Em setembro deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) do Distrito Federal questionou as autorizações de comercialização de organismos geneticamente modificados (OGM) concedidas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio), como o caso do 2,4D.

Além de transformar em inquérito civil de investigação as decisões já tomadas, o MPF do DF suspendeu as liberações comerciais já aprovadas, condicionando sua aprovação à realização de uma audiência pública, afim de garantir a participação da sociedade civil nas deliberações a respeito destas liberações.

Em documento atualizado no dia 5 de novembro deste ano e publicado abertamente, a CTNBio apresenta o processo de liberação da aprovação do 2,4D, do glufosinato de amônio DAS-68416-4, do glufosinato de amônio DAS-44406-6 e de outros, que, de acordo com o documento, constam em tramitação normal. “Os alimentos transgênicos são aqueles produzidos para receber agrotóxico. Toda soja transgênica recebe um herbicida, que passa por cima dela e mata a plantação ao redor, mas não a ela. Então, imagina o grau de agrotóxico que ela recebe? Além disso, ainda existem os riscos acarretados pela própria transgenia. Ainda estamos descobrindo estes riscos, mas o que se sabe é que as plantas transgênicas estão associadas a problemas de saúde como a defi ciência na fertilidade, má formação fetal e desenvolvimento de tumores”, explica Flavia.

Histórico

A história do Brasil com os transgênicos começa em 1995, quando, por meio da aprovação da Lei de Biossegurança, foi permitido o cultivo de plantas geneticamente modificadas em caráter experimental.

Em 1998, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), autorizou o cultivo da soja modificada Roundup Ready, da Monsanto, para venda ao público. Junto a ela, veio o agrotóxico chamado Roundup, mais conhecido como glifosfato. Em 2000, a 6ª Vara da Justiça Federal proibiu a comercialização da soja transgênica da Monsanto condicionando uma nova liberação à apresentação de Estudos de Impacto Ambiental (EIA/RIMA). A empresa nunca apresentou e a soja passou a ser proibida.

Aprovações flexibilizadas

As aprovações dos transgênicos passaram a ser a cada vez mais flexibilizadas. Tudo começou com o fato consumado do plantio, havia uma plantação ilegal de sementes transgênicas, mas que precisava ser colhida. Este episódio não só permitiu a colheita, como também permitiu a atualização da Lei de Biossegurança, que, segundo ruralistas, apresentava defeitos.

“O principal ‘defeito’ era a atuação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Uma das principais atribuições do Ibama, por exemplo, era exigir um relatório com avaliação do impacto ambiental de cada planta ou animal geneticamente modificado. A partir daí, o órgão emitia o parecer que subsidiava o Ministério da Agricultura, responsável pelo registro e fiscalização de sementes e animais transgênicos. Mas a nova Lei de Biossegurança interrompeu esse processo e esvaziou o papel do MMA, ao determinar que os aspectos da legislação ambiental não são aplicáveis à engenharia genética. Ao mesmo tempo, o governo fortaleceu a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), criada em 2005, também pela nova Lei de Biossegurança”, explica o texto que informa ainda que, com a nova lei, a CTNBio passou a ter totais poderes sobre a aprovação destas substâncias, que passaram a ser feitas de maneiras aligeiradas.